Nas casas da Colônia Briosa reinava também muita agitação. Ancilantes, Gestais e U'ndários deviam supervisionar os trezentos Dakis parados e que se aborreciam. Ninguém fora até Karash, porque o desaparecimento repentino de quatro garotinhos era um acontecimento extraordinário. Fugir da Colônia Briosa no meio da estação Invéria significava morte certa.
Sasima queria falar com Lumira. A garotinha havia dedurado os colegas, e por isto recebera elogios e fora parabenizada até por Lefório.
Com a desculpa de lhe levar alimentos quentes e alguns doces, bateu à porta da Casa 207.
Quando entrou, viu a Daki ocupada, limpando sua Komba.
— Trouxe algo para comer — disse Sasima, indicando uma bolsa repleta de guloseimas que trouxera consigo.
Lumira sorriu e, passando as mãos sujas pela franjinha sebenta, abordou a Gestal com evidente satisfação:
— Obrigada, você também quer me cumprimentar? Devo dizer que esses quatro garotinhos são um tanto turbulentos. Quem sabe que fim levaram!Sasima tirou a pesada capa branca e, ajeitando o suntuoso vestido verde, franziu a testa.
— Você acha que eles estão mortos?
— Bem... há fortes possibilidades! Ou eles congelaram, ou acabaram como pasto para alguma fera das montanhas rochosas. Talvez tenham sido devorados por um grande Cramos! Eu realmente não entendo por que eles fugiram à noite. — Lumira pegou dois salgadinhos apetitosos e colocou ambos na boca de uma só vez.
— Pois é... você não sabe nada a respeito... não é? — insistiu Sasima.
— Eu acho que foi Morga quem os convenceu. Aquela é mal-educada. Infelizmente, Drima fez amizade com ela e foi embora sem sequer se despedir de mim. — A garotinha respondia com jactância, querendo se mostrar.
— E por que você acha que foi Morga que teve a ideia de fugir? — Sasima ficara nervosa, mas procurava não demonstrá-lo.
— Não sei. Mas vi que, em Karash, na lojinha de antiguidades e joias raras, ela quis de qualquer maneira comprar um livro que trata de lendas. E ela o permutou por um brilhante! E ela possuía outras pedras preciosas também. Isto é estranho, não? — Lumira deglutiu outro salgadinho.
— Interessante! E você disse estas coisas para as outras Gestais também? — A amiga de Animea temia que a boba Daki tivesse difundido demasiadas informações.
A essa altura, Lumira ficou desconfiada.
— Por que você está me fazendo todas essas perguntas?
Sasima voltou a vestir a capa e, virando-se para o portão, disse:
— Curiosidade. Simples curiosidade.Assim que saiu da Casa 207, ela foi atingida pela tormenta de neve. Caminhou sob os pórticos, tentando ficar próxima da parede para não cair. Seu único pensamento era voltar a falar com Gardênio. Era mister preservar o segredo acerca da verdadeira identidade de Morga. Sasima também teve a ideia de descobrir quem gerenciava a lojinha de Karash para saber que livro fora comprado pela Maga do Vento, mas não teve coragem de conversar com as outras mulheres. Todas estavam muito atarefadas na cozinha, lavando e passando as roupas dos Dakis. A única pergunta que logrou fazer foi se as gestoras das lojas haviam permanecido em Karash. E a resposta distraída que algumas Ancilantes forneceram foi afirmativa. Sasima passou os dedos sobre as margaridas de cristal que enfeitavam os seus cabelos e sentou-se num pequeno sofá de canto, na grande cozinha da Colônia. Olhava ao seu redor e só via confusão: a ausência de Telkia e a partida repentina de Lefório haviam posto um fim a qualquer rigor. E a fuga dos quatro garotinhos somara-se ao problema das Mecânias.
Sasima queria pegar sua Vádria e voar ao Mosteiro de Hamalios para se trancar em seu quarto, na escuridão, para não pensar no futuro. Mas, certamente, não poderia abandonar Gardênio e trair a amizade de Animea. Enquanto permanecia absorta em seus pensamentos, duas Ancilantes vociferaram, avisando a todas que era preciso levar mercadorias para Áurea Nyos o quanto antes. Mas, com a tormenta que fazia, seria difícil convencer os Dromantes a caminhar. Naquele momento, Gardênio entrou acompanhado de três U'ndários.
Fim da Décima Terceira Parte.
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Morga - A Maga do Vento
FantasyAno 500. Planeta Emiós. Morga tem 12 anos, cabelos curtos - negros como piche -, o rosto salteado com sardas roxas sobre a pele branca e olhos azuis. Ela vive em uma casa escondida na floresta com Eremia - a Bramante Branca dos poderosos achar, gove...