Capítulo 19

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Fiquei no hospital com Christopher até tarde no domingo, mas precisei voltar para a SE. Na segunda pela manhã ele estava lá, destruído. Parecia que um caminhão havia passado em cima dele. Não havia animação alguma durante suas aulas e os alunos começavam a falar sobre isso.

Ivalú praticamente me segurou para eu não ir até ele uma vez quando percebi um tom falho em sua voz. Trocamos olhares várias vezes durante a aula, porém um olhar triste.

Sequer mencionei a hipótese de vê-lo depois da aula, já sabendo onde ele iria estar, embora minha vontade fosse estar com ele todos os dias, o tempo todo para lhe confortar.

Foi uma semana de aula estranha, sem muita conversa, mas apenas eu entendia o que se passava. Eu, Pedro e Ivalú. Contei a eles tudo o que estava acontecendo somente quando voltei do hospital. Eu estava exausta e pra ajudar ainda tive que passar por um interrógatório de Rodrigo com as mesmas perguntas de sempre. Já podem até imaginar o meu nível de mal humor para cima dele. Por pouco não coloquei tudo a perder.

Todos os dias, durante toda a semana, eu era sempre a última a sair da sala. Precisava dar mesmo que fosse apenas um abraço nele e deixar uma mensagem como as que estávamos trocando.

Durante a aula depois do almoço na sexta-feira, Arturo interrompeu a aula e o chamou. Christopher pediu licença e se retirou por alguns minutos. Pude vê-lo de onde eu estava conversar com Arturo no corredor. Meu coração se apertou quando ele se encostou na parede escondendo o rosto. Sabia o que havia acontecido quando Arturo passou a mão pelo rosto sem saber o que dizer, emora não desse para escutar nada. Quando voltou tinha os olhos vermelhos. Ele recolheu suas coisas e se retirou sem dizer nada. Devencilhou-se de Arturo que tentou tocar-lhe os ombros e saiu em passos firmes.


Arturo nos dispensou, mas não explicou à turma o que estava acontecendo, embora houvesse cochichos em todos os lados. Esperei que a sala se esvaziasse fingindo estar mechendo em minha mochila. Arturo ainda estava parado na porta quando eu me levantei e fui até a porta olhando o corredor e verificando se tinha alguém presente.

- Já imagina o que houve não é?

- Ela... - Não consegui completar mesmo assim ele assentiu. Apesar de mal conhecê-la, minha voz falhou. Sabia bem como o meu Christopher estava se sentindo. A sensação de que acabara de perder a pessoa que você mais ama na vida e que nunca mais voltará a vê-la e a pior coisa do mundo.

- Pode me passar seu telefone? - Ele perguntou. Sua voz tinha um tom baixo. - Qualquer coisa eu entro em contato com você. - Peguei meu bloco de notas na mochila junto com uma caneta, anotei meu número e entreguei a ele.

- Eu quero vê-lo. - Pedi, mas meus olhos suplicaram. Eu precisava ficar com ele, ele precisava de mim.

- Dê um tempo a ele. - Assenti mesmo sem aceitar essa decisão. - Eu preciso ir agora, te ligo mais tarde.

- Ok. - Segui meu caminho em silêncio.

Encontrei Ivalú e Pedro no pátio da escola. Eles estavam sentados em um dos bancos conversando. Tinha mais alguns aluos por ali e tinha certeza de que estavam comentando sobre o ocorrido. Me sentei ao lado de Pedro em silêncio.

- O que foi Dulce? Conseguiu descobrir o que houve? - Pedro preguntou curioso. - Estão todos comentando isso. Ele estava chorando.

- Pedro. - Ivalú chamou-lhe a atenção vendo meu semblante.

- A mãe dele. - Respondi baixo e um silêncio se seguiu. - Eu vou para o quarto, se souberem de alguma coisa me avisem. - Tornei a me levantar.


Fiquei no quarto olhando para a tela do celular esperando que alguém me ligasse ou mandasse alguma mensagem. Como eu queria estar ao lado dele. Christopher estava sofrendo e eu nem estava ao lado dele. Já passava das sete da noite quando o telefone em fim tocou e eu o atendi às pressas. "Dulce, é o Arturo. Eu vou passar aí na SE pra pegar você às oito e meia, a gente se vê." Oito e meia em ponto ele estava lá para me pegar.

- Como ele está?

- Péssimo. Eu vou levar você para a casa da irmã dele.

- O velório será lá?

- Sim. Bom, pelo que me informaram vão levar o corpo para a igreja pela manhã onde farão uma cerimônia e depois vão cremar.

- Oh... eu pensei que iriam enterrá-la.

- Foi o último desejo dela. - Ele ficou um tempo em silêncio e então continuou. - Dulce, se puder, tira essa pulseira? Pelo menos enquanto durar esse velório. Tem alguns funcionários da SE aqui, e meu pai provavelmente virá também.
- Ok. - Tirei a pulseira e guardei-a na bolsa.

