Cinza I

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INSTABILIDADE

Trabalhar naquele fatídico dia fora a melhor coisa que poderia ter acontecido a Alisson. Sua cabeça mal conseguia raciocinar enquanto esteve em casa, e o clima também não ajudara muito. Ele e a mãe tentaram deixar a situação menos tensa, porém sem sucesso. Saber que o próprio pai era um molestador o fazia ter vergonha até mesmo de sair em público. Como podia ter seus genes compartilhados com os de um ser assim? Por algumas horas no "Wunder Bar" sua cabeça não o torturou com essas perguntas.

Desde sempre fora um garoto assim: temperamental. Em geral seu mau humor se dava quando algo fora de seu agrado acontecia. Quando tinha seus calos pisados, não hesitava em partir na defesa de sua dignidade, não importasse o preço a pagar. Perguntava-se de onde poderia vir tamanho comportamento, já que a mãe apesar de – em sua opinião – parecer louca, era uma pessoa tranquila e alegre. Agora tudo fazia sentido.

23H00 em ponto. Mais um dia de trabalho havia se encerrado. Por mais que a situação com Gil tivesse o deixado um tanto nervoso, não conseguia sequer pensar naquilo. Al fez seu trabalho rotineiro e nem atinou a agir de maneira indiferente ao colega que o beijara. Isso deixou o mais velho inquieto e pensante no que a cabeça do mais novo estava maquinando. Ao fim do expediente, não deixou que a dúvida pernoitasse até o dia seguinte. Queria a resposta. Aproveitando-se do fato de Al permanecer sozinho no vestiário mesmo após a saída de todos, o garoto foi até lá. Não estava exatamente o símbolo da coragem, ao contrário – O rapaz poderia estar tratando-o assim de propósito a fim de torturá-lo. Não tirava sua razão, mas queria saber se era aquilo mesmo. Precisava ouvir da boca do dito cujo que ocorria.

Abriu a porta devagar e entrou de mesmo modo. Seu coração estava acelerado por não saber o que lhe aguardava e suas mãos soavam frio. Dera mais alguns passos e ficou a observar o menino sentado no banco, enquanto se escondia por trás de um dos armários dali. Foi espiar com cautela o garoto e percebera que ele estava olhando uma foto. Encarava-a com certa mágoa, podia se notar de longe. Seus olhos grandes mal piscavam tamanha fixação em observar o que quer que estivesse nela. Gil então encarou o rosto do mais novo e surpreendeu-se ao ver algumas lágrimas caindo sem que o outro as impedisse. Surpreendeu-se, já que Al sempre fora um garoto de atitude (Mesmo que errôneas em alguns momentos), não parecia se abalar fácil. Agora estar ali diante de um garoto aparentemente fragilizado lhe causou estranhamento.

— Al? – chamou, com voz baixa atraindo a atenção deste. Tratou de secar as tais lágrimas.

— Que foi, Gil? – perguntou, sem vontade.

— O pessoal todo já foi embora. Acho que seu Antero só tá te esperando pra fechar.

— Ah... Tá. Já tô indo lá?

— Tá tudo legal contigo?

— Fora um guri ter me beijado sem que eu quisesse, tô ótimo.

— Se tu não tivesse com isso aí na mão até acreditaria.

Ponto pra Gil.

— E por um acaso te interessa saber da minha vida?

— Me interessa saber por que estava chorando isso sim.

— Que fixação em mim hein? Vai pra p*rra, guri! Que saco!

Gil cruzou os braços .

— Não saio até saber o que rolou – o menor revirou os olhos – Qual é, eu quero o teu bem.

— Não, tu quer me— não quis concluir a frase. Achou perda de tempo — Só vai embora e avisa que eu já tô indo beleza? Dá pra ser?

O mais velho bufou decepcionado.

A Teoria Das CoresOnde histórias criam vida. Descubra agora