66. Lágrimas Negras

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Seus olhos não saíam do céu negro e o nó em sua garganta só aumentava, como se um desespero acumulado lhe causasse pânico e falta de ar

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Seus olhos não saíam do céu negro e o nó em sua garganta só aumentava, como se um desespero acumulado lhe causasse pânico e falta de ar. Azura, que antes estava disposta a ser mais que uma figura secundária naquela intrigante aventura, agora só se deixava levar pelos outros, que praticamente a puxavam e empurravam no bando que a circundava.

Enquanto os outros pareciam consolarem-se com as matracas soltas e especulações saindo de todos os cantos - desde a morte de Sonca até o fim dos tempos - Azura permaneceu calada. Sentiu falta do brilho dos astros sobre si. Tudo no que ela acreditava dependia que Sonca e Marama estivessem sempre olhando por ela, revezando-se dia e noite. Todavia, naquele instante, sem nem estrelas no céu, um vazio no peito parecia ter se instalado na boca de seu estômago e ameaçava alastrar-se por todo seu corpo.

- Vamos dar um jeito nisso - aproximando-se por trás, Düran isolou-se dos outros e acompanhou os passos de Azura. Diferente dela, não ousava olhar para o céu. Seu olhar mantinha-se fixo na terra por onde pisavam.

A petrichoriana retraiu-se. Não queria sentir-se tão confortável ao lado dele como se sentia. Por mais que dissesse que o passado já não lhe importava, algo a mais destoava-se naquela relação - e ela não gostava dos sentimentos que cresciam em seu peito todas as vezes que ouvia aquela doce voz direcionar-se a ela. Evitou olhá-lo ao responder:

- Uma coisa é chegar a Cinzas. Outra é colocar o sol no céu - apesar da sonoridade triste, conseguiu que sua voz saísse controlada. Sabia, entretanto, que se tinha alguém que a decifrava melhor que ela mesma, esse alguém era Düran.

A neve não mais caía naquele instante, mas deixou sua herança sobre o Vale por onde passou. Os peregrinos sentiam o frio cortante, como se a roupa que levaram não lhes fosse nem de longe suficiente. Bolsas quase vazias nas costas causavam pavor. Estavam quase sem mantimentos e sem previsão de chegada a lugar nenhum.

- Sonca não lhe abandonaria - Düran arriscou com um sorriso -, muito menos Marama.

Para sua surpresa, Azura sorriu.

- É, eu me esforcei muito para ser da família - indicou com a cabeça para as tatuagens, o lado do corpo repleto delas. Trazia na pele sua herança, a marca dos Deuses que nasceram e morreram em sua terra.

- Eu lembro. Eu estava lá - Düran concordou.

A mulher lembrou-se de quando tinha seus dezessete anos e finalmente optou por marcar seu amor por Petrichor em sua pele.


Era o começo do inverno em sua terra, mas nem de longe o frio assemelhava-se ao que sentiam agora. Era um frio quase reconfortante. Podia tomar chás de diversas ervas o dia inteiro e brigar com sua bexiga quando esta precisava ir ao banheiro, obrigando-a a sair de perto das chamas da lareira onde jogava baralho com seu pai sempre que possível. Ela nunca ganhou do Velho Nero.

Chamas de Petrichor {trilogia}Onde histórias criam vida. Descubra agora