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Andrômeda decidiu que gostava Melione quando ela lhe oferecera um corpo para comer, obrigando-a a tomar um longo banho depois de ensopar-se de sangue.

—Acha que eles podem ser... você sabe. — Ethan perguntou, aproximando-se de Melione que parecia dedicada a cozinhar algo que sinceramente, ele não queria perguntar o que era.

—Espiões? — Mel riu, balançando a cabeça — Não, não são. Mas mesmo assim eu quero manter distância do garoto, ele me deixa confusa.

—Rue vai ficar furiosa quando souber o que eles são — O Sombrio raciocinou, não porque eles eram más pessoas, mas porque eles nem precisaram perguntar para saber que eram cobaias em nome da amiga deles.

—Eu estou torcendo por isso — A Necromante não pôde evitar — Aquele garoto... Ares tem uma magia irreconhecível, e se um dia ele foi um conjurador, não tem vestígios disso no sangue.

—É porque a magia não é dele — Sorscha surgiu na porta da cozinha, vestindo um vestido rodado branco e simples, mas as escamas em seus ombros brilhavam a ponto de serem visíveis pela manga fina — Ele era obrigado a lutar, e se ganhasse, a magia do cadáver era... não sei como, mas era transferida.

—Isso não era crime em algum canto do mundo? — Ethan questionou, observando Melione desligar o fogo e fechar a panela.

—E acha que eles se importam? — A garota dragão os lembrou exatamente de quem falavam — "Tudo em nome do sangue Andraste"

—Você não parece muito devota — O Sombrio notou, mas não estava preparado para o pesar em seus olhos.

—Depois de um tempo confinada, você perde a sua fé — E talvez os Neera nunca entendessem o que aquilo significava. — Talvez não Andy, já que ela nunca conheceu nada além da própria cela.

—Ela nasceu de uma prisioneira? — Melione se intrometeu indiscretamente.

—Ela nasceu prisioneira — Sorscha os corrigiu com um suspiro — Obrigado por nos deixarem esperar pela Andraste aqui.

—Ruelle, chame ela de Ruelle, não de Andraste. — Ethan indicou.

—E onde seus amigos estão? — Melione tentou desviar do assunto.

—Andrômeda está no quarto, Ares não vai sair de perto dela.

—Ótimo, fiz uma sopa para ela — Ethan e Sorscha hesitaram por um momento — Não é carne animal, só queria... agradá-la, sei lá.

—Eu vou jogar essa panela fora — Ethan adicionou imediatamente, o que lembrou a repulsa de Ares ao ver Andy alimentando-se. Melione pareceu achar graça, balançando a cabeça em negativa.

—É só lavar, seu paspalho — Ela respondeu enquanto enchia um pote com o líquido grosso, o barulho de pedaços de carne indo junto era capaz de embrulhar o estômago de todos ali, mas Melione não pareceu se importar. — Você vem junto?

—Não é como se eu tivesse muita escolha — Ethan balbuciou enquanto acompanhava-os em direção ao quarto no andar de cima. O garoto não queria ir, sequer queria ter que assistir a canibal comendo novamente, mas queria se certificar que Melione não estava se metendo em cilada.

Andrômeda estava sentada no chão do quarto de hóspedes, ao lado da cama de Ares que lhe sussurrava algo sobre "estar segura" e não precisar hesitar.

—Fiz algo para você tirar essa focinheira — Melione indicou e Andy aparentemente soube distinguir o cheiro de carne humana ali, porque levantou-se mais rápido do que queria.

—O que tem aí? Tá mais cheiroso — A canibal perguntou, os cabelos agora desembaraçados estavam presos em um rabo de cavalo curto.

—Feitiço de contenção, vai tirar sua fome por um tempo — Ela indicou, oferecendo-lhe a tigela fumegante com cuidado, mas estava sendo assassinada pelo olhar de Ares, os olhos violeta frios.

Ethan era como uma sombra de Melione, devolvendo o olhar de Ares com a mesma intensidade, como um recado alto e claro que o passo errado o mataria antes que a cobaia pudesse tomar outro fôlego.

—Não vai machucar ela, só vai conter o espectro canibal — O garoto forçou as palavras para fora da garganta, mas não parecia se esforçar para ser agradável.

—Ótimo — Ele aceitou, desfazendo novamente a máscara de Andrômeda e vendo-a encarar o pote, Sorscha sentiu o rosto corar com um pouco de vergonha antes de Ares raciocinar e sentar-se ao lado de Andy, ignorando a repulsa por carne humana — É uma colher, você usa isso para não precisar sujar as mãos.

Ares envolveu a mão pálida de Andrômeda, guiando e ensinando-a como usar. Ela não sabia porque sentia-se tão desconfortável sobre o olhar os Neera, mas Melione se sentia pior ainda, porque depois de 600 anos, ela se sentia uma criança desesperada cuidando da visita, esperando Ruelle chegar para esconder-se debaixo da saia dela.

—As roupas de Lia ficaram bem nela — Mel comentou numa tentativa de tornar a situação menos embaraçosa.

Andrômeda se sentia confortável com o moletom largo, mas achava estranho o sentimento de calor que não vinha do desespero, era bom e ela finalmente sentia o peso de estar deslocada fora da cela.

—Será que Talon vai ficar puto em saber que o garoto é um clone dele? Até as roupas ficaram idênticas — Ethan se juntou, apoiando o queixo no ombro dela.

—Acho que o pior a acontecer é eles ficarem am...

—Vamos precisar do portal de Kaz de novo, tem ao menos dez novos moradores e alguém sabe por que o deck tá cheio de sangue? — A voz forte ecoou pelos corredores enquanto Ruelle subia as escadas, a Necromante não pôde evitar um suspiro de puro alívio.

—Foi mal, tinha um cara dando sopa e a gente precisava de comida bem urgente — Ethan respondeu alto, sorrindo para Sorscha que parecia extremamente confusa.

—E desde quando a gente é canibal? — Ruelle zombou, chegando na porta do quarto — É... quem são eles?

—Ares, Andrômeda e Sorscha — Melione apontou para cada um, que a cumprimentou de sua forma — E essa é a Ruelle e eu acho que vou cuidar de Sage agora.

Ela arrumou uma desculpa qualquer para tirar Ethan e a si mesma dali, pensando em deixar eles interagirem por si só, mas o garoto pareceu notar o quão longe aquilo poderia ir.

—Cobaias, Rue, eles são cobaias. 

Noite Eterna, Coração EtéreoOnde histórias criam vida. Descubra agora