Preto IV

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MEDO

Queria muito poder prolongar por mais um mês seu retorno às aulas, mesmo tendo claro em sua mente que apenas um milagre poderia lhe proporcionar tamanha felicidade. Como não era o caso, Alisson apenas resolveu aceitar e ir direto para a escola - a rotina habitual voltava. Fez isso, inclusive, com certa pressa. Não por ânsia de retomar seus estudos e ampliar seu conhecimento, mas sim, pelo sermão que ouviu da mãe pelo banheiro molhado. Com tanto a se fazer no dia anterior, chegou exausto do trabalho (e até da vida em alguns minutos), esquecendo-se então do banheiro encharcado por Dan de manhã. A lembrança também o fez agilizar seu café e preparativos para a escola e sair de casa de uma vez. Não precisava lembrar daquilo.

Apesar dos pesares, havia saído de sua problemática turma. Não suportaria encarar qualquer um dos ex colegas, principalmente por já ter arranjado encrenca com eles durante boa parte do tempo convivido. A história da foto foi apenas a desculpa perfeita para pedir sua troca de turma. Queria ter absoluta certeza do sumiço dela, aliás. Não confiava na garantia da supervisora de que todas as cópias haviam sido deletadas. Internet é uma terra sem lei, como poderia o atrevido rapaz não ter a enviado para alguma plataforma em nuvem? Seria um escândalo, na época, qualquer um dos amigos a verem. Porém, após tantos acontecimentos, achava até graça daquilo. Antes um flagra de beijo, do que de uma transa.... Correto? Se tivesse tempo, investigaria mais a fundo, mas sem ajuda de ninguém, ficava difícil. O jeito era entubar e rezar para ninguém ter a ousadia de publicá-la.

Parou bem em frente ao portão da escola, assim que voltou das nuvens por onde seus pensamentos voavam. Encarou bem cada uma das figuras juvenis entrando na instituição tal como ovelhas a caminho da tosa. Via aqueles rostos indo a passos largos para o calvário, sorrindo e fingindo estar tudo na mais plena harmonia. Revirou os olhos, querendo sumir dali.

Sentia uma apatia tão grande diante de tudo aquilo que mal sabia descrever. A única coisa boa ali foram, por muito tempo, as garotas. Por elas dedicava seu tempo aguentando os surtos da professora de Matemática que "tanto amava", os trabalhos pouco ou nada empolgantes, aulas monótonas e sem vida. Mas nem isso lhe agradava mais. Amora conseguiu azedar seu paladar. Portanto, existia ali, só isso. Fugindo do deprimente pensamento, buscou focar na novidade que era estar em uma nova turma. Talvez, no 3B, fosse mais feliz no último semestre gasto em sua vida dentro de uma escola. Pensamento positivo. Buscava-o para enfrentar mais uma batalha.

Ao cruzar pelos corredores e entrar na nova sala, já viu os rostos conhecidos. Sabine e Jeferson sentavam um ao lado do outro, entretidos com seus respectivos celulares. Além destes, por infelicidade, o olhar fuzil de Amora também se alinhou ao seu, tendo a certeza de que a moça iria reagir.

Dito e feito. Na mesma hora, ela levantou de onde estava e foi até Alisson, com seu andar rebolado e jeito mimado de levar a vida. Sua cabeça, pensou, devia estar sob efeito tóxico de alguma droga. Como pôde pensar que se tratava de uma garota legal, liberal e divertida?

— Sala errada. O 3A é aqui do lado — O ar de superioridade, somada a pose de patricinha americana, apenas deixou Al com vontade de agir à altura.

— Eu não sou demente ainda, Amora. Troquei de turma. Vamos ser coleguinhas a partir de agora — levou aos lábios seu conhecido sorriso de deboche.

— Jura? — pareceu surpresa, ajeitando seus cabelos — Poxa... Que pena. Quando me contaram sobre um colega novo, pensei ser alguém mais... homem.

— Pois parabéns. Tá na frente de um.

— Não. Com certeza — riu, dissimulada — É só um gurizinho, como todos os desse colégio. É uma pena, sabe? Quando ficamos a primeira vez, te achei com mais firmeza na vida.

A Teoria Das CoresOnde histórias criam vida. Descubra agora