Noite Eterna, Coração Etéreo

7.2

O mundo de Satori estava silencioso e, pela primeira vez ela odiou aquele maldito silêncio. Ela caminhava e todos seus conhecidos pareciam querer pará-la, alguns ousavam perguntar o que estava acontecendo e eram respondidos com puro silêncio enquanto ela passava.

Orion tinha pedido para Cordelia ficar, e pela primeira vez aquilo era um bom conselho para que ela pudesse resolver as coisas com Sato. Mas ela não quis obedecer, arrancando a pesada capa branca incrustada de ouro no chão, vestindo a primeira camiseta que tinha visto antes de disparar porta afora.

—Cory! Eu estava te procurando agora! — Macaria surgiu do extremo nada — Você sabe o que aconteceu com a Sato? Ela parecia bem mal quando eu vi ela.

—Onde ela foi? — Cordelia estava tão exasperada ao perguntar que a Solari simplesmente sabia que algo tinha acontecido entre elas.

—Pra sala de treinamento, para onde mais ela iria? — Ela respondeu juntando as sobrancelhas em confusão — O que aconteceu entre voc- ei!

A garota correu antes mesmo que Aria conseguisse terminar a pergunta.

Daquela vez Sato apenas trancou-se na Incórporo, sabia que mataria alguém na primeira oportunidade. Aquilo estava a corroendo, não pela mentira, mas porque todos pareciam esconder algo e ela apenas se firmava no fato de que Cordelia nunca mentiria.

"Se eu te der um tempo, você colapsa e vira pó de uma hora para outra, então se quer um tempo, aprenda a se controlar."

E o que as pessoas não estavam sofrendo, as paredes encantadas pareciam se esforçar para conter as rajadas densas de pura eletricidade que a percorria, tão intensas que era possível ouvir aquele chiado fino, como um zumbido ecoando por toda a sala.

Sato ignorava a visão embaçada com lágrimas que ela nem mesmo se dava o trabalho de conter, golpeava esferas mágicas que eram seus alvos, mas não se importava quando errava e acertava as paredes.

E o pior erro de Cordelia foi aparecer ali, na mira de Satori em uma onda cegante de raiva. Estava de frente para ela e sequer hesitou mesmo enquanto Sato decidia em sua própria mente se valia a pena enfrentar um mar de problemas ao matar ela ali mesmo.

Como se ela tivesse a capacidade de matar a pessoa que mais amava.

—Sai daqui

—Me desculpa...

—Eu mandei você sair — A voz dela não era uma ordem, embargada e frágil e a única força que a fazia sair com um estrondo era o sentimento de traição.

Cordelia não saiu.

—Eu não tinha outra escolha, se eu tivesse eu juro que teria te contado.

—E decidiu mentir durante cinco anos para mim? — Ela riu, mas não havia sequer uma gota de humor. Sato abaixou a mão, mas aquilo sequer parecia um sinal de paz. — Espera... eu fazia parte do seu plano? Será que eu pareço tão idiota quanto me sinto agora?

—Você nunca fez parte dos planos, Sato, por favor — Cory tentou, e enquanto o semblante de Satori se tornava uma rocha de pura raiva, ela não se deu o trabalho de levantar as próprias defesas. — Você não é idiota, agora será que dá pra me ouvir?

—Eu achava tão arrogante quando os personagens dos livros que eu lia não queriam ouvir o outro lado... — Satori pareceu notar — Mas agora eu sei por que: eu não quero te ouvir, eu não quero te ver e eu só quero que você vá embora e suma assim como você fez com a minha confiança.

—Eu não vou te deixar, eu jurei que nunca ia fazer isso — Cordelia insistiu, dando um passo para frente e vendo Satori recuar dois, esquivando-se da mão erguida dela.

—Eu estou te livrando dessa promessa, fica tranquila — Ela falou.

—Você tá terminando comigo? — Cory pareceu tão surpresa que Satori arregalou os olhos dourados.

—E você achava que eu ia fazer o que? — Ela questionou, dando uma volta e mexendo no cabelo, tentando respirar porque aquela gigantesca sala repentinamente parecia menor que um armário — Eu tô cagando pra mentira, sinceramente tem tanta gente mentindo que eu não tô nem aí. O foda é que foi você. — Ela apontou o dedo no rosto dela, que estava chorando demais para conseguir reagir — Todo mundo estava à vontade para mentir, pra mim não importava porque eu sabia que você nunca faria isso, porque mesmo sozinha eu tinha tanta certeza de que você nunca me trairia, e olha que maldita surpresa!

—Por favor, você não quis dizer isso — Ela soluçou — A gente pode resolver isso, eu te amo tanto...

—Seu amor não te impediu de mentir — Sato finalizou e o barulho da aliança dela caindo no chão ecoou pela mente de Cordelia. — E o meu não vai me impedir de ir embora.

E Cory sabia que não podia fazer nada além de assistir ela sair de sala como um furacão, deixando-a com a explicação inutilizada e presa na garganta.

Macaria foi a primeira a achar Cordelia — talvez porque todo mundo estava preocupado demais em saber onde Satori tinha se enfiado.

—O que aconteceu? — Não era mais curiosidade, era querer ajudar a amiga. Ela se sentou ao lado de Cory no tatame.

—Ela terminou comigo — Mal era possível entender as palavras dela de tão embargadas, os longos cabelos ruivos totalmente bagunçados assim como a mente dela.

—Eu tenho certeza que vocês vão se resolver, a Sato provavelmente só estava de cabeça quente — Ela tentou, abraçando Cordelia e deixando-a chorar em seu ombro — Olha, vocês são um exemplo de relacionamento ideal e não tem problemas que vocês não consigam superar, eu tenho certeza que...

—Eu era uma Emissária da Escuridão, ela me viu voltando de uma reunião e tá tudo acabado agora — Aria sabia que aquele seria o estopim para Satori, assim como ela se sentia traída. Mas ainda continuou abraçando Cordelia. — Eu desertei hoje, por ela.

—Cory, fica tranquila — Ela pediu — Eu vou tentar conversar com ela, te juro que vou, mas você vai precisar manter distância dela.

—Ela é o meu mundo.

—Então vai ter que ir pra Marte por um tempo — Aria tentou animar a amiga, mas aquilo pareceu piorar — Foi mal, timing ruim. Olha, só vai pro seu quarto, descansa pelo resto da semana e eu vou conversar com a Satori.