A tensão tomou conta da atmosfera assim que, como eles, Crisântemo mergulhou na escuridão. Azura vislumbrou, por sobre as asas de Tohrak, as luzes da terra firme apagarem-se como um dominó, findando ali, no palacete.
A mulher olhou para trás. A mísera luz que surtia do horizonte lhe permitiu enxergar olhares recaindo sobre ela. Alguns pasmados, outros determinados. Só então percebeu o quanto segurava firmemente o arco e flecha que fizeram os Kinos. Parecia uma arma tão banal para uma guerra como aquela que sentiu-se estúpida. Mas, como prometera a Dante, tinha cartas na manga.
Ginevra saiu de seu posto e, trêmula, olhou para a amiga, procurando instruções.
- É com você - Azura falou alto o suficiente para que a bruxa ouvisse.
Ginevra estremeceu, mas não conseguiu identificar se o que sentia era bom ou ruim. Aos poucos, viram que a imensa frota do rei se mobilizava até eles.
Isso, pensou a bruxa. Venham.
- O que vai fazer, Gine? - a voz de Alaric chegou ao seu ouvido. Viu-o parado ao seu lado, as mãos pressionando o mastro do navio com tanta força que a bruxa apostou que ele poderia quebrá-lo se quisesse.
A mulher olhou para os lados. Sua intuição lhe dizia que os bruxos estavam prontos para o que combinaram. Seria logo e seria breve. Se não conseguissem, entretanto, seria o fim. Essa parte ela não verbalizou para nenhum dos cúmplices de um plano supostamente infalível. Seu olhar com Azura, ainda em terra firme, enquanto repassavam passo a passo o que fariam, já lhe dizia que a amiga sabia. Sem plano B ou C.
Da popa, Ginevra correu para a proa. Encostou o corpo no púlpito e involuntariamente apertou os dedos longilíneos na madeira gasta do barco. A respiração falhou mais de uma vez. Tentava não olhar para o horizonte, de onde o inimigo vinha. Olhou para o céu, entretanto.
- Vó - interpelou, esperando que mais ninguém a ouvisse -, se estiver aí, preciso de uma força aqui.
Outra vez, a bruxa fechou os olhos castanhos. Sentiu o medo na atmosfera, mas sorriu. Não estava com medo, ela. O medo vinha de lá, de terra, soprar em seu rosto com a brisa rebelde e desenfreada do mar. Os soldados estavam com medo.
Como se duas mãos reconfortantes pousassem em seus ombros, a força que lhe faltava chegou, nascendo da ponta dos dedos. Era a avó. Se não a avó, o pai. Estavam ali também.
O lábio inferior tremeu. O que fazia era arriscado, mas necessário.
- Gine! - ouviu o grito de Azura pressionando-a.
Do mar ao céu, Ginevra chamou Morgana. Pediu autorização à Deusa para o que ia fazer. Ia mexer em seu terreno, local desconhecido, desordeiro.
Uniu-se aos outros bruxos e pôs-se ao trabalho. Sentiu a marola sob o barco, o sobe e desce da embarcação e ouviu o som da guerra ao longe, aproximando-se.
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Chamas de Petrichor {trilogia}
FantasíaEra curta a lista dos medos que afligiam a pequena garotinha de olhos cinzentos. Primeiro, Azura não gostava do escuro. Ela era nascida de Petrichor, descendente de Sonca e Marama, os deuses do Sol e da Lua. Qualquer ausência de luz causava-lhe um p...