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—Eu nunca vou conseguir fazer isso — A garotinha de olhos cor de safira fechou a cara, parecia ter menos de sete anos. O garoto de olhos turquesa riu baixinho e a abraçou, ajoelhado na areia conforme ela se recusava a tentar manipular o elemento.

—Tenho certeza que você vai criar grandes tsunamis quando crescer - Incentivou, seu sorriso fazendo a garota sorrir, deviam ser cem ou dez anos... nunca havia importado.

Então ela o fez, como se tivesse repartido o mar no meio, uma parte flutuou, com peixes e ecossistemas juntos.

E ele, Nathaniel nunca se sentiu mais orgulhoso.

Nathaniel amava as irmãs, Kamari e Morrigan eram suas dádivas, ele as havia educado, ensinado a controlar seus poderes e mostrado que as amava quando os pais não o faziam, era açoitado na calada da noite por ensiná-las que "criaturas monstruosas como elas" podiam ser felizes.

Mas não se importava, não quando as via serem mais humanas do que a maior parte das pessoas realmente eram.

—Ela já deveria ter chegado — Kazuha andava de um lado para o outro no andar subterrâneo, frustrado pela tranquilidade de todos com o desaparecimento de Ruelle.

Kaz não ligava se ela mesma tinha saído, mas iriam fazer quase seis horas desde que ela tinha feito, e nenhum dos amigos realmente parecia notar, vidrados numa comédia romântica na tentativa de esfriar a cabeça.

—Ela vai estar aqui para o café — Talon tentou acalmá-lo, mas ao receber um olhar de ultraje, soube que tinha apenas piorado.

—Para de andar de um lado para o outro porra! — Melione reclamou de braços cruzados no sofá — Você está me deixando nervosa dessa forma!

E ele realmente parou, mas não havia relação nenhuma com a ordem de Mel ou o fato de deixar todos em parafuso com aquilo, mas pelo formigar leve no braço que o fez repentinamente ter um mau pressentimento que o alcançou de uma forma tão forte que ele precisou parar de andar.

—Para onde você tá indo? — Lysandre reclamou quando o viu agarrar a própria jaqueta largada em uma das cadeiras — Kaz- Caralho!

—Fica frio, já, já ele volta — Talon lembrou o amigo com uma mão em seu ombro — Ele sempre faz isso quando ela some.

E Kazuha tomou o seu rumo para a praça, com um estranho medo de ela ter feito alguma loucura quando viu o amontoado de gente ali. Ele saiu empurrando a todos sem delicadeza nenhuma, ignorando os xingamentos, e não pôde evitar o choque ao notar as quase quatro dezenas de heróis amontoados ao redor da estátua de Inara, todos mortos.

Mas Ruelle não estava lá, mesmo que aqueel cheiro característico dela estivesse ali, ela não estava, então Kazuha ignorou totalmente se todos achariam que ele parecia um cachorro ao fungar o cheiro dela, tentando achá-la no meio da multidão.

E percebeu que seguia um rastro fresco até um pequeno bosque ali perto.

Assim que chegou no arco que representava a divisão entre a cidade e a floresta, notou aquele rastro fino de sangue no chão e sabia que ela ainda não devia ter se limpado - ou apenas queria ser encontrada. Ele se concentrou naquele sangue e utilizou de um truque que a própria Rue lhe tinha ensinado.

Reconstituição de cenário.

Era simples: ele conseguia ver o que tinha causado aquela mudança no ambiente. Então ele viu aquele raio violeta de energia caminhando para dentro da floresta e a seguiu até uma pequena clareira e observou atentamente o que estava acontecendo.

Ruelle estava cansada quando se arrastou, sentia a magia esgotada, mas de alguma forma estava tão desesperada que sequer notou...

—É sempre assim? — Darya perguntou para ninguém em especial da sala, preocupada — Ele... parece que virou outra pessoa, é sempre assim entre ele e a Ruelle?

Ela não era burra, tinha sentido aquela mudança de postura, os olhos em alerta de Kaz, o medo de algo ter acontecido, ignorando que ela era uma das criaturas mais fortes que já tinha pisado naquele mundo.

Darya também via o brilho nos olhos dos dois, sentia na própria pele aquela conexão estranha que tinha uma luz quase cegante toda vez que Rue e Kaz se olhavam, e era fácil achar que os dois se amavam. E era aquilo que fazia a fada se questionar diversas vezes o motivo pelo qual teria sido ressuscitada — se ele não a amava mais, por que faria aquilo?

—Sempre — Talon suspirou sem desviar o olhar da tela — Isso é normal de acontecer quando se vive mais tempo com uma pessoa do que sem ela, acho que isso dá uma... conexão especial entre eles, como se lessem a mente um do outro.

Não fazia sentido algum o jeito que todos falassem dos dois como se fossem um casal, porque ela sabia - quando Rue foi até o plano espiritual perguntando se estava disposta a tentar - que o feitiço exigia muito de qualquer pessoa, ainda mais com aquela coleira negra que ela via, assim como os grilhões em suas pernas e braços.

Darya tinha se aterrorizado com muitas maldições, nunca esquecia do primeiro espírito amaldiçoado que tinha visto depois de sua morte, mas nada se comparava com a aparência grotesca de Ruelle: as garras negras sufocando-as, as grandiosas asas acorrentadas, os grilhões em pernas e braços... a mulher se arrastava, aquilo chegava a ser cruel.

Por que arriscar? Por que incapacitar-se para reviver uma fada que simplesmente não encaixava-se no grupo? Por que?

Foi Lia que entendeu o que passava na cabeça dela, sentando-se ao seu lado, pronta para um discurso sem sentido sobre como tinha ouvido muito sobre ela e como Kaz amava Darya e...

—Ele a ama, não é?

—Sim. — E todo o discurso tinha ido por água abaixo, e ela precisava improvisar — Mas não é esse tipo de amor, sabe? É como se... se eles fossem irmãos!

Ethan virou a cabeça bruscamente quando entendeu o que ela dizia, com um olhar tão absurdo que Talon teve que esconder o rosto inteiro com as mãos em constrangimento. Lysandre já deixou bem claro que tinha achado graça na fala, enfiando um amontoado de pipoca para calar a própria risada.

O gêmeo de Lia estava no mínimo enojado com o que tinha acabado de ouvir, e seu rosto nem mesmo era capaz de disfarçar o desprezo naquilo. Ele começava a se questionar o que ela considerava irmandade.

E novamente, a única pessoa da sala que não estava em casa no dia, foi a que estranhou a reação de todos. Melione olhou para Lysandre em busca de esclarecimento, mas conseguiu apenas um dar de ombros.

Lys entendia a vontade de Lia de consolar Darya, mesmo que precisasse mentir para isso. Mas com certeza havia melhores palavras para expressar a relação complexa de Kaz e Rue, mas irmãos? Irmãos? Ele ficou um pouco surpreso por ela se interessar nesse tipo de relação.

Noite Eterna, Coração EtéreoOnde histórias criam vida. Descubra agora