113. Legado

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Os olhos de Nafré se abriram e piscaram com a luminosidade que adentrava por entre as frestas da janela

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Os olhos de Nafré se abriram e piscaram com a luminosidade que adentrava por entre as frestas da janela. A crisantiana levou as mãos em frente aos olhos heterocromáticos e se sentou no sofá. Como se levasse um soco na boca do estômago, a garota lembrou-se de tudo.

Estava em casa. Estava viva. E de sua janela entrava sol.

Pulou tão rapidamente do sofá que caiu no chão. Arfou, balbuciando em voz alta. Correu até a janela sentindo os pés descalços no piso frio da cozinha e sorriu. Sorriu e chorou.

- Gaia! - gritou. - Gaia, tem sol! A gente venceu! A gente...

A garota olhou para trás. Foi então que lembrou-se das consequências de vencer aquela guerra.

Gaia acordara antes dela. A irmã mais velha estava sentada no chão, debruçada sobre o corpo de Rose, agora tão pequena no sofá que dividira com as filhas.

Gaia fungou. Tentou esconder as lágrimas, mas os soluços a chacoalharam quando Nafré a chamou. A irmã correu ao lado dela e jogou os braços sobre seus ombros. Sobre a irmã e a mãe.

- Ela se foi, Nafré - Gaia soluçou. - A mamãe se foi.

Gaia envergonhou-se, apesar de saber que não precisava sentir-se assim. Nafré não cobrava nada dela. A mais velha apenas queria mostrar que agora ela seria a mãe, um porto seguro, mas chorava como um bebê à procura de seu próprio.

Nafré também sentiu toda a sua dor.

As três sabiam que não acordariam juntas. O destino foi bom com duas delas.

Rose estava marcada. Levava a marca de Pouri. Assim como todos os que o fizeram, ela se foi.

Isso significava uma coisa: a guerra chegara ao fim.

- Ela se foi dormindo, Gaia... Foi rápido e tranquilo. Está com os Deuses agora.

Assim que o disse, amaldiçoou-se pelas palavras. Era o que diziam para confortar alguém quando um ente querido falecia. Mas Rose não estava com os Deuses. Estava com Pouri. Trilhou seu caminho com medo, achando que fazia o certo, e agora sua alma arcaria com as consequências, fossem quais fossem.

As irmãs permitiram-se quase meia hora de luto. E só. Apesar de tudo, de todas as perdas, de Mirza, Osi, Isaac e agora a mãe, precisavam ir lá fora. Se estivessem certas, era o fim de uma era de dor. E, apesar de tudo, ainda tinham uma à outra.

Gaia levantou-se primeiro ao ouvir os resmungos familiares. Ela andou até a cadeira onde deixara o embrulho quente que chamava de príncipe. Kaha a fitava, quieto, sem choro ou medo no olhar. O pequenino apenas olhava para tudo, curioso, após acordar de um sono profundo induzido pelo pó de sono.

A mulher o tomou nos braços e olhou para Nafré. A irmã mais nova cobriu a mãe que então parecia apenas dormir no sofá, como se tirasse as sonecas vespertinas após o almoço.

Chamas de Petrichor {trilogia}Onde histórias criam vida. Descubra agora