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Alexina não soube dizer se Circe estava temerosa pela irmã ou se estava planejando algo suicida, mas sabia que a mulher estava fora dos eixos.

Era um fantasma por toda a Conclave, nunca estava no quarto, nunca estava nos jantares de gala e nem nas reuniões da madrugada, deixando Alex sozinha para lidar com a tirania da Velha Guarda.

Mas enquanto ela procurava por Circe, Cordelia tinha a sorte — ou o puro azar — de sempre trombar com ela na enfermaria enquanto visitava a namorada.

—É café, achei que fosse precisar — Cory ofereceu o pequeno copo plástico para Circe, que nunca tinha saído da poltrona da enfermaria, os olhos tornando-se fundos e apagados com a falta de sono.

—Tu é uma boa garota, senhorita Dumitrescu — A mulher elogiou, agradecendo e sendo recompensada com um aceno de cabeça.

"Ela não vai ter o mesmo fim que você, mãe. Eu me recuso a deixar isso acontecer".

—Eu também tenho problemas com herança de nome — Cordelia confessou, sentando-se ao lado de Circe, vendo o olhar se tornar curioso, quase acusador sobre ela. — Eu também sei como é precisar fazer coisas terríveis para salvar alguém que ama.

Uma das coisas que Cory mais odiava sobre o próprio dom era a forma que a sua Energia se manifestava: roubar memórias, ver através de segredos sórdidos nunca mencionados. E de repente, bastou que tocasse em Circe para estar com ela em cada um dos Julgamentos, em cada conversa e cada momento.

—Por que tu diz isso? Acha que eu me sacrificaria por alguém?

—Está sacrificando seu tempo para vigiar sua irmã, esse seu teatrinho de tirana não funciona comigo.

—Deveria ter mais respeito comigo: sou um membro da Conclave dos Caçadores e...

—Eu também amo ela — Cordelia cortou, olhando para Satori, adormecida naquela maca dura — Eu amo ela, Circe. Não faz ideia das coisas que tive que abrir mão para isso, o quanto eu arrisquei para ficar ao lado dela: eu também teria escondido a carta.

—Como tu...

—Eu sei de tudo, Circe, sobre a carta, sobre Kinessa, sobre tudo, até sobre a antecâmara. — A garota deu de ombros como se tudo fosse óbvio, porque era. Para ela, tudo era óbvio. — Sei porque está nesse posto.

—E se tu és inteligente, nunca mais vai tocar nesses assuntos — A mulher interrompeu com acidez, uma ameaça implícita.

—Não tenho interesse nenhum em te comprometer, Circe — Cordelia falou palavras que jurava já terem sido entendidas, mas sequer olhava para a mulher ao seu lado, acompanhando os batimentos cardíacos de Satori, atenta a qualquer mudança — Só queria... está fazendo um bom trabalho como irmã mais velha: está protegendo ela o máximo que pode.

—Acha que, se ela descobrir tudo, pode me perdoar?

—Não — A resposta era óbvia, direta. E mesmo assim dilacerou o coração de Circe, os olhos ardendo com lágrimas contidas — Mas pelo menos ela estará viva para um dia poder te perdoar. E outra, deveria mesmo fazer aquela coisa, mesmo que Alexina não concorde.

—Eu sei. Eu já fiz.

E enquanto ambas se recostavam nas poltronas desconfortáveis, do lado de fora era um terror completo com o medo de que Satori, o símbolo da revolução pudesse morrer.

Kinessa encarava a janela do próprio escritório na torre mais alta da Academia Soloton, observando atentamente aquela estátua de bronze erguendo-se na praça que dividia Colerum dos Mundanos.

—Por que Inara, com tantas figuras histórias, foi escolhida para ser nosso símbolo? — Questionou, desenhando com os dedos calejados, as diversas runas eternamente gravadas em seu braço, um símbolo da família que tinha deixado para trás, o único lembrete de que tinha alguém que realmente a amava lá fora.

Noite Eterna, Coração EtéreoOnde histórias criam vida. Descubra agora