FELICIDADE
Desde o início dos tempos, procuramos dar significado a nossa existência no plano terreno, fazendo disso uma meta de vida. Com olhares bem atentos aos movimentos frenéticos das peças de xadrez componentes do destino, tentamos entender as habilidades exigidas e estratégias numa tentativa desesperada de não cair no breu sem conhecer o rumo da condição mais plena. Esta busca, ou jogo, não cessa, não tem pausas, e Daniel estava com a vez. Só tremia inteiro só de pensar na culminância da jogada.
Era dedutível saber como as coisas se sucederiam. Em meio a tantos percalços e desafios, passar incólume não parecia nem de longe uma culminância válida. Seu coração, tão apertado e perdido dentro de seus anseios, lutava com todas as forças para não ceder, na esperança de sustentar uma mentira menos impactante do que a verdade. Ela parecia pesada demais para seus ombros, e já não podia afirmar se aguentaria muito mais tempo o impasse.
Já passava da primeira hora da madrugada de sexta para sábado e seguia sentado à mesa observando todos eufóricos a balançar o esqueleto na pista de dança. Garotos com garotas coladas em suas cinturas, outros avulsos arriscando alguns passinhos apenas para não perder o timing, e, finalmente, seus companheiros de solidão, sentados em cantos apenas vendo tudo acontecer sem esboçar reação. Aquilo tirava seu temperamento dos eixos. Não se conformava, todavia, nada fazia para mudar. Conflituoso e contraditório, como ele próprio tinha ciência de ser.
Alisson estar tão confortável em sua posição deliberada de bom dançarino, com algumas das mais belas meninas convidadas para a festa grudadas nele também ajudou muito na sua vontade de sair berrando a quem quisesse e quem não sobre sua indignação. Não compreendia como sua cabeça estava a um fio de perder a razão enquanto o amigo se conformara. Seria a posição de gostar de homens tão confortável? Estar seguros de seus sentimentos trazia uma paz tão completa a ponto de nada mais importar? Na realidade, bem sabia das respostas. Assumi-las era o risco que atormentava seu sonho de ser feliz.
Para piorar, cada minuto que passava aumentava um grão em sua consciência pesada. Viver parecia uma tarefa complicada demais para conseguir decifrar todos os segredos necessários, a fim de culminar na chave do sucesso e prosperidade. Entretanto, sendo as escolhas parte essencial do processo, e Dan sem ter a menor ideia de quais fazê-las sem lhe causar maiores prejuízos, o grão se transformava em montanha. Não podia seguir com o coração apertado daquele jeito. Uma ação precisava ser feita.
Seus devaneios só foram interrompidos ao sentir dentro da calça seu celular vibrando com o nome de Ian na tela. Como o barulho iria incomodar a compreensão, acabou levantando e indo até a recepção, à hora praticamente vazia, onde a música alta perdia um pouco do fôlego existente na pista de dança ao som de Don't You Worry Child. Ao atender, a voz animada ecoou pelo aparelho eletrônico questionando a quantas andava a festança. Dan tentou disfarçar, falando do ambiente, o clima descontraído, pessoas dançando e se pegando a cada dois passos dados, mas o primo já tinha doutorado em sua pessoa. Conversas como aquela já não surtiam o mesmo efeito.
— E já conseguiu se divertir por ti mesmo, sem ser essas coisas externas? — indagou.
— Ué, e tem como não estando numa festa? — o mais novo tentou sair pela tangente.
— Se existem pessoas com coragem suficiente pra rir em velório, tu acredita mesmo que não existam pessoas tristes em festas?
— Não tô entendendo. De onde tirou que tô triste? Tô muito bem se quer saber a real!
— Tu pode enrolar quem tu quiser, não eu...
— Sempre se achando o refrigerante mais gelado do mercado, né? P*rra...
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A Teoria Das Cores
Teen FictionO que seria do verde se não fosse o amarelo? Essa clássica pergunta nos faz pensar em todas as coisas que mesmo diferentes nos unem. E será o diferente que irá unir a vida de Alisson e Daniel, rapazes problemáticos que de repente verão suas vidas ci...