[21.1]

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O que me despertou de todas aquelas memórias nem foi a música que já havia acabado. Foi o cheiro dos ovos queimando na frigideira e a fumaça de um quase, início de incêndio. Desliguei o fogo e meti a frigideira embaixo da água. E bufei num riso irônico: eu só sabia fazer lambança.

Estava cada vez mais difícil conviver comigo. Eu não estava mais suportando meus pesos e culpas. A “porção de filhinhos correndo no restaurante” não aconteceu, e eu não poderia cumprir a promessa de ter uma vida pacata e minimamente normal ao lado da Annie. E todos os erros que brilhavam como letreiro luminoso diante dos meus olhos apontava para uma palavra: negação.

Eu neguei todos os conflitos que eram verdadeiramente importantes de serem encarados. Estava sempre fugindo de alguma coisa para me sentir confortável, desde fugir dos trabalhos com férias improvisadas de casal, até fugir do término metendo a cara em trabalhos. Então chega.

Como meus pais e irmãos, e todo o restante possível de pessoas a minha volta dizia, era o momento de parar de fugir, e realmente encarar a vida que eu tinha. Vida esta que eu tracejei. A começar, por sair daquele apart-hotel desnecessário e impessoal.

Minha casa em Los Angeles ainda estava fechada, e bem... Por mais que pudesse me lembrar de momentos da minha vida antes da Annie, eu precisaria encarar aquilo. Até porque as lembranças vinham me perseguindo há um tempo. Eu precisava organizar o quartinho da Louis na minha casa também! Eu precisava ser pai! Caramba... Eu precisava ser um pai melhor.

Em seguida, eu precisaria conversar com Priyanka abertamente. Eu não poderia ter dúvidas entre nós, desconfianças ou usar um relacionamento para encobrir frustrações. Já havia feito aquilo por tanto tempo que sabia aonde iria dar. Até mesmo Annie me disse o mesmo.

Eu precisava me dedicar a recuperar as coisas perdidas que eu não deveria ter perdido, como a banda com meus irmãos, os amigos, a rotina controlada, e a minha família. Como e que tipo de família seria, eu só saberia no futuro até porque, se tratando disso não dependeria apenas de mim. E aquele era um grande aprendizado conquistado: assumir que algumas coisas não dependem exclusivamente da minha vontade.

Fiquei sem tomar café e fui me arrumar para conquistar a minha vida de volta. Começando pela mudança, precisava urgentemente voltar para algo próximo de uma casa, com a minha cara, com as minhas coisas.

— Joe? – telefonei ao meu irmão.

— Hey Nick! E aí, está melhor?

— Estou me mudando, preciso de você, do Kev, e talvez das meninas.

— O quê? Como assim Nick? Você conversou com a Pri?

— A Pri está viajando, e quando ela voltar nós vamos conversar, mas eu estou retornando com a minha vida para o lugar Joe.

— Ahn... – a voz dele era confusa e surpresa: — Tá legal... O que eu tenho que fazer?

— Preciso de ajuda com o transporte pra levar as coisas de volta a Los Angeles amanhã. Hoje, eu vou encerrar as contas aqui no hotel, e empacotar tudo.

— Certo. Eu posso meter a mamãe nisso? Sabe como é, ela pode ajudar melhor.

— Eu não queria incomodar ela com meus problemas de novo. Acho que não vai adiantar nada ela sair de Jersey para cá. Você e o Kev são ajuda suficiente.

— Beleza, se adiante aí então. Vou convocar o Kev e a Dani.

— E a Sophie.

— Ela ouviu nossa ligação. – ele riu.

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