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—Misha, pode fazer algo por mim? — Ares perguntou conforme caminhavam pela mata, cursando um destino que ele já tinha conhecimento.

—Hm? — Ela ergueu o rosto, o sol parecendo ser absorvido pelo pesado manto ébano, os olhos de tom amarelo fantasmagórico parecendo tornar-se quase castanhos com o jogo de sombra e luz. — O que precisa que eu faça, Ares?

—Eu e Sorscha não queremos ser tirados durante o dia, juramos colaborar contanto que os experimentos não ocorram durante o dia — Ares tentou negocial, não era um grande pedido, mas Misha sabia que não seria fácil convencer Cresseida de um motivo pelo qual deveriam ser retirados apenas durante a noite. — Por favor.

—É... — Ela o olhou, Ares era tão mais novo... mas a idade de tudo que tinha sofrido até aquele momento tornava-o cansado demais para os vinte e poucos anos. Misha suspirou, olhando para as poucas pedras que os guiavam para o coliseu com a escolta muito para trás — Acho que posso fazer isso, vou fazer Cress me ouvir.

E ela ouviu e por isso o garoto caminhava sem relutância, trilhando o caminho com apenas dois arautos que apenas impedia-o de se perder, duas sombras altas e fortes.

Ares pensou nas mil formas que eles poderiam morrer pelas mãos dele: o metal de acessórios e as fivelas grossas pareciam vibrar na mente da cobaia, um sussurro como se dissesse: eu estou aqui, me use.

Bastava se concentrar, naquela altura do campeonato, sequer precisava mover suas mãos para remoldar o metal e forçá-lo a matar quem ele desejava, mas trato era trato.

—Você demorou — Cresseida reclamou assim que o viu passar pelo arco de pedra do coliseu. Ela se erguia no luar como uma sombra maligna, os olhos cor de lavanda eram claros demais para a malícia obscura, a necessidade de caos para satisfazer desejos religiosos — Achei que tinha fugido.

—Vamos começar isso — Ele tentou passar pela Cress, mas aquelas garras negras afiadas agarraram-lhe o braço.

 — Lembre-se de onde veio, garoto, é melhor não perder.

—A sua preocupação me impressiona — Ares falou, a voz melódica e forte ecoavam como um deboche claro, os olhos violeta cintilando com ódio da figura na sua frente — Mas eu não preciso dela.

Misha era uma sombra oculta atrás do manto de Cresseida, um sorriso de orgulho contido, exposta apenas por um leve curvar dos lábios cheios. Ela gostava daquela fúria fria de Ares, não conseguia se sentir ofendida quando era alvo da sua grosseria impassível: mesmo que fosse uma ordem, era sempre Misha que estava com as injeções na mão.

Ela nunca poderia dizer que não era culpa dela, ela também não era santa alguma.

Ares pulou o muro que dividia a arena das arquibancadas, fincando os pés nus na areia suja e velha, tomando sua posição costumeira de costas para o portão de ferro que era de onde ele costumeiramente saía, encarando o lado oposto com um temor oculto pela concentração mortal.

Misha caminhou até ele, que estendeu a mão antes mesmo que a conselheira rúnica chegasse e lhe entregasse cinco pequenas esferas de metal, frios e vibrantes contra o toque quente e mágico de Ares.

E então ela se afastou no mesmo momento que os portões do outro lado se abriram. Ares observou atentamente conforme via uma garota em trapos verdes, os cabelos vermelhos e longos em contraste com os olhos completamente negros.

O garoto podia não saber qual magia ela controlava, mas o recipiente de barro com água dentro era uma boa pista. Ela estava nitidamente assustada, horrorizada com a realização repentina do que teria que fazer.

Noite Eterna, Coração EtéreoOnde histórias criam vida. Descubra agora