Branco VII

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CONFUSÃO

Não é exagero afirmar o quão frágeis e sensíveis ficamos quando entramos em um relacionamento. Estes têm o dom de serem, ao mesmo tempo, o sétimo céu e a mais pesada das cruzes. Conviver com alguém vindo de uma criação (por vezes) oposta nossa, valores, opiniões, maneiras de agir; às vezes até mesmo hábitos corriqueiros, manias, TOC's, vícios... Sempre é uma grande aventura, ou até mesmo, uma experiência das mais complexas.

O grande "x" da questão é sermos humanos. Tal atribuição, muito além de ser mera constatação científica, nos torna mais vulneráveis e expostos a diversas sensações as quais nenhum outro ser vivo pode sentir. Nosso corpo reage de formas desconhecidas, criando sonhos, ilusões, planos, ou até mesmo de formas mais físicas, comprovadas por nosso comportamento biológico. É um mar de mistério onde somente os mais corajosos sobrevivem, mesmo assim, apostando todas as suas fichas, vontades e desejo de ser feliz ao lado de alguém. Infelizmente, não era o caso de Daniel e Vanessa.

Lutaram por muito tempo. Talvez até além de onde muitos chegariam ou aguentariam, mas, quando não há vontade na luta, um objetivo a ser alcançado, os ventos da vida carregam os véus que cobrem os dois amantes e os leva para seus próximos e futuros amores.

Isso, de alguma forma, consolava Daniel. Ver um relacionamento de anos acabar de forma tão rápida e sem maiores delongas doía, porém, seu coração, já passado do primeiro momento de choque, parecia ter entrado em um novo estado: o de regeneração. Pouco a pouco, as feridas, cortes e machucados iam sendo costurados pelas linhas do tempo e do pensamento. Refletira muito, principalmente depois da conversa com Sabine. Foi essencial botar pra fora um pouco de verdades renegadas por tanto tempo, Pareceu um peso saindo das costas, mesmo a ferida sendo a mais difícil de cicatrizar. Pelo menos podia agradecer por ter parado de sangrar — achou um bom começo.

O pior de tudo era não ter outra pessoa além de Ian em quem confiasse plenamente para poder se sentir seguro. O amor e o carinho do primo por si eram essenciais, sem dúvida, mas alguém capaz de ser sincero e, ao mesmo tempo, se importar com seus sentimentos enquanto tinha uma certa distância afetiva parecia bom. E sabia bem quem poderia fazê-lo. Alisson podia ter todos os defeitos do mundo; criado um caos do tamanho do universo dentro de sua vida outrora tão organizada e perfeitinha; ainda sim, fora um parceiro inigualável nos últimos tempos. Conseguia tirar sua cabeça dos ares e pôr de volta à terra apenas com aqueles olhos castanhos mirando fixamente dentro dos seus, tendo quase habilidades de um toureiro e a esperteza de uma raposa. Mesmo sendo ele a cereja do bolo responsável por seu término, como fazia falta... Dan o via como um veneno capaz de curar sua doença. Só não entendia o porquê...

Levantou da cama saudoso naquela manhã de quarta feira. Cada gota caindo do lado de fora da janela, parecia aumentar ainda mais o aperto em seu coração. Teria o céu se apiedado de si? Aparentemente sim. Queria deixá-lo a vontade para mergulhar dentro de sua mente e buscar no passado as respostas tão almejadas. Às vezes isso se fazia necessário.

Notou, pela primeira vez em alguns dias, seu trevo de quatro folhas no vasinho em cima da mesinha. Ao contrário da última vez, estava mais murchinho, caído, abatido. Com pena, abriu a janela e o pôs onde a água caía para ver se trazia de volta a alegria de viver. Por um momento sentiu inveja daquela plantinha: meras gotas seriam o suficiente para reanimá-la, já ele próprio precisaria de coisas bem mais complexas...

Arrumou-se e desceu até a cozinha. Qual não foi a surpresa ao encontrar seu belo primo de olhar tão vivo e brilhante tomando seu café, sempre com seu sorriso grudado nos lábios. Aquilo impressionava Dan de verdade.

— Tu só pode ter essa boca costurada assim — debochou.

— Como? — o outro perguntou, rindo.

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