10. A Voz do Fogo - Décima Primeira Parte.

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— Você sempre foi reservada e calada. Mas, desta vez, deve falar! É grave o fato de que o seu anel tenha sido encontrado na torre do Grão-Medônio. Não me desaponte. Já tenho de suportar que você seja pouco prolífera. Já verifiquei nas listagens. Consta que você só pariu uma vez. Depois, sempre arranjou algum motivo para não se submeter ao Raio Avólio! O que você está escondendo?

Serunte virou-se para Eremia; era preciso interferir.

A Bramante levantou-se.

— Sim, Smartika, você tem razão de exigir a verdade, mas o que o fato de Animea ter gerado somente uma vez a ver com o anel?

Naquele momento, sem se dar conta das consequências do que estava prestes a dizer, a Ancilante Pliope pediu a palavra.

Okrad lha concedeu.

— Meus senhores, eu vi esse anel. Ele estava no dedo de uma Daki que esteve em minha loja.

Animea, Gardênio, Sasima, Serunte e Eremia estremeceram ao ouvir a afirmação de Pliope.

— E quem é essa Daki? — inquiriu Okrad, que estava prestes a descobrir o nome da provável Imperfeita.

A Ancilante preparava-se para responder, mas um vento, o mesmo vento que poucas horas antes varrera os cálices e as bandejas, inundou novamente a Megorá.

Okrad ordenou que todos os Fhar adotassem a técnica defensiva Hasmiótica, ou seja, acionassem barreiras individuais invisíveis que os protegiam de possíveis ataques exteriores.

— Este vento está infectado! Acionem a Hasmiótica! — gritou enquanto cruzava os braços e baixava a cabeça.

Todos os Fhar procederam da mesma maneira e os seus corpos foram envolvidos por barreiras de ar denso.

Morga acordara e, detrás das grades, havia imposto a Huma Imeia, uma das magias do Vento de Terra. Com auxílio da resina e da pinha Carya Glabra, ela se aprontara para intervir contra Okrad e todos os Fhar. Ao ouvir o interrogatório de sua mãe e a afirmação de Pliope, sua reação foi imediata. Mantendo os olhos arregalados, a boca firmemente fechada e o pensamento fixo, a garotinha invocou a força da Huma Imeia, pronunciando a palavra encantada:

EFFUNDO

As rajadas de vento foram tão violentas que os Fhar que ainda estavam sentados tiveram de se segurar nos braços das poltronas, estupefatos: as túnicas e as capas se esvoaçavam, movidas por ondas impetuosas que avançavam ameaçadoramente.

Protegidos pela barreira Hasmiótica, eles rechaçavam a poderosa magia da Imperfeita com descargas elétricas. A reação foi devastadora.

Todos os chapéus gravados com as iniciais sagradas dos Mestres de Vida foram projetados para o alto, formando uma espiral no centro do auditorium. Gritos e vitupérios elevaram-se, ribombando pela Megorá.

As Kaplás vibravam tanto sobre os rostos dos Fhar que ameaçavam cair, os penteados das magas e alquimistas foram desmanchados, os Obolhos vagavam ao sabor das correntes de ar e muitos esfacelaram-se contra o grande afresco, formando cascatas de cristais e ouro. Cálices e bandejas espatifaram-se, espalhando pelo chão cacos de vidro e bebidas. As lanternas alquímicas apagaram-se de um golpe e a escuridão caiu como um sinal de morte. Na penumbra viam-se somente corpos que se agitavam procurando a salvação.

Serunte pegou Eremia pela mão e com grande dificuldade chegaram até Animea, que tinha caído de joelhos. Okrad conseguira agarrar-se a uma poltrona da primeira fileira, e baixava a cabeça por temor de que a máscara caísse.

Sasima e Gardênio acocoraram-se ao lado do afresco mantendo-se unidos, enquanto Pliope foi arremessada para longe pelas descargas elétricas emitidas pelas barreiras de Hasmiótica; sem luz, ninguém conseguiu ver se ela se ferira.

Reful e Lumira caíram no chão sobre os cacos de vidro. Os dois garotinhos estavam aterrorizados e pediam ajuda estendendo os braços, porém nenhum Fhar os socorreu.

Na escuridão, ouvia-se o sibilo de Morga em meio à gritaria. Uma nuvem de poeira muito densa composta pelos fragmentos da pinha saiu da boca da Imperfeita, espalhando-se por toda parte, alimentada pelo vento.

Fim da Décima Primeira Parte.

Morga - A Maga do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora