CAPÍTULO 81

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Gritos.

Era tudo o que conseguia ouvir: gritos.

Mal tinha atravessado, mal havia conseguido firmar seus pés na grama verde da primavera, intocada pela passagem do tempo, e o som de gritos de pavor encheram completamente seu entorno. Pareceram adentrar em todos os seus sentidos.

Já tinha ouvido gritos assim antes.

Ela respirou fundo e usou o silenciamento mental para manter a calma e o foco. Sacou as lâminas gêmeas em suas costas e as apertou com firmeza. Nesse instante, o que restava da luz que a encobria se dissipou e o caos a sua frente ficou completamente nítido.

O que deveria ser um vilarejo estava pegando fogo, jorrando sangue, com soldados e bestas cinza-escuro, parecendo ser feitas de pedras, correndo ao redor, saqueando e... matando. A palavra não tinha terminado de soar em sua mente quando, rápido demais para que pudesse se mexer, viu a metros a sua frente, uma feérica carregando uma criança nos braços correr com tudo o que tinha, só para que o equilíbrio a atraísse e ela caísse, levando consigo o ser em seus braços.

Não teve tempo de se mover. Não teve tempo de gritar ou fazer qualquer coisa, apenas viu, horrorizada e com o coração na garganta, uma daquelas coisas saltar por cima da fêmea e com um simples movimento da mandíbula cheia de dentes afiados e podres arrancar a cabeça dela e no segundo seguinte, pegar a criança pelo tronco, quase a partindo em dois.

Jurava que ouviu os ossos da coluna estalarem conforme o sangue jorrava. Jurava que podia ouvir o eco daquele som quando a besta jogou o pequeno corpo inerte longe. Como se fosse nada.

A ruiva sentiu o vômito vir na garganta, sentiu um tipo de torpor a tomar, mas tudo aquilo sumiu quando notou a criatura correr, indo da o mesmo fim a outra pessoa desprotegida. Aquilo fez uma espécie de combustível explodir em suas veias, e sem pensar duas vezes, ela correu. Diretamente para frente daquela coisa.

Ao longe, em outro lugar, distante do ruído em sua cabeça e raiva que basicamente a havia possuído, ouviu alguém gritar seu nome. Mas a única coisa que realmente conseguia ouvir eram pequenos ossos quebrando, carne e pele sendo rasgada e os gritos ao seu redor.

Era só uma criancinha.

O demônio a notou. Ela viu a boca se abrir, ligas de sangue fazer fios entre os dentes quando mordeu o ar e passou a correr mais rápido, vindo para cima dela. A valquíria sabia que se ficasse de frente para aquela coisa, naquela posição, iria acabar morta. Por isso, quando viu aquilo começar a saltar para a derrubar, derrapou sobre a grama, deixou que ele passasse por cima de si enquanto fincava uma das espadas no chão para não acabar indo longe demais.

A besta aterrissou, um tanto confusa. Mexendo a cabeça de um lado para o outro e com as narinas se dilatando. Ela não pensou muito ao se erguer novamente, arremessando uma adaga no flanco daquela coisa, o que a fez soltar um ruído que quase explodiu seus tímpanos. Também não deixou que se recuperasse do golpe e ergueu a espada ainda na sua mão, depois a desceu sobre o pescoço negro e escamoso.

Outro ruído quando a lâmina cortou a pele, mas não o suficiente para o matar. Então, ela retirou a espada, deixou que luz banhasse suas mãos e desceu a lâmina outra vez, com mais força e mais precisão que na primeira. Um tipo de sangue escuro e fétido espirrou e melou sua arma quando a cabeça do demônio caiu no chão.

Nesse instante, um lampejo de azul cobalto chamou sua atenção. Seu olhar se desviou a tempo de ver a energia brutal dos sifões do seu parceiro literalmente explodir algumas daquelas coisas. Mas não teve muito tempo para manter a atenção em Azriel, não quando a ouviu Emerie a chamar.

𝐶𝑜𝑟𝑡𝑒 𝑑𝑒 𝑆𝑜𝑚𝑏𝑟𝑎𝑠 𝑀𝑒𝑙𝑜́𝑑𝑖𝑐𝑎𝑠Onde histórias criam vida. Descubra agora