91. safe and sound

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— michael!

Do outro lado da ilha de mármore da cozinha, Pandora não tirava os olhos de Michael. Os aros de safira em volta da pupila brilhavam como se ela estivesse se maravilhando com uma pintura renascentista de um museu. Havia deslumbre naquele olhar, assim como a mais profunda reverência.

Ele amou ser encarado dessa forma.

— Gostando da vista? — Ergueu a sobrancelha, os cantos dos lábios se curvando em provocação.

A Angemonium inclinou a cabeça. Não chegou a sorrir, mas os olhos dançaram com diversão.

— Bastante — admitiu, a voz entretida. Os dois tinham parado de chorar havia um tempo, mas a pele em volta do seu nariz ainda estava enrubescida. — Senti falta de ver seu rosto assim.

— Assim como? — No exato momento que terminou de pronunciar a pergunta, arrependeu-se. A resposta era um tanto óbvia.

Ela recostou o corpo contra o banco alto, afastando-se um pouco da superfície de mármore que os dividia. Uma sombra de dor passou pela sua expressão, mas o olhar sobre ele permanecia o mesmo.

— Sem ódio — respondeu, pousando as mãos nervosas sobre o colo. — E vivo.

Ele meneou a cabeça juntamente às suas palavras, o cotovelo descansado sobre o balcão. Apoiou o queixo no punho, os olhos incapazes de se desviarem dela.

Sabia bem como era aquele pedaço de tormento, o vivera por um curto período de tempo nas duas vezes que realizara as Sete Maravilhas.

— A primeira vez que a vi foi no Inferno — confessou Michael, o coração se acelerando. Pandora empertigou-se no assento, os olhos se arregalando. Vinha escondendo aquilo havia anos. — E, quando a encontrei na Igreja da Noite e senti a energia que emanava, soube que precisava me aproximar. Precisava entender o porquê de ser você aquela que me torturaria pela eternidade, assim como precisava tê-la como aliada.

— Por que nunca me contou? — Não havia julgamento em seu rosto, apenas curiosidade genuína.

O Anticristo deu de ombros, o olhar perdido nela ao passo que a mente vagava pelas memórias bagunçadas. Ainda não tinha aprendido a conciliar aquelas duas consciências.

— Medo, acho. Não queria que soubesse o tamanho de poder que tinha sobre mim.

— Mas não tem problema que eu saiba disso agora — ela adivinhou.

— Presumo que não. — Ele riu suavemente, desacostumado ao som da própria risada depois do mês que passara sem esboçar um único sorriso. — Contanto, é claro, que não use dessa informação para agir como a criaturinha perversa que é.

— Como exatamente eu agiria como uma criaturinha perversa?

— Se eu começasse a citar todos os motivos agora, não chegaria ao fim até o Verão.

Ela revirou os olhos, comprimindo os lábios e soltando o ar pelo nariz. Michael soube que seria o mais próximo que chegaria de uma gargalhada, e estava contente com isso.

Você é a criaturinha perversa, lindinho — a jovem retrucou, os olhos se enrugando nos cantos. — E a minha lista de motivos sobre isso se estenderia até o Inverno do ano que vem.

— Você não perde uma, perde?

— Não mesmo. — Fez uma pausa, os dedos tamborilando sobre o balcão. — Está com fome?

Só então, a ficha de Michael pareceu cair. Passara tanto tempo preocupado com Pandora, que não se atentara ao fato de que passara dias inconsciente e sem comer.

ME AND THE DEVIL ➸ michael langdonOnde histórias criam vida. Descubra agora