9. O Conciliábulo dos Fhar - Décima Terceira Parte.

0 0 0
                                    

— Uma verdadeira charada! — exclamou a jovem maga, alisando o Gual, que lhe pendia do pescoço.

De repente, seus olhos azuis iluminaram-se refletindo a luz avermelhada do Glibine.

— A Primeira já vazia... Segunda e Terceira cheias... acho que entendi! — disse, sorrindo. Apertou o Gual, que continha a chave da Lei Cósmica, e a imagem da Prima Chartum Psicha veio-lhe à mente. — Com efeito, ela encontrava-se no livro verde, entre os brancos de gesso. Portanto, a Segunda e a Terceira, que contêm as chaves e as pedras que faltam, estão em outra parte. E são as Sentinelas que as escondem! Descobrir onde estão será um verdadeiro desafio! Okrad mandou que elas fossem mudadas a cada cinquenta anos, justamente para ter certeza de que ninguém as achará.

A Imperfeita ficou séria e, olhando ao redor, compreendeu que o Grão-Medônio ocultava demasiados mistérios em seu laboratório. Assim, o Kimiyerante não era um simples porão, porém o local em que a loucura diabólica de Okrad se unia à Magia Alquímica dos Fhar.

A garotinha teve a tentação de pegar a folha circundada de ouro, mas pensou melhor. Roubá-la seria demasiadamente perigoso: Okrad não devia saber que alguém estava procurando as outras duas lâminas de prata com as chaves e as pedras que permitiam a decolagem da astronave Heimfra. Pegou o Ciodalo e copiou o texto da última página, enviando-o somente a Eremia, embora desejasse comunicar tudo isso ao pai. Não obstante, Serunte já estava demasiadamente exposto naquele momento, e Morga não desejava criar mais problemas para ele.

Assim que saiu do canto do nicho, a luz do Glibine revelou um móvel. Parecia um armário normalíssimo, mas assim que Morga o abriu percebeu que ele ocultava uma escada estreita e íngreme. Uma luz provinha do alto, e também ouviam-se vozes retumbantes. Olhando para cima, viu que a escada terminava debaixo de uma grade dourada que fazia as vezes de teto.

A garotinha subiu e, ao chegar ao topo, acocorou-se e esforçou-se para ver entre as barras. Ficou extremamente surpresa ao deparar com uma cena à qual jamais imaginara poder assistir: a escadinha do Kimiyerante levava diretamente à Megorá, onde o Conciliábulo estava acontecendo. A grade mimetizava-se perfeitamente com as grades dos portões do enorme afresco Ópera Eterna que enfeitava o auditorium. Nem os olhos dos Fhar mais perspicazes haviam se dado conta de que um dos portões não era pintado, e sim constituído de uma grade de verdade. A ilusão ótica era perfeita inclusive porque ela se encontrava na base do desenho que representava os pequenos portões dourados do afresco.

O Obolho permanecia ao seu lado, e as lufadas de vapor que saíam pelas grades uniam-se às dos outros Obolhos dos Fhar.

Morga arregalou os olhos vendo as poltronas enlutadas e os poderosos magos que discutiam entre si, movendo os rostos ocultos pelas Kaplás. Nenhuma expressão. Nada de sentimentos. Todos eram iguais em sua mísera convicção de poder se tornarem eternos. Suas palavras, entretanto, eram de angústia diante do terror de morrer sem poder fazer nada. As vozes saiam daqueles corpos aparentemente jovens, de cujos olhares e pensamentos a fragilidade humana havia sido banida quinhentos anos antes.

A Maga do Vento sentiu seu coração batendo tumultuadamente, pois participar às escondidas da grande assembleia de Áurea Nyos era um sinal de que ela era diferente, de que era dotada daquela "imperfeição" que logo imporia um declínio total àquele mundo privado de céu azul. Trajando suas preciosas vestimentas, os governadores de Emiós agitavam seus mantos e chapéus e continuavam a falar febrilmente, enquanto as bandejas aladas e ampolas cheias de infusões voavam de um lado a outro do auditorium. No local mais alto estava Okrad, com as mãos crispadas nos braços da poltrona. Morga reconheceu-o imediatamente, pois vira sua estátua ao entrar pela porta do alabastro.

— Maldito seja! — sussurrou entre os dentes.

O seu Obolho apitou de repente. A garotinha pegou imediatamente o Ciodalo para ler a mensagem de Eremia. A Bramante estava visitando um dos Fhar adoentados e afirmava ter recebido o enigmático texto que Morga extraíra do diário de Okrad e que seguramente se referia às duas Chartum Psiche. A xamã explicava que devia retornar ao Conciliábulo o quanto antes.

Fim da Décima Terceira Parte.

Morga - A Maga do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora