107. fallen pieces of the chessboard

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— pandora!

Pandora estava esparramada em uma superfície sangrenta que parecia querer engoli-la. Ela mal conseguia se mover, como se toda a sua força tivesse sido roubada; formular um pensamento sequer fazia sua cabeça rachar em vários pedaços. O terror era tamanho que fazia seus pulmões arderem por um grito que não conseguia soltar.

Então uma mão envolveu seu pescoço, um toque tão bruto que poderia parti-lo em um único movimento. A híbrida foi erguida do chão, seu olhar encontrando os olhos pretos que a assombravam havia meses. Os olhos que vira uma última vez antes de ter seu coração arrancado de seu peito, transbordando sadismo e prazer.

Ela esperneou, tentando se soltar, mas aquele aperto se tornou mais forte. A híbrida segurou seu braço, tentando queimá-lo, tentando afastá-lo, tentando fazer alguma coisa. Mas não conseguia acessar seus poderes, não conseguia encontrá-los dentro de si ou em qualquer lugar em sua volta. Estava esgotada.

— Você acha que tem alguma chance contra mim, quando nem mesmo conseguiu salvar seu pai? — disse Lúcifer, seu hálito parecendo fogo contra a pele dela. — Cultivo meu poder há milênios e agora ele está em seu ápice. Eu sou indestrutível.

A Angemonium não conseguiu dizer nada, não quando cada suspiro era abafado pela mão em sua traqueia.

A mão dele atravessou seu peito mais uma vez, agarrando o coração que palpitava cada vez mais rápido com o medo. Ele puxou-o em um movimento rápido e limpo, e permitiu que ela caísse de volta ao chão onde estivera anteriormente.

Mas não era o chão, ela percebeu. Pandora estava caída em uma pilha de corpos, enterrada com eles pela sua culpa e medo. O resultado aterrorizante de seu fracasso.

A híbrida acordou se afogando em suas lágrimas. Ela sentou-se de súbito, soluçando e tremendo. Não muito diferente das outras noites. Havia pouco mais de uma semana que o ritmo de sonhos com o seu inferno privativo diminuíra, mas os pesadelos continuaram mesmo assim, cada um mais criativo que o outro.

Levou a mão ao coração acelerado. Sentiu conforto a cada pulsar contra sua palma, contou as batidas até ter certeza de que o órgão ainda a pertencia. Para ter certeza de que não fora roubado novamente.

Olhou para o lado, encontrando Michael acordado, sentado do seu lado. Ele parecia não saber ao certo se podia tocá-la ou não. Já haviam superado aquele período de distanciamento, mas ainda assim existia um leve receio no ar sempre que ela levantava de um sonho ruim.

Pandora não disse nada a ele. Ela ergueu-se e foi até a escrivaninha, onde seu diário se encontrava, intocado desde a tentativa falhar de escrever nele sobre a morte do pai. Lá, ela narrou o sonho terrível que tivera, a sensação dos cadáveres sob seu corpo e os olhares sem vida de seus aliados. De sua família.

De Michael.

As lágrimas não paravam de escorrer, e ela não parava de escrever. Tinha medo, tanto medo. Não podia perder aquela luta, não quando todas as vidas estavam em jogo menos a sua. Não quando teria uma eternidade toda para remoer a culpa e o fracasso caso falhasse.

Ela descansou a caneta, com um suspiro. Por um momento, não se moveu, encarando os rabiscos adiante. Havia apenas seu coração pulsante e sua respiração ruidosa.

Lágrimas não venceriam a guerra por ela. E a híbrida já perdera tempo demais chorando.

— Dora... — Michael chamou, e ela ouviu o edredom farfalhar.

— Eu estou bem. — Ela não estava. Nem um pouco. — Pode voltar a dormir. Eu já volto para a cama.

O Anticristo não insistiu mais. Aqueles minutos após um pesadelo eram os mais sensíveis para ela, e o rapaz descobrira da pior maneira o que acontecia quando o seu limite era extrapolado.

ME AND THE DEVIL ➸ michael langdonOnde histórias criam vida. Descubra agora