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Willa tinha terminado de curar Ezekiel há tempos: a perna nova em folha como se ele nunca tivesse sido atingido, e foi quando o seu comunicador chiou com uma voz desesperada, a voz de Satori.

—Willa! A Cordelia foi atingida, precis... preciso de você aqui... por favor!

Zeke e Ares arregalaram os olhos, Andrômeda já tinha se perdido de vista durante sua caçada insana, deixando-os em uma parte segura da floresta para protegê-los dela.

Willa, melhor correr para o leste: Circe caiu e não levanta mais, deve ser algum sangramento interno, tá preocupante.

A voz de Lia ecoou, um alerta um pouco mais sóbrio, mas a curandeira ergueu os olhos verdes brilhando com lágrimas.

—Eu tenho que escolher? — Ela perguntou, a voz parecia calma, mas os lábios rosados e finos tremiam... estava tentando manter o controle — Eu... eu não quero ter que escolher... não p-posso!

—Não aprendeu a curar à distância? — Ares tentou acalmá-la sem saber que ela era, de longe, a mais fraca do grupo.

Não pelo seu poder, mas porque era a única que conseguia controlar Energia do time. Os olhos aterrorizados dela já disseram o suficiente: uma das duas teria que morrer.

—Satori vai ficar arrasada! — Willa choramingou, encarando os filetes de sangue que já se abriam em suas mãos por causa do excesso de poder que estava usando.

—Merda! — Ezekiel berrou, arremessando uma pedra como uma criança mimada.

—O que eu faço? O que eu faço? O que...

—Primeiro: mantém a calma — Foi Ares, para a surpresa de todos que interviu, as mãos agarrando os ombros de Willa e forçando-a a encará-lo de uma vez — Respira, pensa com essa sua cabeça de curandeira.

Willa realmente, não soube por quê, mas respirou fundo uma vez, duas, três antes de organizar seus pensamentos, encarando o chão como se ele tivesse a resposta.

—Ferimentos internos são difíceis de conter, mas Circe tem treinamento e está mais perto do grupo: Lysandre jurou que conseguia cuidar do leste, então...

—Lysandre tá ali na frente — Ezekiel apontou de volta para a arena, para o homem que vestia o crânio de um chacal, cada passo parecendo regenerar a vida natural ao redor, ao mesmo tempo que galhos se deslocavam para protegê-los e matar seus inimigos.

—Consegue curar as duas — Ares pressionou, todas as tatuagens do seu corpo repentinamente brilhando num prateado sutil que nem mesmo ele pareceu notar — Consegue fazer isso, projeta sua cura para os dois lados, uma aura de proteção.

Deixe que eu amplifique o poder dela.

Uma voz sussurrou dentro da mente de Ares, uma voz feminina que não lhe parecia estranha... era a menina do último duelo.

—Não tenho poder o suficiente — Willa confessou — Só consigo acessar minha Energia, precisaria de ao menos um pouco de Aura para isso.

—E se eu amplificar seus poderes? Acha que consegue de primeira?

A curandeira pensou com a própria mente, executando o tanto de poder que deveria ser canalizado e para onde... como ela faria aquilo. Uma certeza tão inspiradora brilhava nos olhos violetas de Ares, que a encheu de confiança.

—Consigo, mas preciso ir para o centro — Ela calculou, mas Ezekiel se levantou atrás dela.

—Eu dou cobertura — Ele garantiu para a amiga.

—Então vamos: não temos tempo para perder — A garota correu, seus amigos a seguindo por todo o gramado até o centro, Ezekiel separando-se para afastar qualquer ameaça deles enquanto Willa se ajeitava no ponto que dizia ser ideal — Como vai fazer isso?

—Serei sua âncora: vou transmitir energia pura para que você converta em cura, vai te curar enquanto acessa sua Aura. — Ares explicou conforme a voz dentro de sua própria mente o pedia para fazer. — Não pode largar minha mão, se não vai morrer consumida pela própria magia, sem pressão.

—Uma por duas... parecce justo.