Demoramos uns vinte minutos a chegar na casa da irmã de Christopher. O local estava lotado, carros enchiam as ruas. Arturo demorou um pouco até encontrar uma vaga. A casa era igual às casas dos filmes. Eu tinha uma queda por essas casas. Arturo cumprimentou algumas pessoas no trajeto da casa até a sala onde o corpo estava. O caixãoe estava aberto mas não consegui olhar diretamente para ele. Ao lado dele estava Christopher, sentado em uma cadeira e de cabeça baixa.

- Chris. - Sussurreiquando me aproximei dele.

- Oi. - Ele levantou o olhar a mim. - Você veio.

- Claro, não iria deixar você quando você precisa de mim. - Ela acariciou o rosto dele. Christopher se levantou e a abraçou forte. - Eu sinto muito, sinto mesmo. Queria ter vindo mais cedo, mas não teve como.

- Só de você estar aqui agora já me deixa um pouco melhor menina. - Apesar de sua voz fraca, ele não estava chorando, nem mesmo seus olhos estavam vermelhos. Christopher voltou a se sentar e eu me sentei ao seu lado sem saber o que dizer. Algumas pessoas vinham até ele o deixar seus sentimentos. - O médico disse que ela estava dormindo na hora.

- Ela estava sozinha?

- Minha irmã estava lá com ela, disse que foi de uma hora pra outra. Tentaram reanimá-la mas sem êxito. Me pergunto se ela sentiu alguma dor ou se simplesmente se foi.

- Tente não pensar nisso, isso pode te corroer. - Segurei a mão dele. - Ivalú e Pedro te mandaram um abraço.

- Obrigada. - Ele olhou nossas mãos entrelaçadas. - É cômico não é?

- O quê?

- Quando eu soube eu comecei a chorar, mas depois de vê-la eu não consegui derrar uma lágrima sequer. É como se eu estivesse em um pesadelo, e soubesse que iria acorda qualquer instante.

Nunca pensei que eu conseguiria ficar uma noive inteira desperta, apenas sentada fazendo compania a Christopher em meio a tantas pessoas estranhas. Conheci Sophia, a irmã dele. Ela estava tão ou mais destruída que ele. Claire, a sobrinha dele também estava lá. Ela falou algo muito bonito para Christopher e para mim. - Ela disse que quando fosse um anjo, ela iria cuidar da gente. E disse também que não era pra eu chorar, que ela ia para um lugar muito lindo e que um dia todos nós nos encontraremos lá. - Ela se sentou no meu colo, o que eu achei estranho. - Ela mandou dizer também que está muito feliz por meu tio ter alguém como você tia Dul. E que te ama muito tio Ucker. - Ela depositou um beijo na bochecha dele e ele retribuiu com um sorriso tímido. Claire me chamou de tia, e eu me senti estranha por isso.

Pela manhã seguiu-se exatamente como Arturo dissera. Levaram o corpo para a igreja onde o reverendo fez uma cerimônia. Ao que parece ela era muito querida por todos. O local estava tão cheio que todos os bancos da igreja não foram suficientes para acomodar todas as pessoas. A cerimônia durou metade da amanhã, e na outra metade o corpo foi cremado. Fiquei ao lado de Christopher o tempo todo.
No final de tudo, Arturo nos deixou no apartamento dele.

- Por que não toma um banho Chris? Eu vou preparar algo pra gente comer. - O vi se sentar no sofá.

- Eu não estou com fome, não precisa fazer isso por minha causa.

- Preciso e vou. - Caminhei até ele e tirei o terno preto que ele usava. - Olha, você tem

todo direito de ficar cabisbaixo assim, mas não se esqueça que a vida segue a diante,por favor.

- Não me esqueci. - Ele afrouxou a gravata e Dulce terminou de tirar por ele. - Vai lá dentro, toma um banho bem gostoso enquanto eu preparo algo pra gente.

- Fica comigo esse fim de semana? Não quero ficar sozinho.

- Claro. Eu não o deixaria sozinho aqui nem se você quisesse.

Depois que Christopher tomou banho e comeu ele simplesmente desmaiou na cama. Fiquei o olhando dormir de bruços. Ele estava exausto com tudo isso.
Tomei um banho também e vesti com uma blusa dele. Ainda bem que sempre carregava roupa íntima extra na bolsa, nunca se sabe quando precisaremos dela.
Me deitei ao seu lado e acabei dormindo também.
Acordei com o som de alguns soluços. Christopher estava sentado ao meu lado chorando. Me sentei e o puxei para meus braços. - Pode chorar. Coloca pra fora. - Beijei a cabeça dele. Era a primeira vez que o vi chorar desde a saída dele da SE.

- Canta pra mim? - Ele pediu. Consegui enxergar um menino em meus braços. Uma criança desesperada. - Por favor. Ela fazia isso quando eu era criança.

- Chris.

- Por favor.


- Tudo bem. Qual música você quer que eu cante?

- Tanto faz, eu só preciso ouvir a sua voz. Ela me acalma. - Pensei um pouco em alguma música e comecei a cantar baixinho Dram do Imagine Dragons, uma das minhas preferidas. Sentia meu coração pulsar mais forte a cada soluço que ele dava em meus braços. 

[REVISÃO] Intercâmbio (Vondy)Onde histórias criam vida. Descubra agora