Manuella°
Depois que ele passou pela porta e foi fazer o show, eu fui incapaz de ficar por qualquer minuto que seja naquele lugar.
Sai andando conforme as lágrimas desciam sem nem olhar para trás, a sensação que tinha ficado aqui dentro de mim, era que talvez as coisas não sejam mais como foi um dia, e isso tá me corroendo por saber justamente o que vem a seguir.
Conforme o uber passava pelas ruas agitadas do Rio de Janeiro minha mente me fazia lembrar constantemente da cena que meus olhos presenciaram ao chegar naquele camarim.
Por mais que eu relutasse contra as vozes que ecoavam dentro da minha cabeça, me dizendo que eu sou incapaz de fazer alguém ficar, que todo esforço foi em vão, e que em todo tempo talvez a única que tenha sido enganada nessa historia foi eu, que abdiquei de quase tudo para estar com alguém que tão pouco preservou o respeito na minha ausência.
É tudo tão intenso como uma avalanche prestes a me tomar por inteira, me impedindo de ver por dias o que estava bem a minha frente, ou talvez, eu me negasse a acreditar por tentar fazer dar certo.
Passo a mão no rosto vendo a visão turva pelas lágrimas que insistem em cair, parando no sinal percebo a música que toca no rádio, como uma punhalada de realidade do que eu tanto tentei fugir.
Penhasco, sempre foi uma das minhas músicas preferidas, hoje, sinto como se cada verso tivesse sido escrito pelos sussurros da minha alma, que de tanto ser silenciados se tornou ecoo dentro dos meus próprios sentimentos, me fazendo reviver constantemente cada palavra dita, e a sensação de ter sido deixada mais uma vez de lado.
Eu tentei, o tanto que eu tentei ...
— Chegamos, moça. — Escuto o motorista falar após encerrar a corrida, levanto a cabeça engolindo seco pegando minha bolsa pra sair do carro. — A senhora tá bem?
Levo o olhar até o retrovisor de onde ele me analisa, confesso que até demorou já que desde que entrei a única coisa que fui capaz de fazer foi chorar, perdida em mim mesma.
Sorrio fraco confirmando com a cabeça.
— Amar dói, moço. — Abro a porta saindo dando passos rápidos até a portaria.
Chegando no apartamento a primeira coisa que faço é larga tudo e ir em direção as bebidas do Filipe, é como dizem por ae, talvez o melhor remédio para encarar a realidade, seja fugir ao máximo dela.
Pego a primeira garrafa de whisky que vejo e levo até a boca sem nem me importar o quando ele ficaria incomodado em me ver bebendo direto do gargalo.
— Já que é pra sofrer, então vamos fazer do melhor jeito, Manuella. — Inspiro fundo levando o liquido até a garganta sentindo o quão forte era, o que me fez tossir algumas vezes até me acostumar com o gosto concentrado.
Nego com a cabeça colocando qualquer música pra tocar, enquanto tiro a roupa na intenção de ir pro banho.
De canto meu celular começa a vibrar em cima da bancada, vejo primeiro o nome do Dallas, em seguida da Steff e pra terminar do meu irmão. Desligo o aparelho e me sento no chão olhando diretamente pras minhas malas largadas pelo local.
Criando coragem pra ser forte, levanto de uma vez e vou pra debaixo do chuveiro onde fico por vários minutos. Me troco colocando um short jeans e uma camisa larga, deixo os cabelos secar naturalmente e decido arrumar minhas coisas, em meio as minhas blusas encontro um moletom dele perdido, o mesmo que usou na nossa segunda noite aqui nesse mesmo lugar, onde tudo ainda parecia ser tão certo.
Metade da madrugada já tinha ido embora quando a porta foi aberta, onde estava fiquei, sentada do lado da cama olhando a vista lá fora, segurando o resto do que sobrou na garrafa.
Me neguei a virar, me recusei totalmente a enfrentar seja lá o que estava por vim, dessa vez, eu decidir permanecer o mais distante possível de qualquer sofrimento que pudesse me causar, mesmo sabendo que isso não era uma opção ao meu alcance.
