- Se concentre, Ginevra.
O sussurro imponente da petrichoriana surtiu mais como uma súplica do que como uma advertência.
A bruxa inspirou profundamente. O ar com aroma de sal do mar penetrou seus pulmões com uma sensação familiar ao mesmo tempo repulsiva e reconfortante - uma lembrança da terra, mas do lar. Suas pestanas, fechadas às ordens da nova amiga, tremulamente pediam para abrir.
Ginevra sentia as ondas da orla quebrarem em seus pés descalços que gradativamente afundavam na areia.
- O que deveria estar acontecendo, Azura? - Tentando não expor sua impaciência, falhamente, a bruxa indagou.
Azura, por sua vez, folheava com cuidado o livro que os arandianos expunham na humilde sala de estar. As folhas estavam amareladas, desgastadas e enrugadas, com um cheiro de mofo forte que a fazia querer espirrar de minuto em minuto.
Ginevra, não obtendo resposta, abriu seus olhos. O horizonte focou-se à sua frente em tonalidades azuis que acostumavam-se calma e vagarosamente à órbita. Azura não estava em seu campo de visão. Ela voltou-se para trás. A convidada estava sentada na areia atrás dela, desfrutando da ventania forte que vinha com a maresia da manhã e bagunçava seus cabelos. Um lenço emprestado por Ginevra encobria a capa do livro.
Azura levantou os olhos para Ginevra, vendo uma garota impaciente.
- Deveria estar tentando se encontrar. - Azura virou outra página.
- Não venha com esse papo espiritual pra cima de mim, Azura. - A bruxa sentou-se no monte de areia ao seu lado. Observou-a folhear as páginas com tamanha concentração. - Se meu pai descobrir que tirou o livro de casa...
- Ele não vai se importar. - Azura arriscou um palpite. - Estou tentando te ajudar. Estamos em um trecho deserto da praia logo ao nascer do sol. Não há ninguém aqui.
- É, porque estão todos dormindo como seres humanos normais.
Azura fechou o livro. Sua pouca habilidade em vocraniano estava enferrujada.
A petrichoriana esforçou-se para não fuzilá-la com o olhar.
- Okay, eu vou parar de reclamar. - Ginevra adiantou-se.
- Não sei como quer que eu te ajude, Gine. - Azura voltou-se para ela. - Já vi um pouco do que é capaz de fazer. Como se encontrou?
- Quer dizer aquele lance de acender fogo com o dedo? - Ginevra deu de ombros. Aquilo não era algo digno de se chamar de bruxaria.
- Não só. Você me curou quando eu estava definhando no chão do seu quarto...
- Eu não queria nenhum cadáver fedendo onde eu durmo, talvez tenha sido um bom incentivo.
- Cale a boca. - Azura segurou uma risada. - Aquela mistura de ervas... tudo aquilo. Como aprendeu?
Ginevra concentrou-se na conversa. A ausência de sono não a ajudava a focar. Ela caçou uma memória boa em seu âmago.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Chamas de Petrichor {trilogia}
FantasíaEra curta a lista dos medos que afligiam a pequena garotinha de olhos cinzentos. Primeiro, Azura não gostava do escuro. Ela era nascida de Petrichor, descendente de Sonca e Marama, os deuses do Sol e da Lua. Qualquer ausência de luz causava-lhe um p...