5. O Engano e a Verdade - Décima Quarta Parte.

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A jovem maga estava em dificuldades, não sabia realmente o que se fazia nas Poças de Esmerilha. Yhari a tranquilizou:
— Você precisa usar as luvas verdes e enfiar nas Poças os tubos flexíveis ligados às Mecânias Fluantes.

— Mecânias Fluantes? — repetiu Morga.

— São umas máquinas robóticas instaladas sobre o solo. Têm cerca de 4 metros de altura, uma cabeça ovoide com uma grande boca, dentro da qual são enfiados os tubos flexíveis. Rodeando a cabeça, elas sugam o líquido regelante e o processam, tornando-o fervente e límpido. Depois, o líquido passa pelas Conduturas Cobríficas, abastecendo todas as cidades de Emiós. É assim que conseguimos manter nossas casas aquecidas. Quando a estação muda e está fazendo calor demais, o líquido regelante permanece frio e, assim, as moradias ficam frescas. Entendeu?

— Não é difícil — afirmou Morga.

— Você só tem de tomar cuidado com os espirros das poças; o líquido regelante é ácido e pode corroer o macacão térmico e provocar feridas na pele. Alguns Dakis foram atingidos no rosto, mas os Fhar criaram pomadas que curam — acrescentou Drima.

— Eu conheço a pomada, é a Kernite Dênsia. Preparei um pouco justamente hoje de manhã para cuidar dos ferimentos de Wapi. — Morga sorriu vendo os demais permanecerem boquiabertos.

Gardênio levou a mão ao bolso direito do sobretudo, de onde tirou um par de luvas verdes que entregou a Morga.

— Eu tinha esquecido de deixá-las com você. Vista-as somente quando estiver nas Poças.

Horp coçou os cabelos hirsutos como uma esponja ressequida e propôs:
— Ainda faltam várias horas antes de irmos trabalhar; proponho darmos uma volta em Karash.

Drima fez um sinal para que todos se aproximassem: tinha uma coisa importante para dizer e não queria que outros ouvissem.

— Sim, vamos a Karash. Eu conheço uma lojinha que vende livros e quinquilharias. Uma vez, eu vi lá um velho volume que falava sobre lendas. Talvez tenham algo sobre a profecia. Não vai ser difícil pegá-lo; como vocês sabem, os gestores das lojas mudam a cada turno. Se tivermos sorte, talvez encontremos uma Ancilante como eu, não poderá criar dificuldades.

Sasima meneou a cabeça.

— Não, não, parece-me perigoso. Não gostaria que começassem a desconfiar de vocês... e de Morga. Pedir um livro sobre lendas logo neste momento poderia gerar problemas.

Morga deu de ombros.

— Mas ninguém sabe a verdade sobre Telkia e a profecia.

Naquele exato momento, Horp cutucou Drima.

— Olhe quem está chegando.

Era Lumira, com o jeito antipático de sempre. A sua pele estava mais para amarelada do que morena, seus cabelos eram castanhos e ondulados e sua franjinha sebosa cobria-lhe quase totalmente os olhos, pequenos como contas. O único enfeite de Lumira era um broche de bronze em forma de espiral que ela usava espetado sobre o macacão térmico.

A garotinha aproximou-se e, nesse momento, Gardênio e Sasima se afastaram sem dizer nada para não criar suspeitas.

— O que vão fazer? Vão a Karash? — indagou, tocando o seu broche.

— Não sabemos. E você, vai? — perguntou Drima, esperando que ela não insistisse.

Lumira olhou para Morga.

— Eu nunca vi você. Com quem está dividindo a casa?

A jovem maga pigarreou e, mentindo, disse:
— Com uma Daki simpática... mas... que lindo esse seu broche! Tem um formato original — comentou, tentando desviar o assunto.

— Não me faça elogios inúteis. De qualquer maneira, eu não vou trocá-lo pelo pingente horrível do seu colar. Este broche é de estimação. É uma joia que pertenceu a uma belíssima Gestal. Tenho-o desde pequena; é do Mosteiro de Hamalios — Lumira respondeu causticamente, como era o seu jeito.

Yhari passou a mão pelos cabelos louros e, com ironia, virou-se para Horp:
— Broches, colares, são frivolidades de garotas, tudo besteira. Este sim é um objeto realmente precioso e único — esnobou, mostrando um dente preto de Cramos, o animal mais perigoso da Cosmogonia Rochosa.

— Puxa vida! O que será que você deu em troca disso? Não há muitos desses. — Lumira morria de inveja.

— Com efeito, tive de dar por ele dois pares de botas anfíbias e uma pulseira de ouro — retrucou o garoto, exultante.

— Cramos? — repetiu Morga, sem se dar conta.

— Você não sabe o que é um Cramos? Mas onde é que você vive? — Lumira soltou essa pergunta, lançando a Imperfeita em apuros.

— Morga sabe muito bem o que é um Cramos, não se faça de espertinha — interveio Horp bem a tempo.

Lumira afastou a franja dos olhos.

— Morga. Eu nunca ouvi falar em você. — Depois, fez uma careta olhando a jovem maga com desdém, e foi embora.

Lumira não suspeitara de nada. Os quatro amigos respiraram aliviados e decidiram ir para Karash.

Drima, Horp e Yhari voltaram para suas casas para pegar suas Kombas, prometendo para Morga que passariam na casa dela.

A garotinha encaminhou-se para casa; caminhando contra o vento, pensando em como fazer funcionar o ovo voador.

Assim que ela chegou no hall de entrada, ouviu um grito de Wapi, subiu a escada correndo e viu o seu amado Piróssio com a cabeça dentro do armário.

— O que está fazendo? — berrou, perdendo a paciência.

O avestruz virou o pescoço e, pousando os olhos na garotinha, pestanejou e sacudiu as plumas.

— Você está seguramente bem, tendo em vista que está aprontando! O que foi que encontrou dentro do armário? — Morga escancarou as velhas portas e, olhando para baixo, viu que Wapi tinha bicado tanto a madeira do fundo que uma parte estava levantada.

O Piróssio a empurrou para o lado e voltou a meter o bico dentro do buraco, tirando dele uma bota empoeirada.

Morga tomou-a dele.

— É muito velha! Quem sabe de quem foi?

Enfiou a mão no interior e descobriu alguma coisa.

— Uma carta... de... ANIMEA! — exclamou, confusa.

Fim da Décima Quarta Parte.

Morga - A Maga do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora