- Você não me disse nada sobre esse ensaio...
Ally olhava para baixo, sentindo a bebê agitada dentro dela de novo. Levantou o rosto e virou-se para ele boquiaberta.
- Eu digo pra você desde a primeira consulta: quando passar das 30 semanas melhor já ir se preparando pro parto.
- Mas você não falou nada de "ensaio". Eu nem sabia que isso existia. E agora, e se eu fizer alguma bobagem?
- Bom...não sei como é para você, mas nesse caso o "ensaio" é justamente para fazer bobagem agora. Que tipo de bobagem você pode fazer, afinal? Não tem nada de mais.
- Eu estou confiando em você nessa, Ally. Não tenho a menor ideia de como ajudar o bebê a sair.
- Bom, na verdade, isso é trabalho meu e dela. Mas no ensaio você vai entender melhor.
- Como assim, nenhum spoiler?
- Nenhum. Sinto muito. Mas na minha primeira vez ninguém me avisou também... - respirou fundo olhando para a parede como se estivesse escolhendo o que dizer. - Algumas coisas eu já sabia, na verdade...mas não tive ensaio nenhum. Foi só lendo mesmo.
- E você não pode me passar então como é o espetáculo em si, já que não teve ensaio?
- Não negocio com terroristas, Reedus. Vamos.
- Terroristas... - resmungava enquanto empurrava a cadeira para dentro da sala. - Agora eu que sou o terrorista...nunca vi um terrorista apavorado igual eu estou agora.
- Terroristas não fazem nenhum treino. É só o "alahu Akbar" e explodir a bomba no peito, como se ensaia algo assim, afinal?
- Para você ver como errou feio na analogia.
- E você sabia o que é uma analogia antes?
Ele apenas riu enquanto travava a cadeira de rodas e a ajudava a se levantar.
- Você vai ter que me ensinar de novo daqui a algumas semanas.
Mais uma vez o gel frio na barriga. Mas agora era diferente. As sombras na tela diminuíam dando espaço para uma mancha amarelo-alaranjada que aos poucos mostrava a forma de um pezinho, mais alguns movimentos e estava ali, bem claramente, em amarelo-claro as solas dos pezinhos e os dedinhos. Norman, com o olhar atento contava cada uma das bolinhas que estavam sobre a sola. Cinco dedinhos em cada pé. Só para ter certeza.
- O que são essas manchinhas na sola do pé?
Dra. Jennifer sorriu enquanto aumentou um pouco mais a pressão sobre a pele com o bastão do aparelho.
- Os dedinhos das mãos. Está brincando com o pezinho. Vamos ver agora...
E começou a girar o bastão mais ao longo da barriga de Ally, percorrendo algumas sombras que aumentavam e depois diminuíam. E ali estava o rostinho.
- Aqui está você, mocinha... - A voz de Ally parecia não sair, engolfada na garganta. A menina estava com a mãozinha fechada em um punho apoiado na bochecha.
- O nariz...olha o narizinho. Yes!
Norman fechou o punho, puxando-o para si. Em seguida virou-se para Ally que ainda estava concentrada nas imagens na tela. - Eu disse que ia puxar o seu nariz, não o meu.
- Agora vamos calcular o peso...
Ela começou a traçar linhas no aparelho com uma espécie de mouse enquanto com a outra mão mantinha o bastão firme na barriga de Ally. Quase que instantaneamente, algo dentro da barriga de Ally parecia tremer com chutes violentos.
- Acho que é meio indelicado perguntar o peso de uma dama...
- Doutora, licença, posso ajudar?
Ela concordou enquanto ele segurava firme o bastão do mesmo jeito que a médica havia deixado e ela movimentava o mouse enorme no aparelho.
Clique atrás de clique, retas atrás de retas e ela em silêncio. Mais um momento de tensão.
- Já não passamos por isso antes? - Norman perguntou para Ally. Ela também estava tensa.
- Você não me vai comprar um aparelho desse pra monitorar o peso dela em casa também, vai?
- Por enquanto, não.
- Pessoal, não precisa ficar tenso. Ela está com o peso um pouquinho abaixo do esperado, mas ainda temos duas semanas até isso mudar. E até o parto, muita coisa pode mudar. São só 50 gramas abaixo do esperado.
- Com o Ian foi a mesma coisa... - o sorriso de Ally aos poucos amarelava. - Será que não é melhor?
- Tem mais duas semanas até a gestação estar a termo. Não acho que vai ser preciso adiantar o parto por causa do baixo peso, mas vamos continuar de olho. Vamos ver o coração e a circulação agora.
- Você quer segurar de novo enquanto eu faço isso?
Ele apenas respondeu um "a-amham" que em nada disfarçou o quanto estava ainda em estado de choque em ver ali, naquela tela sua filhinha, tão nítida e tão próxima que quase conseguia sentir o cheiro de bebê em seu colo.
Pegou da mão de Norman o bastão e virou, desceu, foi para um lado e para outro. Ali estava de novo aquele som que parecia preencher toda a sala. Já não era mais tão acelerado quanto no começo. Por mais que já estivessem quase acostumados a ouvir o "pumpumpumpum" ritmado do coração, o volume em que a máquina reproduzia aquela cadência acompanhava a imagem de um pontinho azul e vermelho que se espalhava nas duas cores em direções separadas e voltavam para o mesmo ponto. Norman nem sequer percebeu que estava com o queixo caído o tempo todo, o olhar distante enquanto sentia como se passasse pelo aparelho em sua mão as vibrações da pulsação daquela criaturazinha que estava ali na tela.
- O coraçãozinho dela está ok, nenhum sinal de problema vascular...é só o peso mesmo, Ally. E ainda tem tempo, é comum às vezes os bebês "engordarem" de repente próximo do parto. Mas mesmo assim, volte na semana que vem para poder acompanhar essa evolução dela, ok?
- Ok.
Norman ainda olhava para a imagem congelada do coração do bebê, uma simples manchinha vermelha e azul do doppler vascular.
- Norman?
Ele piscou por um momento, como se tivesse acabado de acordar. Esteve dormindo acordado mesmo, pensando que logo teria aquela menininha nos braços. Quase conseguia se ver, fora da própria mente, ali diante dos olhos mesmo, com uma pequeninha nos braços olhando para os pássaros brincando no lado de fora da janela de casa. Olhou para a médica que estava parada ao seu lado.
- Aqui estão as fotos.
Entregou a ele a pasta branca e verde-claro com o logo do hospital. Precisou ler a etiqueta, só por satisfação e ver ali o nome dele, de Ally e Izabel Christine Reedus. A médica ainda olhava para ele e depois para Ally, confirmando que ele estava mesmo apaixonado.
- Pronto para o "ensaio", Shoo?
Ele respirou fundo e assoprou com força enquanto tirava o boné da cabeça e colocava de volta.
- Mais do que pronto. Let's do this!
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Problemática- (Sometimes) Bad Can Do You Some Good.
Romanzi rosa / ChickLitForam dois anos de esforços, tentado sustentar a relação e finalmente conquistar a confiança de Ally. Mas será que esses esforços bastavam? Com a relação evoluindo ao passo que a carreira de Norman avança, más decisões farão mal a todos. Mas será me...