—Cala a boca — O garoto a repreendeu e ela tentou sorrir, erguendo a mão ferida para ele e vendo-o escondê-la entre as suas, as tatuagens grotescas em sua mão brilhando um pouco mais forte, o prata se transformando em um brilho verde fraco.

Mas ela sentiu a mudança em sua alma... como se o espaço, o poço de poder dela se expandisse cada vez mais. E Willa sugou cada centelha que achava da própria magia. Mantinha seus aliados em mente, pensava em cada rosto que poderia estar possivelmente ferido, cada um deles.

E sentiu um calor irradiar dela para fora. Fechou os olhos, como se isso pudesse concentrá-la ainda mais, e assim foi feito: ela sentia seus amigos, não simplesmente os via, mas sentia a energia vital, o coração batendo dentro de cada peito parecia retumbar na própria alma.

E ela deixou que aquilo irradiasse cada vez mais forte, Ares conseguia ver aquele brilho leve cobrí-lo, cobrir cada um dos aliados, mas parecia roubar dos inimigos dentro daquela mesma aura, como se transferisse a energia de uns para outros.

Bom, Ares que não ia reclamar.

Sentia-os morrendo como se ele os matasse, mas focava apenas em concentrar sua magia em Willa, dar-lhe um pouco da própria Aura para invocar a dela.

Mesmo quando sentiu que ela estava começando a sugar a energia vital dele. Cada. Vez. Mais.

Sentia o coração pulsar cada vez mais lentamente, menos ar chegava em seus pulmões e uma fadiga repentina o fez se sentir como uma gelatina, os olhos mal conseguiam manter-se abertos.

Mas ele não largou Willa sequer por um segundo.

Satori arrancou a lança da barriga de Cordelia com cautela, assim como uma voz alta de Willa tinha gritado-a para fazer. Circe, do outro lado da arena, sentia lentamente a força voltar para o corpo, até mesmo os que não estavam feridos pareciam ser preenchidos por uma repentina vitalidade.

Ao longe, Malaika e Nesryn conseguiam ver o que acontecia, mas simplesmente não entendiam o que estava acontecendo, até que Ares caiu de joelhos aos pés de Willa, sem largar sua mão.

Mas algo sussurrou no ouvido de Nes, que elas não deveriam interromper, que era algo importante acontecendo ali.

Então só pôde assistir o rosto moreno de Ares tornar-se macilento numa velocidade conturbada, só puderam observar quando uma linha grossa rasgou a pele pálida de Willa e a fez jorrar... magia.

—A gente precisa impedir! — Malaika gritou — Ela tá sendo consumida pela própria magia!

Não! — A voz de Willa ecoou por elas como uma sentença, mas nem era pelos comunicadores — Não! Não cheguem perto!

—Ela vai morrer.

—Não temos tempo para pensar nisso agora — Nesryn agarrou a mão de Malaika, puxando-a para a frente — Temos que defendê-la.

—Mas...

Precisamos impedir que a toquem.

Aika engoli em seco, mas caminhou junto com a amiga, se pondo na frente de ambos e derrubando os inimigos mais perto com rajadas de vento, sugando o ar dos pulmões daquelas mais audaciosos.

Nesryn ajeitava o cenário para ela, envelhecendo rapidamente uma árvore para que um dos galhos estivesse na posição ideal para espetar os guerreiros arremessados, tornando o terreno duro o suficiente para esmagar cabeças na queda.

Willa não sabia quando tinha percebido que a Aura não seria o suficiente, mas decidiu que precisava ir mais fundo. Que morresse! Nunca tinha cruzado a linha da mediocridade perto dos amigos, tinha nascido para curá-los.

Então assim o faria.

Sentia a dor de cada ferida e cada fratura de cada pessoa ali no próprio corpo. O estômago perfurado de Cordelia agora era dela, a perna quebrada de Ezekiel era a dela... tinha absorvido a ferida de todos, usando de magia contínua para se curar com o tempo.

Mas agora toda a sua magia era para curar.

E ela curou.

Foi a última coisa que ela fez antes de explodir em magia pura e levar consigo Ares antes que ele notasse que estava realmente morrendo.

Noite Eterna, Coração EtéreoOnde histórias criam vida. Descubra agora