12§ Incidentes

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O Wattpad por vezes tem comportamentos estranhos. Assim, antes de continuar, certifique-se sempre de que leu o capítulo anterior.

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Enquanto o pai aguardava pelo regresso da esposa, decide contratar os serviços de um inspetor muito peculiar... Paralelamente foi relatado como os pais da criança se conheceram...

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- MÃE -

Sabia que o marido esperava um abraço ou que ela se jogasse nos braços dele em lágrimas. 

No entanto, quando entrou ali na sala e o viu com os olhos fixos no final das escadas, sentiu o seu estômago revolver-se por dentro.


Fora ali, naquele sítio preciso, que temera pela vida da sua filha, que se tinha prostrado perante o corpo inanimado da criança, após um dos incidentes mais dramáticos que tinham ocorrido.

"Incidentes" era a palavra que escolhera para se referir mentalmente a esses episódios em que a menina terminava magoada fisicamente com maior ou menor gravidade.

Por norma, depois de um dia de grande animação, de um piquenique no campo, um passeio à beira-mar, ou até mesmo uma visita inesperada; o desenlace era quase sempre trágico! 

Terminavam a noite à volta da filha, a porem-lhe gelo, a aplicarem compressas e a fazerem todos os esforços para que ela recuperasse rapidamente. 

 Rezavam para que, no dia seguinte, não fosse visível o produto de quão maus pais eram.

No entanto, embora tivesse noção de que não estava isenta de culpas e de que todo o sofrimento da criança devia ser imputado a ambos os pais, não conseguia dissociar a presença do marido dos incidentes com a menina. 

No seu âmago recriminava-o por muitas das ocorrências, até podia estar a ser injusta com ele, mas era inegável a correlação entre ambos os acontecimentos. 

Não era a única causa, mas era uma das causas.

Talvez não devessem ter sido pais, não pareciam talhados para tal. 

De que servia confessarem amor incondicional pela menina, quando os atos de maior afeto e carinho só eram demonstrados após os malogrados incidentes com a criança?

Honestamente não tinha a certeza de como a filha ainda estava viva. 

Seria um capricho do destino, ou quiçá uma criança muito resistente? A resposta a essas questões agora não era relevante. 

A verdade era que ambos tinham tido várias oportunidades para se redimirem e tornarem-se os pais que a menina necessitava, mas tinham deixado se absorver pelas demandas financeiras. 

A prestação da casa, a mensalidade da escola, as contas da água, luz e telefone, ou até mesmo o pacote da televisão por cabo, todas essas despesas tinham se tornado mais prioritárias para os pais do que a criança. 

Se dessem a devida atenção à menina podiam ter evitado em muitas ocasiões o pior.

A culpa perseguia-a todos os dias e, após cada incidente, era como se fosse açoitada por esse remorso. 

Por isso era incapaz de perdoar o marido pela sua ausência, mas também pelo efeito prejudicial da sua presença pontual. E os ciúmes dele? Era melhor nem pensar nesse tema ridículo.

***

Os agentes já estavam espalhados pela sala, cozinha e escadas. Uns recolhiam amostras, aqui e acolá, do que consideravam ser importante. 

Outros iam pulverizando alguns sítios com um spray, talvez em busca de impressões digitais. 

E haviam ainda alguns agentes que reviravam cuidadosamente toda a papelada, procurando alguma pista escondida.

– Por acaso mudaram alguma coisa de sítio, desde que deram pela falta da menina? – perguntou o agente encarregue.

– Peço desculpa senhor inspetor, mas no desespero, remexi tudo em busca de algo que me pudesse dar alguma indicação do que se tinha passado com a menina. – confessou, convicta de que tinha feito o que qualquer mãe angustiada faria no seu lugar. – Acha que isso pode prejudicar a investigação?

– Penso que temos de moderar muito as nossas expetativas quanto ao que vamos conseguir obter daqui, tendo em conta esse facto. – contestou o inspetor dececionado.

– Não acha que seria mais útil toda esta gente estar na rua à procura da minha filha? – interveio abespinhadamente o marido. – A menina não está aqui! E a cada momento que desperdiçamos neste apartamento, numa busca sem nexo, ela pode estar mais distante!

– O senhor modere o seu ânimo! – respondeu secamente o inspetor. – Estou a fazer o meu trabalho, não preciso das suas instruções!

O telemóvel do inspetor tocou de seguida e este afastou-se um pouco para o atender. Ela podia sentir que o marido estava inquieto e a queria abordar.

– Achas que estes polícias todos aqui em casa é uma boa ideia? – segredou-lhe ao ouvido.

Tinha que concordar que nem ela estava segura dos benefícios que esta operação "doméstica" podia trazer à resolução do desaparecimento da filha. 

Quanto muito poderia trazer à luz factos que não eram relevantes e que podiam turvar a investigação.

- Não existe qualquer gravação das câmaras de vigilância da estação. – comunicou-lhes o inspetor, que terminara entretanto a chamada telefónica. – Acabam de me informar que todas estão vandalizadas há meses e que estão à espera da sua substituição. Parece que é um padrão comum às estações localizadas nestas zonas periféricas.

Percebia o que isto significava. Sem gravações ficava mais difícil de identificar a sequestradora. Tudo ficava mais sombrio a cada nova informação que obtinham. 

Subitamente foi sobressaltada pelo som da campainha de casa. Sem pensar uma segunda vez, apressou-se a abri-la na esperança de que milagrosamente fosse a sua filha.

– O que faz aqui?

Foi a única questão que conseguiu esboçar perante a visita inesperada e, como sempre, inconveniente da assistente social. 

Desta vez, a mulher não lhe dera hipótese de ser barrada e entrara de rompante no seu apartamento, dirigindo-se de imediato ao inspetor para o cumprimentar. 

Pelos vistos conheciam-se sobejamente e isso significava claramente que estava metida numa alhada. 

Sentiu no seu íntimo que o seu dia acabara de ficar ainda mais acometido pelas trevas e que nada de bom poderia advir daquela investigação.


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Esses pais... O que acham deles?

Comentem, reclamem ou dêem estrelas. :)

Aquele abraço.

A Filha Roubada - Completo - ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora