Minhas amigas, com exceção da Di, que conheci na faculdade, são todas da época da escola primária. Acho que é isso que aumenta a impressão que espichamos, criamos bunda (não muita, no meu caso), seios (não muitos, no caso da Leah), passamos a usar maquiagem (quase nenhuma, no caso da Gemma), mas não amadurecemos muito além disso. Ah, começamos a beber também, logo o meu chá de panela no apartamento da Di foi mais ou menos como uma reunião de adolescentes bêbadas dando risada, pôsteres com a cara do nosso ídolo espalhados por todas as paredes, em um dos quais a Gemma deu um indecente, ridículo, alcoolizado e hilário beijo de língua.
-Não pode beijar o noivo! - Leah gritou. - Pelo menos, não pode beijar o noivo assim!
-Ah, mas ele é lindo! - Gemma suspirou, e senti um milhão de bolhas gostosas no estômago. Ele é mesmo lindo. - Amber, você vai se casar com um homem lindo!
-E famoso! - Leah completou.
-E super rico! - Foi a vez de Di.
-Não é como se ele fosse só isso - falei, com a voz um pouco engrolada, tentando ser a adulta bêbada no meio das adolescentes embriagadas. - Ele é inteligente, uma pessoa maravilhosa, sensível...
-Ah, foda-se! Pra mim basta ser lindo, famoso e rico - Leah disse. - Ele tem de ter algum defeito. Ele é broxa, não é?
-Ele é perfeito - suspirei, pois nem eu mesma conseguia acreditar que ia me casar com um homem lindo, famoso, super rico, inteligente, maravilhoso e sensível.
-Conta como foi o conto de fada? - Di pediu.
-Conta! - As meninas fizeram coro.
-Mas vocês já ouviram um milhão de vezes! - Falei, por achar que devia, pois estava louca para contar mesmo.
-Mas conta outra vez, vai!
-Ok - Me levantei, para dar maior importância. - Eu tinha acabado de terminar com o George...
-Eca! Feio, anônimo e pobre! - Gemma interrompeu.
-... e ia sempre comer meu almoço em Parliament Park, e depois ficava pensando na vida. Que estava um merda, aliás.
-Lógico. Namorado feio, anônimo e pobre - Gemma falou. - Amiga, você é bonita, é inteligente, mas tem o dedo mais podre pra homem... Até agora.
-Até agora! Ainda bem que passou! Bom, um dia estava no estágio, e uma enfermeira me disse que deixaram uma foto pra mim. A minha foto! Sentada em Parliament Park! E atrás havia um bilhete, o fotógrafo dizendo que adoraria me levar para jantar para provar que não era um psicopata.
-E você ligou para todas nós e dissemos para você não ir, sabendo que você iria porque você é louca de pedra! - Di.
-Sim, sou louca de pedra e fui, até porque, quando estou saindo do trabalho, encontro o Ed Simons em pessoa me esperando com um buquê de flores!
-Um brinde à noiva tão irresistível que a celebridade virou stalker dela, ainda que fosse anônima - Leah ergueu sua taça de vinho.
-Ele te via todos os dias no Parliament Park - Di se jogou sobre as almofadas, com ar sonhador.
-É que ele costuma correr lá - Expliquei, apesar de elas conhecerem a história desde o meu primeiro encontro com o Eddie, por um acaso o melhor da minha vida, e que havia acontecido apenas quatro meses antes. - Me via sentada, dizia que eu parecia estar em uma encruzilhada, e que o momento antes de se escolher o caminho sempre merece uma foto. Além de querer me fotografar porque me achava linda, claro - falei, com fingida arrogância.
-Claro - elas concordaram.
Desde a adolescência, minha vida sempre havia dado errado. Confusões, decepções, o famoso dedo podre para homem, tristezas, sempre havia algo me puxando para baixo. Estava convencida que contos de fada acontecem com qualquer pessoa à minha volta, menos comigo. E então conheci o Eddie, a personificação do príncipe encantado. Quais as chances daquele homem lindo e talentoso da TV e das revistas também ser gentil, romântico, inteligente e ficar de quatro por você? Pela primeira vez minhas amigas me rodeavam, incrédulas com a minha sorte. Em quatro meses, havíamos nos visto ou falado todo dia, ele tinha me levado para programas caros e diferentes, me apresentado a um mundo inteiramente novo até que, um mês antes do meu chá de panela, acordei uma manhã e meu quarto estava cheio de charadas, que levaram metade do dia e vários telefonemas para as minha amigas para que fossem desvendadas, e cuja solução era a pergunta: "Quer casar comigo?"
-E o coronel? Mais conformado? - Di perguntou.
-A palavra é exatamente essa. Conformado.
Meu pai tentou botar mil empecilhos. Que eu não amava realmente o Eddie, só buscava consolo por ter terminado com o George e estava fascinada por ele ser famoso. Que havia sido rápido demais. Que o Eddie era roqueiro, viajava muito, com certeza usava drogas e me trairia, que o Eddie fumava e eu não, e até que o Eddie era tatuado demais. Não que a minha mãe me desse muito apoio, mas ao menos não verbalizava tanto sua desaprovação.
Tentei provar que não era mais a sua menininha. Que tinha total condições de fazer escolhas para a minha vida. Que estava, sim, muito apaixonada, que esperei e sonhei com um homem como o Eddie a vida inteira, que seria muito feliz e lhe daria muitos netos. Meu futuro parecia tão perfeito quanto o meu noivo.
Bom, o que posso dizer? Hoje, olhando em retrospectiva, sei que devia ter dado ouvidos ao coronel. E sim, tenho um dedo muito podre pra homem.
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O Lado Escuro da Lua
RomanceEsse livro é uma coletânea dos POVs de Canções da Minha Vida e Diários de Malu, à venda na Amazon.com.br. Essas visões dos personagens foram escritas pelas leitoras e, algumas, pela autora, e nasceram de uma brincadeira no grupo Realidades Paralelas...