— O amor é forte como o vento. Agora, você também vai ser forte. — Morga não se envergonhou dessas palavras. O sentimento que nutriam um pelo outro era evidente, e nenhuma regra, nem mesmo a Imperalei dos Fhar, poderia apagar a emoção ditada pelo instinto e pelo destino.
— Amor? Mas nós não podemos sentir amor... — acrescentou Horp, desconcertado por aquela cena tão insólita.
— Claro que vocês podem. Embora os Fhar tenham modificado seu DNA injetando o gene mágico Désio-Z206, a natureza humana pode voltar a triunfar. Este é o grande desafio que me leva a Áurea Nyos. O vírus da profecia aniquilará os Fhar. O amor destruirá a escuridão estéril, e os sentimentos voltarão a orientar os corações do povo de Emiós.
— Apaixonar-nos? — Drima ficou mais confusa do que nunca. Ela chorara pela primeira vez e, agora, encontrava-se diante de um fato consumado: dois garotos haviam se beijado dentro de uma galeria fedorenta, depois de ter derrotado vermes gigantes.
Nas vísceras de Emiós cumprira-se a magia maior, uma magia que nem a Bramante Branca seria capaz de produzir: quatro garotinhos haviam compreendido o maior sentido da vida.
— Sem amor não se pode sentir certas coisas — murmurou a jovem Ancilante, confusa.
— Sim, agora entendo, mas tenho medo do que estou pensando. — Horp não se sentia à vontade e, olhando ao redor, só via rochas, gosma e restos dos vermes.
Yhari afastou os cabelos louros de sua fronte e puxou Morga de lado, sussurrando:
— Eu tenho vontade de correr, de gritar, de sair e me deixar envolver pela tempestade de neve. Sinto-me diferente de antes. Havia um vazio dentro de mim que nunca era preenchido e eu não entendia o que era.— Era a pior solidão possível, a da falta de carinho. Eu também sei bem o que é isso, e durante muito tempo compartilhei isso com a minha árvore nodosa. Yhari, você realmente acha que me quer bem? — perguntou a Maga do Vento, baixando o olhar.
— Sim, tenho certeza disso. É muito lindo querer bem a você, embora eu tenha medo de sofrer. E também sinto alguma coisa estranha fisicamente, como se o meu estômago estivesse tremendo. Não estou acostumado a isto. — O Daki estava sem jeito e não sabia como expressar sua condição.
— Experimento as mesmas sensações e também acho que lhe quero bem. Desejo pensar que isto seja mesmo amor. Um amor como o de meu pai e minha mãe. Ou será que estou enganada? Diga-me... estou enganada?
— Vamos descobrir isso juntos. A vida vai ser diferente, e foi você quem me disse isso. — Yhari recolheu a bolsa de Morga e jogou-a sobre o ombro, pronto para prosseguir a viagem pelos subterrâneos.
— Sinto muito pela perda dos seus Piróssios — lamentou a garotinha, dirigindo-se a Horp e Drima. — Para compreender as coisas importantes da vida, não raro é preciso saber suportar a dor e a derrota. Ver morrer dois animais aos quais vocês eram muito apegados é uma provação duríssima; eu entendo isso. Talvez ainda leve algum tempo, mas se vocês estão aqui comigo quer dizer que o seu destino é lutar para conquistar o amor proibido. Não sei o que vai acontecer, não sei se a minha Magia do Vento e a alquimia dos Ambalis vão derrotar a falsidade dos Fhar. Mas a profecia está virando realidade, e eu peço que vocês acreditem nela.
Horp pegou Drima pela mão e, juntos, passaram por cima dos restos pútridos dos vermes. Wapi baixou o pescoço e deslizou o bico sobre os cabelos de Morga, cheirando-a. Cilla saltitou orgulhosamente atrás de Yhari, que a afagou:
— Talvez devêssemos recolocar as rédeas nestes dois. Não gostaria que eles encontrassem outros vermes.— Rédeas? Mas nós as deixamos amarradas na árvore, do lado de fora do poço! — exclamou Horp.
Ele tinha razão. E tê-las deixado penduradas dentro da boca do poço fora uma decisão arriscada.
Na Colônia Briosa, com efeito, já se espalhara o boato do desaparecimento de quatro Dakis, juntamente com os seus Piróssios. Logo começariam as buscas; aquelas rédeas seriam um indício inequívoco.
Quase de madrugada, Lefório foi acordado pelo tilintar de seu Obolho. Era uma mensagem de Okrad.
Fim da Quinta Parte.
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Morga - A Maga do Vento
FantasyAno 500. Planeta Emiós. Morga tem 12 anos, cabelos curtos - negros como piche -, o rosto salteado com sardas roxas sobre a pele branca e olhos azuis. Ela vive em uma casa escondida na floresta com Eremia - a Bramante Branca dos poderosos achar, gove...