As copas das árvores do Bosque podiam ser densas o suficiente para guardarem a escuridão e o temor à ela intrínsecos, como podiam também muito bem guardar os crisantianos e davilianos da chuva, que agora parecia cessar aos poucos. A noite naquelas tenebrosas terras lhes causava ainda mais calafrios que a própria brisa gélida que assolava seus corpos ensopados - da água do Estreito e das lágrimas de cada um.
Eles armaram um breve acampamento sob uma densa árvore, próximos o suficiente de onde atracaram na praia para que Nafré os reencontrasse quando decidisse por voltar.
Isaac mostrou-se experiente. O homem sabia como acender o fogo utilizando apenas duas pedras, o que não foi fácil.
Quando conseguiram fogo, a noite tornou-se um pouco menos angustiante.
Gaia colocou rapidamente o pequeno Kaha ao lado das chamas, que acalmou-se aos poucos com o calor a secar-lhe o corpo.
- Sinto muito, pequenino - a crisantiana passou as mãos pelos míseros fios de cabelos daquela criança. Era um milagre que ainda estivesse viva. - Você é um sobrevivente, príncipe.
O calor os acalmou aos poucos. Um a um, pegaram no sono, fazendo o possível para acomodarem-se pela terra molhada sob as árvores do Bosque. Esgotados, cederam à exaustão do corpo e entregaram a vida ao destino, torcendo para que nada lhes devorasse as cabeças durante a noite.
Gaia, entretanto, não quis dormir. Conseguiria, se tentasse, mas sentou-se nas raízes daquela majestosa árvore e encolheu-se nas roupas que secavam aos poucos.
Ela analisou-os. Viu o pequeno príncipe tirar um sono tranquilo. Osi embrulhou-se no abraço do pai, que foi o primeiro a ceder. Carú e Coli conversaram sobre as aventuras que viviam até pegarem no sono. Gaia estava só.
Um som ao seu lado a despertou, assemelhando-se a um galho se partindo. A crisantiana rapidamente voltou sua cabeça para a esquerda, a princípio assustando-se ao vê-la aparecer ali.
Nafré a olhou, ensopada da chuva que ainda caía. Seus cabelos escorridos e pesados grudavam por seu rosto e peito, e seus lindos olhos pareciam ainda mais claros. Esteve chorando, Gaia observou. O rosto da irmã mais nova transformou-se em uma máscara que tentava sem sucesso segurar a tristeza. Nafré despedaçou-se quando Gaia abriu os braços.
Seus soluços ao jogar-se no colo da irmã mais velha foram altos o suficiente para acordar os outros, que nada disseram. Apenas a viram chegar bem e voltaram a descansar.
Nafré sentiu-se minúscula naquele abraço e Gaia permitiu-se acompanhá-la em suas lamúrias.
- Me desculpa - a loira balbuciou.
- Sou eu quem me desculpo, Nafré - a irmã a apertou com força, ignorando o quão molhada ela estava. - Eu devia ter estado lá por você.
- Eu não devia ter te cobrado tanto... - Nafré limpou as próprias lágrimas e olhou nos olhos da irmã, desfazendo aquele abraço, mas não a proximidade. - Você fez o certo. Eu te segui porque eu quis e... Eu só... - Nafré levou as mãos ao peito. - Está doendo, Gaia.
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Chamas de Petrichor {trilogia}
FantasyEra curta a lista dos medos que afligiam a pequena garotinha de olhos cinzentos. Primeiro, Azura não gostava do escuro. Ela era nascida de Petrichor, descendente de Sonca e Marama, os deuses do Sol e da Lua. Qualquer ausência de luz causava-lhe um p...