Talvez devesse preocupar-se mais com a aparência, ele sabia.
Sohlon era um homem bonito, antes de ser rei ou assumir qualquer cargo que lhe trouxesse poder.
Nos últimos dois meses, entretanto, deixara a barba por fazer e os cabelos cresceram desenfreadamente. Ele voltara a beber com frequência e não se lembrava de como era sorrir.
Antes, Sohlon ainda carregava a carranca por onde fosse. Ele resumia os sorrisos à Odile e, por pouco tempo, à Kaha, seu pequeno herdeiro.
Agora, entretanto, acordava de frequentes pesadelos que o assolavam noite sim e outra também. O ar carregado arrastava-se ao seu redor pelo dia inteiro. Tudo o que fazia para distrair-se era lutar com Roto.
Nem mesmo podia tentar cavalgar pelos campos ao redor de Crisântemo. Estava ilhado naquele palacete com a guerra que cravara com o próprio povo.
Naquele dia em especial, Sohlon acordou enfurecido e decidido a fazer algo a mudar.
Reunidos no salão do conselho, as influentes figuras do Vale de Awa estavam mergulhadas no mais profundo silêncio. Nenhum dos homens ousara cortá-lo ao menos para ajeitar-se na cadeira.
O rei olhava janela afora. O dia estava abafado e quente, mas os céus carregavam nuvens nubladas e precipitadas para aquela hora do dia.
- Devem estar curiosos com o motivo de lhes requisitar aqui hoje - o rei cortou o silêncio, permitindo que todos finalmente respirassem em paz.
- Estamos, meu rei - Lorde Mirra o respondeu.
Sohlon voltou-se para eles. Estava claramente cansado, com carregadas olheiras e a aparência descuidada.
- Não quero opiniões e nem mesmo sugestões - o rei prosseguiu. - O que me traz aqui hoje é um informativo.
Em silêncio, os outros aguardaram.
- Vou reabrir as fronteiras de D'Ávila e Arande. Até mesmo da Pedreira. De todos os cantos que ousaram se fechar para mim. Ainda sou o rei dessas terras.
Os presentes tremeram. Eles sabiam que aquela decisão viria logo, e temiam ainda mais por saberem as consequências.
- Meu rei - Lorde Kunys arriscou sua garganta -, está ciente das consequências que sofreremos, certo?
Sohlon soltou o ar pesadamente pelas narinas. Kunys apressou-se a continuar.
- A guerra que está se alastrando por Crisântemo... vai se expandir por todo o Vale, meu senhor.
- Acha que sou inconsequente, Lorde Kunys? - o rei tentou conter a fúria em sua voz. - Eu não sou inconsequente. Eu sou o rei!
Sohlon gritou aquela última palavra, anunciando seu título. Todos mergulharam novamente no silêncio, inclusive Roto, que não mais conhecia seu amigo de tempos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Chamas de Petrichor {trilogia}
FantasyEra curta a lista dos medos que afligiam a pequena garotinha de olhos cinzentos. Primeiro, Azura não gostava do escuro. Ela era nascida de Petrichor, descendente de Sonca e Marama, os deuses do Sol e da Lua. Qualquer ausência de luz causava-lhe um p...