ENERGIZAÇÃO
Momentos fatídicos na vida de uma pessoa servem muito mais para o externo do que para o interno. Mesmo quem vive a tormenta passando o dia-a-dia dentro de uma roda de fogo, sem saber qual rumo tomar, as mãos estendidas do lado de fora e os sacrifícios por elas feitos são, em grande parte das vezes, cruciais para se manter a esperança de conseguir se reerguer do chão e batalhar por seu lugar.
Dessa forma, ter os tios tão presentes havia se mostrado de grande amor e cumplicidade para consigo. Procurava nem pensar o que teria sido sem eles para ser seu suporte, o barco em meio a tempestade surgida do nada em sua vida, mas que, de repente, mostrou-se tão perigosa e amedrontante. Se conseguiu passar por ela, havia mérito deles nisso, na boa vontade e companheirismo. Surpreendeu-se com seu tio, afinal de contas ele havia descoberto no mesmo instante que o irmão, no entanto, mostrou uma reação branda, tranquila, buscando conversar e entender. Só tinha a agradecer por isso.
Ao fim do expediente, subiu até o quarto que ocupava, juntou suas roupas e pertences, descendo depois para dar um abraço nos tios e aguardar seu pai chegar com o carro para levar. Mesmo não sendo dez bagagens de mão, as roupas e livros de escola dariam trabalho caso fosse levar nas mãos. Por fim, Isabel e Bruno chegaram juntos, com a mãe correndo para abraçar o filho tão logo pôs os olhos nele. Cobriu-lhe com abraços e beijos pelo rosto, a fim de certificar-se que sua cria estava bem e com saúde. Dan acabou por rir, enquanto ajudava o pai e os tios a guardarem no porta malas as coisas.
Estavam se despedindo de Ronaldo e Marcella quando ouviram uma voz chamando pelo menino. Surpreendeu-se ao notar ser Van quem falava. Aguardou a moça acelerar o passo até lhes alcançar, cumprimentando um por um dos parentes de seu ex antes de fazer o mesmo com o próprio. Notou em Bruno um certo olhar de quem está com sapato apertado, mas precisa manter a pose, a fim de não desviar as regras da etiqueta.
Não querendo perder muito tempo, foi breve ao questionar se Dan tinha um minuto para sair e conversar. O rapaz dirigiu-se aos pais para verificar a existência de algum empecilho. Constatado a resposta negativa, despediu-se dos tios uma última vez e prometeu aos pais avisar em caso de algum imprevisto. Dali, iniciaram o trajeto até a praça da República a pedido da loira. Mesmo estando nos melhores termos, dadas às circunstâncias, o silêncio formou uma fina membrana que os resguardava em seus mundos.
Daniel tentava imaginar quais pensamentos estariam rondando a mente de sua ex namorada. As águas passaram, a correnteza impetuosa encontrou o abraço da calmaria, mas lhe acionar de forma tão momentânea deixava dúvidas no ar. De certa forma, não a condenava. O término, à época julgado forçado, deu às sementes escondidas na horta de sua vida a luz que precisavam para brotar e crescer. Não havia razão no mundo capaz de anular isso, ou tornar mais leve. Pensou na possibilidade dela querer falar sobre algum ponto pendente, assunto resolvido de forma muito impensada. Tudo muito incerto, plantado em um solo cheio de dúvidas.
Já Van se via presa dentro de um vínculo no qual parecia cada vez mais estranho, apesar da compreensão e amizade ainda o regarem. Depois de ter sua alma arranhada por todos os espinhos possíveis do namoro com o menino a seu lado, ainda teve forças para passar uma borracha, momentânea que fosse, para dar ao mesmo um norte de vida.
Conhecia de perto a inconformação com a própria imagem, o desejo por ser e agir como qualquer outra pessoa cuja sociedade rotula de "normal", a vontade imensa de poder resetar seus pensamentos e iniciar de novo, desta vez, acompanhando tudo do jeito certo. Com o passar do tempo, aprendeu sobre o jeito certo ser aquele comandado pelo coração, nossas vontades mais íntimas escondidas por detrás das armaduras sociais. Se estava tendo a oportunidade de apresentar esse mundo ao ex, que fosse. Era mais fácil vê-lo feliz e sentir-se feliz do que sangrar e vê-lo sangrar.
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A Teoria Das Cores
Teen FictionO que seria do verde se não fosse o amarelo? Essa clássica pergunta nos faz pensar em todas as coisas que mesmo diferentes nos unem. E será o diferente que irá unir a vida de Alisson e Daniel, rapazes problemáticos que de repente verão suas vidas ci...