Rosa X

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ACOLHIMENTO

Certos encontros, por mais previsíveis, sempre acabam gerando um nó na garganta de tamanho suficiente para fazer um gato passar três semanas tossindo sem conseguir tirar. O desespero e a ânsia de resolver aquilo antes de sufocar em nada ajudavam quem estivesse dentro daquele círculo de fogo, onde ficar inalaria fumaça e sair se queimaria por inteiro.

Mesmo com a consciência de precisar encontrar o pai em algum momento, numa tentativa de resgatar o ocorrido e transpor-lhe de forma menos impactante tudo envolvido nele, encará-lo parado observando um reboot acontecer em sua frente em nada parecia ajudar. Não desfez o ato em consideração a Alisson, que sempre tomou as rédeas da situação e resolveu tudo sem medo das consequências.

Um tanto em dúvida quanto a ir ou deixá-lo a sós, acabou apenas indo por insistência do menor, garantindo sua segurança e bem estar. Poderia ter insistido, mas respeitou sua vontade, afinal de contas era uma conversa entre pai e filho. Tudo o que dissesse poderia deixá-lo em saia justa. Deu um leve beijo em sua bochecha e foi-se, ao passo em que Dan entrava na padaria. Bruno questionou o irmão e a cunhada se havia algum problema em conversar em sua casa, recebendo resposta negativa, mas Marcella apenas pediu para ir junto. O homem, apesar de não compreender, tampouco argumentou.

Mil pensamentos invadiam a cabeça do garoto a cada passo mais próximo da casa dos tios. Depois de ter enfrentado uma alcateia de leões, estar no meio de um furacão não estava nem na lista de coisas as quais odiaria, evitar ao extremo era o mais próximo. Porém, uma vez tendo seu segredo exposto ao pai da forma mais errada possível, em sua opinião, o jeito foi estufar o peito e encarar de frente. Qualquer coisa além daquilo seria adiar o problema, quando o que mais precisava era se livrar de todos para, quem sabe, ter um pouco de tranquilidade em seu coração.

Entrando na casa os três se dirigiram ao sofá, sentando cada um em um lugar diferente. Marcella ficou mais afastada, observando tudo de longe. Sabia não ser prudente se envolver em uma conversa que só dizia respeito a pai e filho, então ficar no meio poderia deixar o sobrinho ainda mais agitado. Ficou escorada no vão entre a sala e o corredor, enquanto Bruno e Daniel pareciam buscar as palavras certas para dar início ao acerto de contas.

O pai encarava o filho, vendo-o de cabeça baixa, tentando buscar no fundo da alma qualquer coisa capaz de explicar tudo aquilo que a mente não conseguia. Passava longe de sua ideia, nem mesmo a mais remota, encontrar seu filho com outro rapaz. Analisando a figura à sua frente, lembrou-se dos tempos dele criança, chateado por ter quebrado alguma coisa ou aprontado algo indevido. Aprontado tinha, isso era senso comum, só começava a duvidar se era indevido. Seu menino havia crescido apenas em tamanho, sendo, em seu íntimo, a mesma criança doce e amiga que já fora.

— Acho que nenhum pai espera isso de um filho, né? Ter uma conversa desse tipo — começou, mas sem dar margem à respostas — A gente se preocupa tanto com outras coisas e acaba fugindo dessas. Eu, por exemplo, sei que te ensinei a andar na calçada, não mentir, a ser honesto em todas as circunstâncias não importa quais... De repente, tô me vendo diante de algo que não me lembro sequer de ter citado na tua presença.

— Pai, eu—

— Daniel, por favor, me escuta — pediu o pai, prosseguindo — Quando a tua mãe me contou sobre a história da dança e tal, ali eu senti algo errado. Como assim dança? Tu nunca dançou nem naqueles joguinhos de videogame, e de repente quis virar dançarino? Coube a tua mãe me explicar que aquilo seria bom pra tu canalizar essa usina nuclear que tu tem aí dentro, que a gente nunca sabe quando vai explodir. Achei bizarro? Achei. A maioria dos pais que conheço quer o filho gritando eufórico quando o Inter ganha e o Grêmio perde, mas aceitei numa boa. Compreendi que era importante pra ti em vários sentidos...

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