43§ O homem que tinha medo de falar

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A mãe teve de se justificar perante uma acusação bastante grave que desafiava a sua idoneidade. No entanto, parece haver uma luz ao fundo do túnel...

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- MÃE -

Pousou as duas chávenas de café na mesa da sala, juntamente com algumas tostas, para os convidados. 

Tal como da primeira vez que o conhecera, o taxista mostrava-se nervoso e incómodo com a situação. O homem, algo mais velho que ela, evitava de a olhar nos olhos.

– Obrigado por ter vindo! – disse-lhe ela, tentando disfarçar toda a expectativa que tinha. – Não imagina o quão importante é, quer para mim, quer para a minha filha, o seu depoimento.

No mesmo instante em que a palavra lhe saiu da boca, viu que tinha-se precipitado. Perante o termo "depoimento", o homem levantara-se do sofá e começara a andar em círculos na sala.

– Eu... não posso! – gaguejou ele. – Eu não posso depor.

O barman interveio de seguida, acalmando o homem. Convenceu-o a voltar a sentar-se e começou a explicar-lhe a ela toda a história deste taxista.

– Ele é um emigrante e encontra-se ilegal! Tem medo de se envolver com a polícia e ter problemas.

Uma angústia voltou a invadi-la. Era como se afinal tivesse regressado à casa de partida num jogo de tabuleiro e a aparição daquele homem não mudasse nada. 

Sem o testemunho do taxista, todo o seu depoimento continuava catalogado pela polícia como "questionável".

– Mas eu preciso mesmo que conte o que se passou, naquela noite, à polícia! – pediu desesperada ao homem, que continuava a não encará-la. – Pense na minha menina, que continua desaparecida.

– E... a minha mulher... e as minhas crianças? – questionou o taxista. – Se perco este trabalho... como vão sobreviver?

O taxista vivia com a esposa e três crianças, numa das zonas mais degradadas do bairro. Tal como ele, o resto da família também se encontrava ilegal. 

Segundo o barman, eles tinham fugido do seu país natal há uns quatro anos e se refugiado ali, em condições precárias, mas longe das balas perdidas e dos massacres que assolavam a pátria deles. 

A única fonte de rendimento advinha do trabalho que o homem desempenhava, geralmente só fazendo os turnos da madrugada, longe dos olhos das autoridades.

– Desde aquele dia em que te levou até à estação, ele não trabalhou mais. – complementou o barman. – Dado o mediatismo que o caso tomou, ele tem estado escondido em casa com a família, temendo que possa ser acusado de alguma coisa e que acabem todos por ser expatriados.

Em condições normais, certamente ela ter-se-ia sentido solidária com a causa do pobre homem. 

Geralmente, tendia a sentir empatia com a situação desfavorecida em que algumas pessoas eram obrigadas a viver. 

No entanto, naquele momento, só conseguia pensar que também ela era uma vítima, uma mãe órfã de filha. 

Por mais que tivesse dó do homem, era dever dela garantir que ele testemunhava e punha a investigação do desaparecimento da menina na direção correta.

– O que posso fazer para que mude de ideias? – questionou e, de repente, foi como que invadisse-a o espírito da mãe. – Quanto quer para revelar à polícia tudo o que presenciou naquela noite?

– Não vamos por aí! – interrompeu prontamente o barman, procurando corrigir a observação infeliz que ela tivera. – O que tínhamos pensado era que, atendendo há relativa proximidade que tu já deves ter com o inspetor, poderias falar com ele primeiro e obter alguma garantia de que nem este homem nem a sua família saiam prejudicados desta situação.

Embora a sua relação com o inspetor não estivesse nos melhores dias, isto se alguma vez tinha gozado de boa saúde, ela reconhecia que o agente procurava ser uma pessoa sensata e ponderada no que fazia. 

No íntimo, ela admitia que o polícia agia com as melhores intenções para resolver o caso, atuando de acordo com as suas fortes convicções. Pena que elas estivessem focadas nos alvos errados.

– Por favor, sente-se, beba o seu café e acalme-se. – pediu ela ao taxista. – Tudo vai se resolver da melhor maneira. Só preciso de fazer um telefonema.


Depois de ter trocado olhares com o barman e ter a certeza de que ele manteria o homem ali, subiu até ao seu quarto e ligou para o advogado que a mãe lhe cedera. 

Relatou-lhe todo o sucedido, discutiram as opções que tinham e o melhor modo de proceder.

Não se preocupe, eu vou falar pessoalmente com o inspetor e certificar-me de que o taxista não sofrerá qualquer represália. – garantiu-lhe o advogado. – Apenas consiga trazer esse homem à delegacia. Pode inclusive prometer-lhe que irei ajudá-lo com todo o processo de legalização.

- Faria isso? – questionou ela incrédula. – Penso que ele não tem capacidade financeira para pagar os seus serviços.

Não cobrarei os meus serviços. Os seus pais estão-me a pagar uns honorários generosos para poder fazer face a alguns procedimentos extra que possam advir deste processo.

Claro que sim! Como sempre, os pais tinham resolvido o problema com dinheiro. 

O importante era evitarem de ser incomodados por mais aquele drama que a ovelha negra da família impusera-lhes.

– De quanto tempo necessita até chegar à delegacia?

Por acaso, não estou muito longe do bairro! – referiu-lhe o advogado. – Do ponto onde estou até à delegacia é menos de uma hora!

Ela regressou à sala, reconfortada pela solução que o advogado apresentara-lhe. O facto dele ir acompanhar presencialmente todo o caso dava-lhe uma confiança acrescida.

– Falei com o advogado da minha família e ele vai guiar-nos em todo este processo. – transmitiu ela, virando a sua atenção de seguida para o taxista. – Quer ficar legal e não ter de andar mais a esconder-se?

Proferira as palavras mágicas, capturando de imediato a atenção do homem.

– O meu advogado já tem uma vasta experiência nesses assuntos e pode conduzi-lo a si e à sua família pelos trâmites para a legalização. Como é óbvio não lhes cobrará nada!

Após o barman assegurar ao taxista que ele podia confiar no que ela dizia e que estas não eram meras promessas vazias, o homem demonstrou-se mais recetivo a colaborar. 

Finalmente, saíram os três em direção à delegacia. 

A partir daquele momento, a mulher loura que tinha sequestrado a filha dela, seria expulsa do reino das ilusões para se converter na vilã de carne e osso, do pesadelo em que a vida dela se tinha convertido.

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Mais um capítulo completo!

Com o aparecimento do taxista da referida noite, o que acham que vai acontecer? 

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A Filha Roubada - Completo - ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora