CAPÍTULO 48

2.7K 306 234
                                    

Gwyn jurava que seu corpo havia sido acorrentado no lugar, não conseguia se mover, não conseguia sequer respirar. Mal sentia seu coração, só sabia que ele estava batendo por causa do rugido do sangue em seus ouvidos.

Tinha todos os olhares sobre ela, mas ela não conseguia deixar de encarar Amren e mesmo que pudesse, duvidava que fosse capaz de encarar suas irmãs, nem Az. Um nó invisível se fechou em volta da sua garganta, culpa e medo se misturando.

Deveria falar alguma coisa, deveria, mas não conseguia. Ela engoliu em seco e mexeu a cabeça de um lado para o outro, se concentrando ao tentar falar:

— Eu... Eu não...

— Não? — Amren a interrompeu — Não o quê? Nunca ouviu falar de algo assim? Ou... — Um sorriso que fez um arrepio frio passar por sua coluna surgiu — Não pensou que alguém fosse descobrir?

Ela abriu a boca para falar, mas nenhum som saiu e mais ninguém falou. Bem, ela deveria ter esperado por aquilo um dia aconteceria, não tem como fugir de algo que está dentro de você, muito menos quando aquela coisa maldita parecia ser viva, pulsante, quando ela se arrastava por baixo da pele, sempre lembrando que estava ali e que nunca iria embora.

Tinha tentado tanto, tanto se manter sob controle durante toda a sua vida, provar que aquilo não a fazia ruim, que ela não seria um monstro como um dia pensaram que seria, mas agora... Gwyn fechou as mãos em punho, as impedindo de tremer e não ousou olhar para Azriel, mortalmente quieto ao seu lado, tinha pensado tanto em falar tudo para ele, tinha...

— Vamos, menina, diga alguma coisa.

— Amren... — a voz de Nestha soou em aviso.

— Não, Nestha, isso aqui é muito maior para que suas manias de irmã super protetora venham à tona. Diga, Gwyn, achou mesmo que conseguiria manter seu segredinho pela eternidade? Ao menos tem noção do que é? Do dom que carrega nas veias?

Ela engoliu seco, apertando as mãos com força, ao ponto de fazer a unha perfurar a pele e não conseguiu se livrar daquele nó em sua garganta para falar alguma coisa, então Amren continuou:

— Na primeira vez que a vi, fiquei curiosa, sabe? Havia algo em você, algo que não encaixava, algo que eu não conseguia decifrar, por mais que tentasse, foi aí que comecei a me perguntar porque Nestha tinha conseguido enxergar a Harpa justamente quando você estava cantando.

Seu coração errou uma batida e ela desviou os olhos, tinha sentido, naquele dia tinha algo a mais na coisa se agitando em seu sangue, ela tinha fechados os olhos e deixado fluir, a letra antiga tecendo um sonho embaçado em sua mente, como se coberto de névoa, mas podia discerni, de certa forma sentir, era um lugar lindo, musgo e rios cristalinos e uma floresta, uma rocha enorme se erguendo no centro, pulsando, chamando, cantando em resposta e então, o dedilhar e o som agudo de instrumentos, um clarão, gritos abafados e dolorosos e distantes e tudo ficou escuro.

A música acabou, abriu os olhos, o coração galopante e viu Nestha desabar de joelhos, seu coração subira até a garganta com a ideia de que deveria ter feito algo ruim, o medo tinha feito seu sangue parar de correr nas veias, mas Nestha não falou nada sobre ela, nada específico daquilo com ela, então, quis acreditar que deveria ter sido outra coisa, que o sonho em sua mente tinha sido só uma alucinação causada pela melodia da música.

— Sempre me perguntei o porquê disso, — a fêmea continuou — Primeiro pensei que era uma coincidência, mas essas coisas não existem, tudo acontece por um propósito e naquele dia da cerimônia, quando vi você, soube que havia algo a mais. E, então, esse livro apareceu justamente para você, basicamente caiu aos seus pés, logo depois de o que quer que fosse na escuridão abaixo da biblioteca ter lhe espiado. Ah, com toda a certeza tinha algo mais. Então comecei a ligar os pontos e quando essa coisinha linda apareceu, — se referiu ao livro — sabia que estava certa, que tinha algo muito maior por trás disso. Não era só seu sangue ninfa que a tornava diferente, não... Um ser da luz.

𝐶𝑜𝑟𝑡𝑒 𝑑𝑒 𝑆𝑜𝑚𝑏𝑟𝑎𝑠 𝑀𝑒𝑙𝑜́𝑑𝑖𝑐𝑎𝑠Onde histórias criam vida. Descubra agora