Desliguei o telefone. Aliás, a Rê bateu na minha cara e deu aquele pânico. É que eu dou um jeito de sempre foder com as coisas, sabe. Tive algumas grandes chances na vida e fiz merda em todas elas. Teve a Amber, e o que fiz com aquela menina não tem perdão. Teve a Naomi, o relacionamento mais perfeito da minha vida, porque os dois estavam pouco se lixando e, consequentemente, incapazes de estragar qualquer coisa. E aí eu comecei a me relacionar com um bebê. E isso é bem mais complicado. Tem dois relacionamentos que eu não posso estragar de jeito nenhum. O meu com o meu filho é um deles.
Automaticamente, liguei para a Malu. A Rê estava meio surtada, ou talvez estivesse dormindo, e eu falaria com ela, claro. Assim que soubesse o que aconteceu. Assim que conseguisse chão para mim para que pudesse oferecê-lo aos outros. Assim que ouvisse a voz da Malu e, se tivesse mesmo algo errado com o bebê, eu precisaria muito ouvi-la.
-Princesa? Te acordei? - Falei, assim que ela atendeu o telefone, e então me toquei da diferença de fuso horário. Sou um jumento, claro que a acordei. No entanto, ela mentiu que não e eu fingi que acreditei.
Contei do telefonema da Rê, que foi medonho, aliás. Ela não disse coisa com coisa, falou que recebeu o resultado de um exame, que deu merda, que precisava ficar sozinha e bateu o telefone na minha cara. Falei para a Malu que liguei para ela porque não sabia se era sonho. Na realidade, eu desejava que fosse, mas liguei porque a Malu devolve sentido ao mundo.
-Eddie, chegou o resultado da amniocentese. Não sei como te dizer isso, mas há grandes chances do bebê ter síndrome de Down. Na verdade, pelo que o médico falou, só há chances do bebê ter síndrome de Down. Sinto muito.
-Caralho, que marretada. - Eu disse, porque foi mesmo uma puta de uma marretada.
Não uma marretada trágica. Meu medo quando liguei era que a Rê tivesse perdido o bebê, e isso sim, seria uma tragédia. Eu estou curtindo essa história de ser pai, sabe? Não tenho família, nunca tive a vida inteira, nunca achei que mulher alguma fosse me dar isso, o bebê veio por acidente e agora não quero que vá embora. E, com ou sem síndrome de Down, é meu, caralho, e não vai ser menos meu por causa disso. Sempre me fascinou o extraordinário e o fora do padrão, então, se destino existe mesmo, faz sentido que o meu filho nasça diferente. Como eu, aliás. A única merda nisso tudo é que a vida não costuma tratar muito bem quem é diferente. E achei que aquela era uma boa hora para assegurar que aquele moleque seria muito, muito bem tratado. E começaria desde já, acabando com a crise de choro da mãe dele.
-Malu, tive uma ideia. Passe na Singe com a Rê e veja o sexo.
-Mas vocês não tinham combinado que ia ser surpresa?
-Tínhamos, mas a Rê está meio mal. De repente saber que é um menino ou uma menina ajuda. O bebê ganha rosto, sabe?
-Eddie, eu te amo muito! Você é um gênio! - Minha princesa falou. Se eu fosse um gênio, Malu, não teria deixado Saint Malo ser escrita da forma que foi. E hoje as coisas seriam muito diferentes.
Mas o que disse, foi:
-E depois me ligue para me contar.
-Ok.
E então liguei pra Rê. Pois quero que ela fique bem. E quero que ela segure as pontas, pois ela é sensacional e está carregando o meu filho. É uma raiz que estou plantando nesse mundo, provavelmente a única, então é bom que seja a melhor de todas.
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O Lado Escuro da Lua
RomanceEsse livro é uma coletânea dos POVs de Canções da Minha Vida e Diários de Malu, à venda na Amazon.com.br. Essas visões dos personagens foram escritas pelas leitoras e, algumas, pela autora, e nasceram de uma brincadeira no grupo Realidades Paralelas...