"Meu pai também deve ter uma dessas!" Este pensamento a fez sorrir. Embora sentisse raiva por nunca tê-lo visto, tinha a sensação de conhecê-lo pelo menos um pouco. Então, a melancolia tomou conta do seu rosto crivado de sardas. Morga queria, a qualquer custo, saber a verdade sobre o seu nascimento.
Ela voltou a descer os degraus, cabisbaixa, mas um instinto a fez virar. Sentiu-se estranhamente atraída pela parede à sua frente. Nela, havia uma porta triangular de madeira escura que Morga jamais atravessara. Ela ignorava o que havia naquele pequeno aposento, e Eremia sempre se esquivara de explicar exatamente, dizendo tratar-se apenas de um depósito sem importância. A garotinha fitou a fechadura: era redonda, com um pequeno orifício no meio.
Semicerrou os olhos, e um vazio abissal aprisionou sua mente; a visão daquela porta foi como um feitiço. Perturbou-se com essa sensação, pois em 12 anos jamais sentira o desejo de entrar ali. Ela respirou fundo e, sacudindo a cabeça, pensou que estava transtornada pela demora em rever sua mãe.
"Que bobagem! Não deve haver nada de interessante naquele depósito", pensou, mordiscando os lábios.
Voltou a descer os degraus aos saltos e, ao chegar ao térreo, saiu ao pátio deixando para trás o mistério daquela porta triangular.
O ar úmido estava mudando, a temperatura cairia abaixo de zero até a noite, e o chafariz congelaria. O rumorejar da água que ainda esguichava acalmou seu coração, cuja batida mais parecia o rufar de um tambor. Séria em seu macacão térmico que a protegia tanto do frio quanto do calor, ela sentou-se numa das magníficas esculturas de prata assentadas sobre a grama. Fechou os olhos e esperou que o vento voltasse a falar-lhe.
Um grito desafinado a fez estremecer. Era Wapi, que a procurava, e ela respondeu com o sinal convencional, assoviando três vezes.
O Piróssio estendeu as pernas e correu de forma engraçada em direção ao pátio, deixando os outros avestruzes curtindo os últimos raios da estação Medra.
— Wapi, meu gingão querido! Venha cá, estou agitada demais, esta manhã — murmurou, abraçando-o.
Fim da Terceira Parte.
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Morga - A Maga do Vento
FantasyAno 500. Planeta Emiós. Morga tem 12 anos, cabelos curtos - negros como piche -, o rosto salteado com sardas roxas sobre a pele branca e olhos azuis. Ela vive em uma casa escondida na floresta com Eremia - a Bramante Branca dos poderosos achar, gove...