Se estavam loucos, não sabiam dizer. Talvez a dor enlouquecesse, e isso eles já tinham vivido de sobra. Mesmo assim, quando pisaram em Cinzas, o frio glacial pareceu não mais atacá-los. A brisa ainda era congelante demais para ficarem sem agasalhos, mas guardaram peças de roupa extra e a única coisa que caía do céu agora era uma garoa fina.
Cinzas não lhes mostrou nada demais. Pelo menos não naquele limiar com Vocra. As árvores eram parecidas, igualmente dispersas e de altura similar. Nada de novo a não ser a terra que fazia jus ao nome. Era cinza como as histórias, cinza como nas lembranças distantes dos que lá nasceram.
Aquela caminhada pela floresta foi sem pressa alguma. Tinham acabado de alcançar o destino daquela viagem e não estavam felizes, tampouco sabiam o que fazer dali para frente. Foi um silêncio sem fim, pelo qual Azura guiou e Aurèlia apenas seguiu, mal mandando nas próprias pernas. Quando a Kino pediu para pararem, nenhum deles discutiu. Levantaram acampamento e, sem preocupações, acenderam uma fogueira. Se Cinzas era uma terra morta, de nada tinham com o que se preocupar. Assim, isolaram-se com seus próprios pensamentos.
Deitada de bruços em um amontoado de folhas caídas e tentando não se importar com as formigas que hora e outra a escalavam, Azura tentava distrair-se com a terra sob seu corpo, cinzenta como em suas lembranças. Estava começando a temer que aquela viagem tivesse sido em vão e a explicação para tudo aquilo estivesse longe dali.
A dor lancinante em suas costas nuas despertou-lhe dos devaneios. Segurou até o último segundo um grito de dor, que escapuliu de sua garganta como um ganido. Seu corpo já esfriara e agora sentia perfeitamente cada toque de Ginevra, por mais delicado que fosse, manuseando e limpando a ferida em suas costas.
- Está feio? - Azura indagou.
- Não - Ginevra mentiu.
- Mais um para a coleção - brincou com um humor ácido. - Vai precisar me costurar?
Ginevra pensou com uma breve pausa.
- Não sei se vai aguentar, Az. Talvez seja desnecessário.
- Eu diria que aguento, mas...
- Está exausta.
- Sim, estou.
- Eu também.
Elas olharam ao redor, para os amigos dispersos em volta da fogueira. Alaric dormia em uma posição que não parecia confortável, sentado nas raízes de uma árvore e com a cabeça apoiada no tronco, jogada para trás, como se tivesse resistido até o último segundo à exaustão. Apagou logo depois de Ginevra tratar de seu braço. A arandiana apenas limpou o sangramento e o estancou, assim como fazia com Azura.
Caiden finalmente dormira. Não quis que percebessem que chorava, mas todos perceberam. As lágrimas não cessaram até que pegasse no sono. Só ele sabia o que se passava na própria mente após perderem Frey.
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Chamas de Petrichor {trilogia}
FantasyEra curta a lista dos medos que afligiam a pequena garotinha de olhos cinzentos. Primeiro, Azura não gostava do escuro. Ela era nascida de Petrichor, descendente de Sonca e Marama, os deuses do Sol e da Lua. Qualquer ausência de luz causava-lhe um p...