Escuto claramente ele soltar a mala no canto, e jogar as chaves em cima da mesa do computador.
Seu cheiro invade o lugar me fazendo fechar os olhos por saber que provavelmente ele está tão perto ao ponto de sentir sua presença bem atrás de mim.
Sua mão vem de encontro a garrafa onde ele tira da minha mão, solto a mesma sem manter qualquer contato visual.
Dessa vez ele não vai ver minhas vulnerabilidades.
— Vai querer conversar agora? — Seu tom de voz diferente do que eu imaginei, dessa vez soa calmo, o que me faz querer rir.
Inspiro fundo soltando o ar pela boca em alto e bom som.
— Conversar? — Arqueio a sobrancelha me mantendo de costas. — O você quer me informar o que você já decidiu.
O silêncio permanece em nosso meio até escutar o barulho do isqueiro e logo depois o cheiro do baseado.
É, ele está tentando achar as palavras certas.
Mordo o lábio inferior que tenta vacilar.
— Manuella ... — Engulo seco juntando as pernas. — Bora trocar um papo na tranquilidade.
Confirmo com a cabeça virando a cabeça até onde consigo ter a visão dele sentado no sofá com os braços apoiados nas pernas e a cabeça baixa, os olhos presos no chão.
Observo cada parte do seu corpo, sem que ele note meus movimentos.
— O que você quer, Filipe? — Sussurro vendo seu olhar vacilar e finalmente sua cabeça virar na minha direção. — Me fala o que você quer da sua vida? Porquê eu já nem sei se te reconheço mas ...
Meu coração aperta ao me dar conta do que está acontecendo aqui.
— Não me reconhece? — Sua testa se enruga conforme ele estreita os olhos. — Vai dizer que não reconhece o que a gente sente um pelo outro também?
Fecho os olhos negando com a cabeça.
— Então me fala, se sentir ou não tem adiantado de alguma coisa? Me fala se isso é o suficiente pra fingir que toda essa merda dos últimos dias não aconteceu? Me fala se não tem ninguém machucado aqui?
Uma lágrima teimosa cai pelo canto do meu olho esquerdo me fazendo abri-los lentamente.
— Caralho ... — Suspira jogando a cabeça pra trás respirando fundo. — Aonde nós errou? ... Onde nós errou?
Minha cabeça lateja quando tento levantar mas acabo tendo que me segurar na cama percebendo que não deveria ter bebido tanto e muito menos sentada.
Ele se levanta e vem tentar me ajudar, mas acabo me afastando e negando com a cabeça.
— Melhor não. — Ele para onde está me observando sentar na ponta da cama, mesmo sem me dar crédito ele abre o frigobar pegando uma garrafa de água e me entrega se aproximando.
— Toma tudo. — Fecho a cara puxando da mão dele que me observa se afastando logo depois, o telefone dele toca mas sem dar atenção vejo quando ele desliga o mesmo jogando pra longe.
— Não quero mais me machucar ... — Olho em seus olhos vendo o mesmo desviar segundos depois engolindo seco.
Ficamos minutos parados no mesmo lugar até ele se sentar no chão de frente pra mim esfregando os dedos me dando sinais do seu nervosismo.
— Acho melhor a gente parar por aqui ... — Fala tão baixo que tenho que me esforçar pra ter certeza que não foi coisa da minha imaginação.
O coração acelera de uma forma que tenho a sensação que está me ferindo de dentro pra fora.
Sem falar nada só me esforço pra levantar sem tombar.
— Me perdoa se eu te decepcionei... — Nego passando a mão no peito sentindo o choro dando sinais. De costas sinto ele se aproximar antes que eu pudesse me afastar segurando meu punho me obrigando a virar e olhar em seu rosto, os olhos vermelhos, a cara de cansado, um olhar perdido, revelando o quanto ele está em uma guerra interna.
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Contramão
FanfictionEu te proponho o que há de bom, aquela melhor onda Hoje eu quero te ver, então me diz onde você tá ...