carlos eduardo
dirigia pela barra já de saco cheio e aflito, o tanto de branco e policial que tinha aqui e principalmente hoje, era assustador. conseguia contar nos dedos a quantidade de negros que eu via aqui e o pior, a situação de alguns não chegavam nem aos pés da situação dos branquelos.
mas o que eu vim fazer aqui? entregar convites do casamento da minha irmã para aqueles que faltavam, buscar alguns arranjos de flores e essas coisas. faltava um último convite para entregar em frente a um apartamento, parei meu carro e desci com meu celular em mãos.
— ei, boa tarde.. tô aqui em frente já, pode descer. - falei no áudio e fiquei esperando enquanto mexia no celular.
senti uma sensação estranha e quando olhei pro lado vi uma viatura andar devagar ao meu lado, virei o rosto mantendo a calma mas eles pararam.
— tudo bem, moleque? - falou um dos policiais.
— tudo. - falei apenas isso e olhei o celular novamente torcendo pra menina já estar descendo.
— tá fazendo o que aí? - perguntou o outro e eu ignorei. — tô falando contigo, porra.
respirei fundo e respondi.
— tô esperando a menina chegar pra entregar o convite pra ela. - falei ainda sem olhar para eles.
— não tá olhando pra gente por que, o caralho? - disse ficando nervoso e saiu do carro vindo na minha direção, respirei fundo mais uma vez e guardei o celular no bolso olhando pra eles.
— desculpa.
— mão na cabeça! - quase gritou e eu obedeci enquanto o outro apontava a arma pra mim. - tem droga?
— não, senhor. - falei puto.
— abre as pernas. - começou a me revistar e eu fiquei quieto, tocou no meu bolso achando minha chave. — esse carro é teu?
— sim, senhor.
— prova. - sem entender olhei pra ele e recebi um tapa na cara, no impulso e na raiva virei com tudo indo pra cima do policial.
— porra, tu tá maluco de bater na minha cara? - falei alto.
— como é? - falou o outro policial e deu com a arma nas minhas pernas me fazendo cair.
começaram com a covardia ai, tomei porrada pra caralho dos policiais e tinha gente em volta mas ninguém fazia nada, só assistiam calados, até que uma menina apareceu empurrando o policial entrando na minha frente, surpreendente era a menina da doceria.
— ei ei, tão batendo nele por que? dá licença caralho, chega. - falou e se abaixou ficando perto de mim vendo se estava tudo bem.
— se a senhora não se afastar vou dar porrada nos dois. - gritou com ela.
— experimenta tocar um dedo em mim, experimenta. - gritou e uma outra mulher aparaceu, era a taís araújo, já tinha visto ela na televisão.
— vocês não vão bater em ninguém, vão devolver a chave do garoto e sair daqui agora. - falou taís e enquanto isso a menina me ajudava a levantar.
— é o meu trabalho, senhora. - falou o policial que bateu nas minhas pernas.
— o trabalho de vocês é bater nos outros? - perguntou a menina e eles ficaram sem graça se afastando, só depois que eles entraram na viatura e saíram eu pude respirar aliviado. — e vocês tão olhando o que? hm? quando era pra ajudar ninguém ajudou, agora vão ficar aqui bisbilhotando?? pode sair todo mundo.
— xô! vão embora. - completou taís e as pessoas foram se afastando aos poucos. — você tá bem, meu filho? quer ir pro hospital? delegacia? eu te levo, vamos.
— não, eu tô bem pô. - menti. - vou pra minha casa.
— não! espera um pouco, você apanhou.. pra dirigir agora é ruim. cadu né? lembro de você na doceria. - concordei com a cabeça.
— isso, e você é a analu? - perguntei e ela concordou.
— vamos limpar esses machucados? eu te ajudo. - olhou pra mim e eu fiquei sem graça.
— se quiser eu deixo só vocês dois, sei que é constrangedor. - disse taís.
— eu vou ajudar ele e já vou pra casa mãe, avisa danúbia que quando eu chegar ajudo ela nas atividades. - elas se abraçaram e taís me abraçou também e logo saiu.
— você não tem que me ajudar não, tu sabe. - falei com ela.
— eu sei mas quero. - deu um sorriso e eu segurei no ombro dela. — vamos naquele quiosque ali do outro lado, eu conheço o dono.
concordei com a cabeça e ela me ajudou a atravessar a rua, quando chegamos lá eu me sentei no banco que ficava de baixo do coqueiro enquanto ela falava com o senhorzinho que trabalhava no quiosque. um tempinho depois analu voltou com uma caixinha de primeiros socorros.
— tá tudo bem? - perguntou e pegou um pano e começou a limpar onde tinha sangue.
— tá sim. - menti.
— pode ser sincero comigo. - disse me olhando e eu desviei o olhar.
— não tô bem, mas vou ficar.. - respirei fundo. — essas situações me estressam, nunca pensei que aconteceria comigo. me senti humilhado.
— eu imagino, sinto muito por isso ter acontecido com você..- passou uma pomada lá e colocou curativo. — se você quiser podemos ir na delegacia, posso ser até sua testemunha.
— vai adiantar de nada, cê sabe. se só denunciar resolvesse, isso não teria acontecido comigo.
— verdade..- respirou fundo e me estendeu um comprimido junto de copo d'água.
fiz careta tomando o remédio e sentou do meu lado me olhando.
— obrigado..- cocei a cabeça olhando pra ela. — agora preciso muito ir pra casa, minha irmã já me ligou quase 50 vezes.
— ok, vai lá mas cuidado. - levantou pegando a maleta de primeiro socorros. — fica bem.
— você também, mais uma vez obrigado pela ajuda. - disse puxando ela para um abraço apertado que foi retribuído.
após me despedir dela atravessei a rua ainda mancando um pouco e fui até meu carro, saí o mais rápido possível dali indo em direção a minha casa. no caminho chorei um pouco de raiva. me senti humilhado. violado. incapaz. insuficiente. o motivo? só por causa da minha pele preta, até quando isso? sou um homem honesto. eu trabalho, tô estudando, não bebo feito louco e nunca fui de dar trabalho. por que comigo? até quando isso?
peguei o elevador, cheguei no meu andar e empurrei a porta, assim que cheguei lá fui recebido pela minha irmã e minha cunhada com um abraço apertado. os olhos da minha irmã estavam vermelhos e inchados, com certeza chorou.
— nós vimos o vídeo..- falou tatiele, minha cunhada e eu respirei fundo sentindo a tristeza vir até mim mais uma vez.
:)
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bom dia! <3