Criastealle bufou de cansaço quando finalmente desmontou a cela.
Gwyn jogou o objeto de lado e fez carinho na pégaso, murmurando, como sempre fazia, o quanto ela era valente.
Não sabia como o tempo podia passar tão rápido e tão devagar numa situação como aquela, mas as horas em batalha se arrastavam ao que parecia ser a eternidade, mas, quando piscava, o dia já tinha acabado. A escuridão tomava conta do lugar e o fluxo da batalha diminuía, então havia a troca de batalhões.
Nessa rotina, já haviam se passado dois meses.
Neste meio tempo, ela já tinha visto tanta coisa que não sabia muito bem onde havia ido parar seus escrúpulos em relação a ferimentos, sangue e morte. Cortar gargantas e abrir intestinos, de pessoas ou bestas — já não fazia tanta diferença entre uma coisa e outra — tinha se tornado algo quase completamente natural.
Criastealle baixou a cabeça e a pressionou levemente contra seu rosto, parecendo a conforta, como se soubesse a morbidade dos seus pensamentos. A sacerdotisa olhou para a linda criatura à sua frente, as asas reluzentes agora manchadas de terra e sangue, assim como a pelagem branca.
— Não é incrível que ainda consiga permanecer encantadora mesmo após um dia inteiro em batalha?
A guerreira se virou e viu Helion se aproximar, meio manco. Veja bem, o Grão-Senhor ainda continuava bonito, mas aqueles malditos dias lutando quase incansavelmente não faziam bem a ninguém, mesmo assim, ele mantinha o chame.
— Criastealle tem esse dom — respondeu, tentando colocar um pouco mais de animação no tom — Mas não fique com inveja, Helion, você ainda não perdeu todo seu encanto.
O Senhor da Diurna riu.
— Agradeço ao elogio, mas estava falando da nova dona dela.
Foi sua vez de rir. Tinha sido a única coisa boa que a guerra tinha lhe trazido: A linda pégaso agora era sua. Foi a forma de agradecimento do Grão-Senhor, após elas duas terem, por muito pouco, impedido que perdesse a cabeça. Literalmente.
— Helion, Helion... — ela brincou — Meu parceiro é extremamente ciumento, sabia?
O macho ao seu lado lhe deu uma piscadinha e falou, no mesmo tom:
— Bem, ele não está por perto, está?
Não, Azriel não estava.
Fazia dias, não tinha certeza de quantos, que não o via. E, apesar de saber que Helion disse aquilo brincando e não tinha a intenção de fazer o clima pesar, não conseguiu conter a pontada de saudade e preocupação.
Ele deve ter visto os sentimentos estampados na sua cara, porque apertou seu ombro levemente e lhe deu um fraco sorriso de desculpas. A ruiva só sorriu fracamente de volta, balançou a cabeça e perguntou:
— Mas você não atravessou metade do acampamento para me elogiar, não é? O que o traz aqui?
— Se a senhorita me permitir, queria levar Criastealle hoje, Meallan está impossível de lidar e só ela para o colocar nos trilhos.
Gwyn sorriu quando ouviu sua montaria bufar, como se estivesse concordando em um tom irritação.
— Leve, deixe que passe alguns dias com ele — propôs — Essa garota também precisa descansar e as Valquírias vão precisar de mim a pé em campo.
A última parte soou mais baixa, porque, sinceramente, doía admitir. As guerreiras iriam precisar dela lá porque estavam em menor número agora, depois de Ilana, mais duas guerreiras, Belina e Lavin, também tinham morrido em batalha. E aquilo era como uma ferida aberta entre todas elas, mas seguiam lutando.
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𝐶𝑜𝑟𝑡𝑒 𝑑𝑒 𝑆𝑜𝑚𝑏𝑟𝑎𝑠 𝑀𝑒𝑙𝑜́𝑑𝑖𝑐𝑎𝑠
FanfictionSorrir não é o mesmo que estar bem. Não falar não significa não ter nada a dizer. Azriel sempre guardou para si tudo o que sentia. Suas cicatrizes são muito mais profundas que aquelas em suas mãos, seu passado ainda paira sobre ele como um fantasma...