"Coração Bobo" - PARTE 3

54 9 33
                                    


5

Pandora parecia ter se distraído por um segundo e alguém sentou no banco que ela tinha mirado. Pelo menos tiraria seus tímpanos, ainda sensíveis, do meio daquela zona, que já lhe dava dores de cabeça. Usando um macacão jeans de calça comprida (ridiculamente maior que ela), dobrado até a panturrilha, uma blusa de manga comprida de Storm Troopers com "STAR WARS" escrito em glitter no peito, seu tênis rosa de cano alto e marias chiquinhas, ela sentia que parecia muito mais nova do que realmente era e os adultos a olhavam com estranheza, sentada sozinha do lado de um cara muito mais velho que ela.

Gostava daquele macacão pela infinidade de bolsos ali. Tinha sua câmera agarrada ao pescoço, já tinha tirado um zilhão de fotos, mas sua cabeça latejava. Olhou pro homem sentado ao seu lado. Ele não parecia bem.

— Uhm... com licença. Posso ajudar?

"Sotaque engraçadinho", pensou ele.

— Depende. Se tiver uma arma, poderia me dar um tiro? Seria melhor do que essa dor de cabeça que eu tô sentindo.

Refletiu por mais um segundo e perguntou:

— É ressaca? - perguntou sem freio.

— Que tipo de criança pergunta pra um adulto se ele tá com ressaca? - disse ele, parecendo indignado.

— Uma que pode ter um remédio certo pra ajudar, dependendo da resposta.

Dabi via os pequenos pés balançando inquietos ao seu lado. Não devia ter, o que?, dez, doze anos? Virou a cabeça de leve, tentando não olhar muito para o lado. A pele escura destoava muito do que ele esperava ver. As mãos também. Talvez fosse mais velha.

— Você se acha muito esperta, não? - falou, com uma risada sarcástica.

— "Achar" não é o verbo certo, moço. Mas afinal, é ou não é?

Deu outra risada. A sagacidade lembrava o pequeno irmão, que tinha respostas igualmente afiadas, que hoje era apenas mais um obstáculo a ser superado para atingir seu objetivo. Ele ainda seria mais forte que o garoto prodígio, se isso significasse conseguir o que queria.

— Não, não é. - disse, se divertindo um pouco.

Ela deu uma bufadinha de satisfação e tirou uma cartela amarela com comprimidos marrons do bolso. Pegou um, enfiou na boca, bebeu da garrafa d'água que carregava consigo, pegou mais um e esticou pro homem ao seu lado, juntamente com o líquido.

— Como sei que você não quer me matar? - disse ele, olhando pra mão estendida e depois pra ela.

— Eu tomei um igual. Qualquer coisa a gente se vê no céu. Ou no inferno, tanto faz. - respondeu ela, dando de ombros.

Ele riu e aceitou os dois, enfiou o comprimido na boca e o fez descer garganta abaixo. Se virou para jogar a garrafa no lixo e quando voltou a cabeça para agradecer, viu o cabelo colorido pender pra frente e pousar no colo da garota. Ele conhecia aquele padrão de cores. No movimento de beber, Pandora olhou pra ele, enquanto a manga do moletom pendia um pouco pra baixo, mostrando uma linha do pulso. Era escuro, escuro demais.

— Não acha que é perigoso estar num lugar assim com um estranho? - disse ele, removendo suas luvas.

— Você não parece alguém perigoso. - respondeu, de forma displicente.

— Você não tem medo?

— Do que?

Se ajeitou no banco, pensando na ironia daquela situação. Estavam caçando a pirralha há meses, sem sucesso. Ela tinha matado um Nomu. Ia ser coincidência ou sorte demais se tivesse parada ali, ao alcance da sua mão, esperando pra ser capturada ou, se mostrasse resistência, poderia virar churrasco ali mesmo. Na verdade, infelizmente não poderia, uma vez que cara de reboco desgastado a queria viva. Segurou a menina pelo braço mais próximo do dele, puxou pra perto de si e tirou o capuz, mostrando o rosto.

CAIXA DE PANDORA - 1º TOMOOnde histórias criam vida. Descubra agora