O frio dá o tom à noite paulista. Por isso, Bárbara veste um casaco longo preto por cima de sua roupa. Dessa vez, os cabelos estão presos em um coque despojado e o único ponto de cor em toda aquela composição negra é a sempre chamativa boca vermelha.César a avista, mas ela não o vê por estar de costas. Por alguns momentos, ele fica parado e só contempla a fumaça do cigarro de Bárbara se dissipar lentamente pela brisa densa e gelada de São Paulo. Ela parece embebida em seus pensamentos, com o corpo recostado no parapeito quando, não sei, parece que por instinto, talvez, ela sente o corpo de César por atrás do seu.
Bárbara: – Mon petit chat.
César: – Oi, doutora Bárbara.
Bárbara: – Você sabe que a gente só vai ter essa conversa porque eu gosto muito de você e porque nós somos, antes de mais nada, amigos, não sabe?
César: – Eu sei. Me desculpe pela forma como eu saí ontem, eu deveria ter te explicado.
É só neste momento que ela vira para olhá-lo. São segundos breves que se arrastam dando ares de imensidão nessa troca enigmática de olhares. É como se Bárbara o analisasse, parada, rolando o cigarro por entre os dedos. Parte dela, então, a retomada do diálogo.
Bárbara: – Se eu não tivesse espelho em casa, eu desconfiaria que você fugiu por conta dos meus 50 e tantos anos, pois sei bem que você tem apetite pelas jovens. Mas como eu tenho e sei que isso aqui, com o tempo, só se valorizou, imagino que o problema não foi esse.
César: – Hahaha. Com toda certeza, não. Você permanece linda e atraente, como sempre foi.
Bárbara: – Eu estou brincando. Te percebi angustiado quando eu te beijei, você parecia duelar com alguma coisa.
César morde os lábios e assente com a cabeça.
César: – Eu... Eu estou em compromisso com alguém.
Bárbara: – HAHA. Quando é que você não está, César? Acho que eu nunca te vi solteiro. Mas isso nunca foi empecilho para a nossa... Nossa amizade, por assim dizer.
Ela estica o braço, enrosca o indicador no lábio dele e desce o dedo, segurando-o pelo queixo.
Bárbara: – Assim como eu nunca tive vocação para o matrimônio, você, querido, sempre teve como ponto fraco a fidelidade.
Ele a ouve, sério. Bárbara pausa, traga mais uma vez e, em continuidade, emenda...
Bárbara: – A não ser naquela ocasião em que você se apaixonou perdidamente por uma menininha novinha, hahaha. Aquela, sim, te virou a cabeça. Foi a única por quem eu te vi ser fiel, arranjar brigas por ciúmes, sofrer por amor, abandonar o casamento...
César não diz nada, ele só... Só olha para ela erguendo as sobrancelhas e passando a língua pelos lábios, meio que se divertindo e em tom quase confessional. Claro que essa deixa já é o suficiente para que ela ligue os pontos.
Bárbara: – Ah, não. Não é possível, César! Não... Seu compromisso é com a menininha novinha? Hahaha. César, não pode ser, querido. De novo a Helena? O que é isso, karma?
Ele abre um sorriso largo. Parece que o peito até se alivia em, enfim, tirar esse peso, ser franco e ver o tom sempre gostoso e divertido de Bárbara permeando o diálogo deles, sem nenhum resquício de estranhamento pela noite anterior.
César: – É a Helena. Nos reencontramos este ano.
Bárbara: – Agora, sim, tudo fez sentido. Hahaha. Você deveria ter me dito desde o primeiro dia em que pisou em São Paulo, querido, que eu não teria se quer tocado o meu dedo em você. Eu sei bem que, sua vida, ela sempre foi assunto sagrado.
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Lacunas e Desfechos.
RomanceEsta estória é inspirada na novela e se desdobra em vários capítulos, com a intenção de complementar o enredo deste casal tão querido - sem que haja, no entanto, modificações na trama original. Sabe aquilo que você sempre quis ver na novela, a ce...