34§ A primeira-dama desceu à favela

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O Wattpad por vezes tem comportamentos estranhos. Assim, antes de continuar, certifique-se sempre de que leu o capítulo anterior.

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A mãe viu-se envolvida numa confusão no bar, que acabou por a levar a descobrir mais um segredo do marido...

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- MÃE -

Entrou em casa ainda meio ofegante e indisposta. À sua espera estava um comité de boas vindas que, se estivesse no seu poder, tê-lo-ia dispensado no momento. 

A sua mãe conversava de pé com um homem. Talvez os sofás modestos da sala não estivessem ao nível dela. 

Já a sua irmã, que também viera, entretinha-se a arrumar aquilo que a polícia espalhara sem comedimentos.

– Volto já! – disse ela sem dar hipótese a que a sua mãe abrisse a boca.

Refugiou-se na casa de banho, onde pode apreciar a calamidade em que estava o seu rosto.

Lavou-o com água fria, na tentativa de afastar os demónios da vodka, que permaneciam no seu organismo. 

Escovou os dentes para se livrar do mau hálito que deveria ter, depois de ter vomitado minutos atrás. 

Sentia-se tão constrangida com a figura que fizera em frente ao homem do bar. Apesar de tudo, ele demonstrara um cavalheirismo irrepreensível em todas as circunstâncias. 

Mesmo quando ela o sujara inadvertidamente, após mais uma revolta do seu estômago, ele tinha agido com toda a naturalidade. 

Despira prontamente a t-shirt, pegando outra na carrinha e alcançando-lhe um pano para que ela se limpasse também. 

Mesmo no meio daquela situação constrangedora, ela não pudera evitar de apreciar o corpo bem torneado do ex-colega do marido. 

Os seus olhos tinham ficado momentaneamente absortos na tatuagem que lhe cobria a parte superior do braço direito, dando-lhe um ar de alguma rebeldia.

– Amanhã passo aqui pelas nove horas, para irmos buscar o seu carro. – disse-lhe ele, depois dela ter garantido que ficava bem. – Espero-a aqui fora, no parque de estacionamento.

Ela caminhara então em direção ao prédio. Quase de súbito, viu-se apanhada na emboscada que os resistentes da comunicação social lhe tinham montado. 

Felizmente, eles não se tinham dado conta dela antes, senão nem queria imaginar o que inventariam de a ver com outro homem, àquela hora da noite. 

Esquivara-se como pudera dos repórteres meio ensonados, com aspeto de mortos-vivos, prontos a engoli-la. O motorista da mãe também viera de imediato em seu auxílio.

Agora ali estava ela, na sua casa! Supostamente aquelas quatro paredes deviam servir de refúgio a todo o inferno que atravessara nas últimas horas. 

Contudo, a sua mãe decidira invadir o seu reduto pela primeira vez, e certamente que não viera lhe prestar uma simples visita de cortesia. 

Sim, a primeira dama dera-se ao incómodo de descer pessoalmente à favela, pelo que o assunto devia ser sério.

Quando regressou à sala, recebeu de imediato o abraço sentido da irmã.

– Como te estás a aguentar, maninha? – questionou-a, com genuína preocupação, afagando-lhe o rosto. – Que tragédia!

Aquele gesto afetuoso, derrubou-a por dentro, levando-a a um choro convulsivo. Precisava tanto daquele abraço amigo. Estava desesperada por um ombro que a apoiasse, sem a julgar. 

O carinho da irmã mexera consigo, não conseguira evitar o chamamento mais alto do sangue.

– Chora, minha querida. – incentivou a irmã. – Liberta esse peso todo cá para fora!

Abstraiu-se do mundo à sua volta, por longos segundos, envolvida naquele abraço. Não era capaz de dizer uma palavra, apenas chorava, um choro incessante. 

Após estar um pouco mais calma, pode notar, por cima do ombro da irmã, a sua mãe a aguardar em silêncio que terminassem aquela demonstração de afeto. 

A mãe aproximou-se de seguida e abraçou-a secamente, quase de uma forma mecânica. Não era necessária qualquer explicação: o passado não estava perdoado e muito menos esquecido.

– O teu pai, eu e a tua irmã estamos todos preocupados com esta situação. Como não atendeste nenhuma das nossas chamadas, vim até aqui!

Claro que a mãe não a podia poupar de uma acusação. Afinal sempre fora assim, ela parecia vibrar quando tinha algo que apontar à filha.

– Desculpa a intrusão, mas a tua irmã tinha a chave de casa e insistiu que entrássemos. – continuou a explicar-lhe, como se de familiares distantes se tratassem. – Este é o advogado de maior confiança da família e ele vai te ajudar em tudo o que precises!

Esta era a sua mãe a ser igual a si mesma. O mundo podia estar em frangalhos, mas ela tinha sempre tudo sob controle. 

Para ela, o universo era algo finito, perfeitamente delimitado por um conjunto de regras bem definido na sua cabeça. Para cada problema havia sempre uma receita, pronta a ser aplicada, para o solucionar. 

As emoções e os sentimentos deviam ser mantidos ao nível indispensável, uma vez que turvavam as decisões mais importantes da vida. Por isso, não admirava que ambas tivessem tomado posições irreconciliáveis. 

Ela chegara a questionar-se sobre quem realmente tomava o leme da sua família: o pai ou a sua mãe? 

Se, por um lado, o seu pai sempre fora um perito em fazer os negócios florescerem, a sua mãe dominava a arte de influenciar opiniões. 

Ela era maestra em guiar as pessoas a tomarem decisões que serviam o seu interesse, fazendo-as acreditar que tinham escolhido aquele caminho por sua própria iniciativa.

– Não preciso da ajuda de nenhum advogado! – respondeu-lhe sem contemplações. – Não cometi nenhum crime!

A mãe suspirou exasperada, tal como acontecia sempre que alguém a contrariava. 

Esse sempre fora o grande problema entre as duas, ela ousava desafiar a autoridade da mãe, mulher digníssima da alta sociedade, a quem toda a gente deveria prestar algum tipo de vassalagem.

– Doutor, podia nos deixar uns momentos a sós, por favor? – pediu a mãe, com toda cortesia ao advogado.

– Claro! Vou ver se encontro algum restaurante ainda aberto, que sirva para fora. Penso que algo de comer vai ser bom para todos.

– Faça isso! – incitou a mãe ao homem. – Muito obrigado!

Agora que tinham ficado em família, estava segura de que a mãe mostraria as suas verdadeiras cores, sem quaisquer filtros. 

Também a sua irmã se apressou a subir para o primeiro andar, fugindo, como sempre, a qualquer confronto com a matriarca.

– Podes-me explicar onde está o teu marido? – perguntou a mulher, deferindo o primeiro ataque sem mais demora.

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E assim, leitura a leitura, chegámos às 1.000 leituras! Um muito obrigado a todos que me têm acompanhado nesta jornada! Em sinal de comemoração, este capítulo teve também 1.000 palavras, para marcar o simbolismo da ocasião. :-)

O que acharam deste relacionamento entre mães de gerações diferentes?

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Aquele abraço!

A Filha Roubada - Completo - ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora