6. O Mapa e as Poças de Esmerilha - Décima Parte.

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Horp acenou a cabeça positivamente, Drima esfregou os olhos e Yhari pegou as mãos de Morga, sussurrando:
— Você sempre faz discursos importantes. É difícil imaginar poder conhecer nossa própria mãe. Eu nunca senti necessidade de saber quem ela era. É verdade que a Imperalei proíbe essas coisas, mas deve ser legal olhar nos olhos de quem nos deu a vida.

Drima comoveu-se e Horp tossiu nervosamente; eles também pensaram em encontrar suas próprias mães um dia.

Morga suspirou; os seus amigos precisavam saber e passar por muita coisa ainda. Ela apontou para o livro e o mapa, e trouxe o assunto que lhe era tão caro ao centro de suas atenções.

As imagens e descrições da Terra encantaram os Dakis, que nunca haviam visto florestas tão ricas de flores e árvores. Havia mares azuis e peixes coloridos, montanhas iluminadas por um único sol resplandecente. No entanto, o livro não continha nenhuma imagem dos seres humanos. A natureza era a única protagonista daquelas páginas.

— Este é o planeta das nossas origens — ensinava a Maga do Vento, acariciando as palavras chamuscadas e as fotos desbotadas.

— Ninguém nunca nos falou sobre a Terra. — Drima olhava para Horp, que parecia hipnotizado.

— Como é que a gente faz para saber que não se trata de uma lenda e que este livro não é um produto da fantasia? — perguntou Yhari.

— Vocês devem acreditar. A exemplo da Profecia, da qual eu estou lhes dando provas de que é verdadeira, também a história da Terra é real. — Morga puxou a ponta de prata do Gual e o Obolho apareceu. Pegou os documentos secretos e, hesitantemente, deixou que os amigos os lessem.

Yhari ficou particularmente chocado com o Pacto dos Fhar, pois não se conformava com a morte preestabelecida aos 50 anos de idade.

— Mas como é possível? É verdade que os Fhar nos fazem morrer quando ultrapassamos essa idade?

Drima e Horp aproximaram-se um contra o outro e, olhando para Morga, perguntaram se ela já estivera na ilha Límbica, no oceano Orhanto.

— Não, eu só a via de longe quando ficava no topo da Quercus Alba. É aterrador pensar que, durante todos esses séculos, os Fhar tenham usado os U'ndários, as Gestais e Ancilantes unicamente para sua própria sobrevivência. A procura pela imortalidade é feita à custa de todos os demais. Eles são monstros, não Mestres da Vida. — Morga apertou os punhos e sentiu o sangue correr violentamente em suas veio. O instinto, o intuito e o seu DNA humano diziam-lhe que era preciso agir o quanto antes para derrotar os Fhar e recuperar a liberdade de viver segundo a natureza.

— Tenho medo — admitiu Drima baixinho.

— Se ficarmos unidos, derrotaremos o medo. Eu vou usar as minhas artes mágicas e o vento não me trairá. — Morga abraçou a jovem Ancilante, e Drima compreendeu que a amizade era mesmo um sentimento poderoso.

Tão poderoso quanto o ódio aos Fhar.

Morga levantou-se do chão, abriu o armário e pegou a Alchemios Brevis e o Plantarium.

— Olhem, estas páginas reúnem toda a magia a ser usada. São coisas secretas que Eremia me ensinou.

Os três Dakis ficaram estupefatos com os Ambalis, os símbolos sagrados dos Fhar e as fórmulas alquímicas.

Morga, muito ereta e ainda de pé, alisava o Obolho.

— Eu confio em vocês. Não me traiam. Caso o façam, saibam que serão cúmplices dos Fhar e da morte absurda do povo de Emiós.

Um assovio rouco irrompeu no silêncio impregnado de ansiedade. Chegara uma mensagem de Eremia.

Morga abriu a quarta portinhola, extraiu o Ciodalo e leu as palavras fluorescentes:

Morga, sei que você mora na Casa 299, que foi de Animea. O destino está apontando a via correta para você.
Confie sempre em sua intuição e escute o vento.
Eu cheguei a Áurea Nyos e tive de usar o Transporte Pulverizador, embora tenha aversão a ele. O que preciso comunicar a você é muito importante: o vírus atingiu diversos Fhar. Telkia é quem está em piores condições. A situação é dramática e logo vou me encontrar com seu pai. Okrad anunciou o início do Conciliábulo e amanhã estaremos todos reunidos para decidir o que fazer. Você precisa vir para cá o quanto antes. Faça isto secretamente. Você representa a esperança de mudança. Assim que chegar a Áurea Nyos, mande-me uma mensagem e eu lhe direi onde poderemos nos encontrar. Tome muito cuidado com as Sentinelas, elas estão prontas para tomar medidas contra qualquer pessoa que entre nas torres dos Fhar.

[Símbolo Desconhecido] Eremia.

Drima, Horp e Yhari saltaram de pé. Morga guardou o Ciodalo no Obolho, empurrou a ponta do Gual para dentro e o pequeno dirigível desapareceu no meio do vapor.

Yhari pegou Morga pelos ombros e sacudiu-a.

— Você irá à cidade dos Fhar?!

— Sim. Devo fazê-lo. A profecia está seguindo o seu curso: Telkia vai morrer logo e, junto com ela, outros Fhar vão perder a vida. Eremia precisa de mim, e eu devo conversar com meu pai. — A Maga do Vento desprendeu-se das mãos de Yhari, que a apertavam demais. Afastou o cabelo do rosto e aproximou-se de Wapi.

— Você está louca! As Sentinelas vão matá-la. E, depois, o que vai fazer em Áurea Nyos? Os Fhar são poderosos demais. — Horp estava angustiado.

— Irei com Wapi, chegarei até a cascata do rio Hamandor e seguirei cortando pela floresta. As feras da Cosmogonia Rochosa não me assustarão. — O olhar de Morga tornara-se altivo.

Drima dobrou o mapa das Conduturas Cobríficas.

— Acho que seria melhor seguir os dutos subterrâneos, assim você evitaria muitos perigos. — A jovem Ancilante baixou a cabeça e aguardou timidamente a resposta de Morga.

— Você tem razão, Drima. Ninguém poderá me ver se eu atravessar pelos subterrâneos de Emiós.

Yhari olhou pela janela; a luz plúmbea que provinha do céu nublado estava enfraquecendo. A noite chegava e, com ela, a escuridão.

Fim da Décima Parte.

Morga - A Maga do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora