57.

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-Desde quando você leu o primeiro livro. -Ele me olhou. -A menina que semeava, né? Seu preferido. -Assenti extasiada. -Desde aquele dia eu passei a ouvir tudo que você falava. Suas ideias sobre quem eu era ou poderia ser, suas muitas reclamações sobre a vida e os seus conselhos, você falando que sua família e amigos te achavam maluca, o que eu posso concordar. Ouvi todas as vezes que falou preocupada com os médicos e os enfermeiros. Também quando, falava para eles fazerem os exames necessários e extras não importando quão caro poderia ser. Eu adora quando lia para mim, sua voz soava como uma melodia nos meus ouvidor, só era ruim quando o livro era chato, mas acho que só teve um. Graças a Deus e ao seu bom gosto para livros. -Ele disse essa parte rindo e eu ri também.

-Por que não disse isso tudo antes? Sabia o quanto eu tinha interesse em saber que podia me escutar. -Perguntei olhando em seus olhos maravilhada com ele estar me contando o que eu tanto quis saber.

-Você revelou muita coisa sobre você e eu achava que não poderia retribuir todas as informações que me deu, sem falar que eu tinha que manter minha pose de menino assustador e durão, mas a verdade é... Eu já te achava incrível mesmo antes de acordar. -Abri um sorriso, não sabia se por suas palavras ou por ter tido uma revelação quase científica.

-Eu queria que pudesse me escutar, mas eu era tão tagarela e chata que, às vezes, queria que não me escutasse, só para ter sua paz. -Ele riu.

-Você era a única coisa que tirava o tédio dos meus dias. Você não tem ideia o que é ficar em coma, ainda mais quando consegue escutar o que falam a sua volta. Eu queria despertar, mas eu não conseguia. -Nunca havia parado para pensar por esse lado. Se ele me escutava quer dizer que ele não estava completamente apagado. Deve ter sido horrível encarar todos aqueles dias ali, deitado, enquanto o mundo passava a sua volta.

-Já passou, Zack. Não precisa ficar remoendo essas lembranças.

-Eu até gosto delas... Eu me agarrava a elas quando eu acordei e acabamos com uma relação meio hostil. Eu sabia que era por minha causa, mas não sabia ser de outro jeito, mais amigável como você diz. -Ele sorriu para mim e eu retribuí.

-Agora, não tenho mais uma relação hostil e não precisa ficar lembrando desses dias.

-É história, Bianca. É a minha história. Se eu não for lembrar de todos os dias tristes da minha vida minhas lembranças seriam cortadas dos meus doze anos para depois que eu acordei. -Queria deixar uma lágrima escorrer. Como é possível ter tanto sofrimento na vida de uma pessoa? -E tem mais uma coisa... -Ele chegou mais perto de mim e hesitou (eu também hesitei).

-O que é? -Minha voz saiu fraca.

Agora olhávamos um nos olhos do outro.

Um estranho em minha vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora