A verdade Feia

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Ela pensou que ela seria a única a distribuir seu verdadeiro castigo, não é? Aquele momento em que Evey Hammond deu meia volta e se afastou confiante da Galeria das Sombras, V poderia dizer. Ele podia ver isso em sua linguagem corporal. Ela encontrou sua força, sim. E agora com isso, ela iria mostrar a ele exatamente o quão desnecessário, e absolutamente desdenhoso ele realmente era. Nem mesmo um olhar por cima do ombro quando ela fez sua saída final, porque na verdade, ele não valia nem isso.

Ela pensou que o estava relegando, não, condenando-o ao silêncio, à escuridão e à solidão. Para o nada que ele merecia.

Não haveria mais alguém para ouvir, quando o vigilante oculto ansiava pelo compartilhamento mais básico de outra voz humana. As palavras caíram inutilmente nas orelhas cheias de cimento do busto de Shakespeare. Mesmo aquelas conversas restritas durante seus últimos dias de recuperação, pareceriam uma recompensa perdida há muito tempo em comparação com o silêncio absoluto que o cercava agora.

Não haveria mais uma testemunha da humanidade e cultura que ele tentou manter, aqui embaixo, no que a maioria das pessoas consideraria túneis subterrâneos de ratos. Não haveria ninguém para reconhecer que o terrorista de sangue frio realmente se interessou pelos aspectos mais sutis da vida. Na literatura. Nas artes. Na história. Que ele não era totalmente desumano.

Não que ele tenha provado o contrário durante essas últimas semanas de crueldade, veja bem.

A partir deste momento, não haveria ninguém para se importar se ele vivesse ou morresse. Na verdade, ninguém para mesmo saber se ele viveu ou morreu. E esse foi o cumprimento final dessa palavra tão temida 'sozinho'.

Foi com isso que ela pensou que o estava deixando, enquanto caminhava forte e orgulhosa de volta à terra dos vivos. Por que se preocupar com ele? Ele já estava morto. Obcecado. Enterrado literalmente. E sozinho.

Este seria o seu verdadeiro castigo.

Certo?

Não exatamente.

Ele não estava realmente sozinho. Ela não o estava deixando 'sozinho'. Havia algo mais aqui embaixo, se instalando como um novo inquilino.

Ele espreitava nos cantos escuros. Ela o encarou maliciosamente da poça cinzenta de sua própria sombra. Ele esvoaçava atrás das cortinas e portas nesta débil tentativa de uma morada adequada.

Quais foram aquelas palavras clássicas da caneta de L. Frank Baum? Pela força invisível que governa seu próprio mundo oculto? 'Estou em toda parte, mas aos olhos dos mortais comuns sou invisível.' ... Sim. Muito apropriado.

Durante anos, apenas V sabia da presença de sua contraparte. Seu cúmplice... Seu inimigo.

Ele tinha feito uma trégua com isso. Aceitou sua existência onipresente e reconheceu sua profecia para sua vida. Ele sabia o quão danificado o herói realmente estava, tanto por dentro quanto por fora. Assegurou a V calmamente, consistentemente, e enquanto ele podia se lembrar, que certos aspectos da experiência humana não deveriam ser dele. E em consolo, ensinou-lhe paciência, foco e aceitação de sua verdadeira tarefa.

Quando pacificado, quando contido, tinha sido uma de suas maiores fontes de força de vontade.

Agora, porém, Evey Hammond tinha chamado a público, aquela coisa que vivia nas sombras. Aquela coisa que havia orquestrado e controlado essas últimas semanas de sua tortura. Cresceu em força e dobrou em poder, alimentados com amargura e raiva purulenta. Ele saiu como o mago de trás da cortina. Mas magos não vivem em túneis de ratos. Este era o reino dos monstros. E esse era exatamente o nome que Evey lhe dera.

Monstro...

Quando ela partiu, quando Evey Hammond saiu deste labirinto, em passos leves mais adequados para o mundo acima, ela deixou V não sozinho, mas preso ao lado do monstro.

VIOLA - V de VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora