𝐶𝑜𝑟𝑡𝑒 𝑑𝑒 𝑆𝑜𝑚𝑏𝑟𝑎𝑠 𝑀𝑒𝑙𝑜́𝑑𝑖𝑐𝑎𝑠

CAPÍTULO 19

A sacerdotisa estava entre as grandes prateleiras de livros, duas horas mais cedo, quando tinha chegado até o escritório de Merrill, tinha ouvido um belo e irritante sermão sobre ser minimamente profissional e não se atrasar, apesar de já ter dito a ela que chegaria naquele horário por causa do aumento de tempo nos treinos e, é claro, Merrill tinha que fazer um escarcéu, tinha até ameaçado trocar de assistente, mas Gwyn admitia, sem vergonha alguma, que tinha quase implorado para que ela não fizesse aquilo.

Merrill podia ser insuportável às vezes, mas aquele era seu trabalho e não suportava a ideia de falhar naquilo. Já tinha falhado em coisas o suficientes em sua vida, não queria acrescentar mais um item à lista. Então, ela havia dito, mais uma vez, que continuaria trabalhando do mesmo jeito, a única diferença era que chegaria um pouco mais tarde, mas faria de tudo para recompensar. O que talvez não tivesse dito porque a sacerdotisa a olhou de cima a baixo, abriu um sorrisinho e murmurou um:

"Muito bem, que seja."

E agora ali estava tendo que vagar por todo aquele lugar atrás de todos os livros sobre línguas e sistemas de escritos antigos até o fim do dia, o que era basicamente impossível, por isso mesmo Merrill a tinha mandado fazer aquilo. Então, teria que dar um jeito de achar todos e mostrar a ela que era capaz. Tinha escalado Ramiel e sobrevivido a coisas muito piores, achar aqueles volumes entre milhares e milhares de livros não era grande coisa. E bem, já tinha conseguido oito deles, faltavam vinte e nove. Era um começo.

A única coisa que a incomodava era que Merrill não estava fazendo aquilo porque era realmente necessário, nem por conta de seu atraso, o real motivo da irritação da sacerdotisa era porque não tinha conseguido entender grande do que estava escrito no livro que tinha achado sobre os Mundos, aparentemente apesar de está escrito na língua deles em uma versão arcaica, dentro havia muitas passagem com outros sistemas, um que nem mesmo Merrill tinha visto ou sequer imaginado.

Gwyn admitia ter achado isso muito interessante, mas não viu muitas vantagens nisso, não quando tinha que lidar com o mau humor da outra sacerdotisa. A ruiva se deu um segundo para respirar, recolheu os livros que tinha deixado ao seu lado e saiu perambulando pela enorme biblioteca, fazendo questão de permanecer o tempo todo atenta somente às lombadas, mas ela não conseguiu por muito tempo.

A ruiva se encostou em uma das prateleiras e só precisou bater de leve na quina de uma estante para se lembrar da dor quase infernal em seus braços, elas e as outras haviam passado o resto da manhã praticando arco e flecha. Tinham se saído muito bem, Cassian disse, mas ainda eram lentas para um campo de batalha, então, voltariam lá amanhã e fariam tudo de novo. Se fosse preciso passariam o dia todo naquilo, ela estava disposta a continuar até que suas mãos sangrarem e seus braços perdessem qualquer utilidade, mas dominaria aquela porcaria.

E depois passariam para as lâminas gêmeas, elas já haviam usado uma vez ou outra, mas nenhum treino formal, ainda não tinham se aprofundado na técnica que aquilo exigia. Só que não era aqueles pensamentos sobre o treino que estava tentando ignorar. Era o que havia acontecido entre ela e Azriel, era a sensação que a percorreu quando as sombras dele a tocaram, a agitação que sentiu sob sua pele e ainda parecia ecoar por seus ossos. Era incômodo causado pelo silêncio que havia se instalado entre eles após isso.

Ela e Az não tinham mais se falado pelo resto da manhã. Tinham observado um ao outro de esguelha a cada oportunidade, mas não tinham se falado e era tão estranho, porque nunca havia sido daquele jeito, na primeira vez que ela o tinha o visto naquele ringue, o encantador de sombras tinha olhado para ela e sorrido, sorriso ao qual ela não respondeu, porque quando viu pela primeira vez em dois anos, a única coisa que conseguiu foi lembrar da noite em que ele a tinha salvado, do que tinha acontecido antes, sim, mas principalmente do que ele tinha feito por ela.