(2001) Eddie: Dando a partida na vida

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Ava disse que ia pedir mais gin e voltou com água. Ela é uma das mulheres mais lindas que eu já vi, e acho que é porque é a mais sábia. Ah, não é só por causa disso. É porque ela é um milhão de coisas, e me lembra outras milhares, nenhuma delas ruim. Às vezes eu tenho a impressão que, se ela não tivesse ido embora, a minha vida seria muito diferente. Sei que é só isso mesmo, só impressão, um acaso, uma coincidência que fez com que sua mudança fosse o primeiro divisor de águas do qual tenho lembrança. Ainda assim, me sinto seguro quando ela está por perto.

-Então vamos ver se eu entendi bem – Ela falou, me estendendo a água. – Você está feliz.

-Então você entendeu tudo errado, Ava. Eu tô na merda.

-Não, Eddie, você entendeu tudo errado. Você está feliz.

Ava sempre faz isso. Eu despejo uma caralhada de problemas em cima dela, os fios todos emaranhados, e aí ela acha a ponta solta, desembaraça tudo e me entrega um novelo. Fico feliz que ela tenha voltado. Queria que tivesse feito isso anos antes. Queria que tivesse voltado nos anos 80, no início dos anos 90 e impedido tudo de acontecer. Mas Ava me reencontrou pouco antes de eu conhecer a Naomi, quando havia traçado um novo plano depois de ter feito todas as piores escolhas possíveis. É bom que ela tenha estado por perto depois disso, pois ela me lembra do plano sempre que eu sou um jumento e me desvio do caminho. Ainda assim, não haveria tanto a planejar se ela tivesse ficado junto desde o início.

-Você na realidade tem um único problema. Você é lerdo demais.

-Ei!

-Demais! Você nunca toma uma atitude!

-Eu tomo um monte de atitudes!

-Todas as coisas que realmente importaram na sua vida, você não tomou atitude alguma.

Isso não é verdade mesmo, veja bem. Tudo que realmente era importante para mim, eu fiz. O plano só existe por causa disso. Mas algumas coisas não importam apenas para mim, mas para outras pessoas também. E jamais vou forçar qualquer um no mundo, principalmente quem eu amo, a fazer algo contra a vontade apenas para se adequar ao meu plano. Isso não existe, não sou eu, e acho que o mundo seria um lugar bem mais bacana se todos se tocassem disso.

Vivi preso uma boa parte da minha vida. Pela falta de dinheiro, pelos padrões, pela falta de conversas, pela mentalidade tacanha e por alguns relacionamentos que estavam fadados antes de começar. Serei o último a impor qualquer espécie de prisão a alguém.

E se estou na merda por causa disso, que seja.

-Não luto batalhas perdidas, Ava.

-São perdidas porque você não dá chance de saberem que você está na disputa. Eddie, você não tem nada a perder! Ninguém no mundo tem menos a perder que você.

Ninguém. A essa altura do campeonato, só tem uma pessoa no mundo que eu ainda posso perder e, se isso acontecer, aí sim, aí é enfiar uma bala na cabeça para não dar chance de paramédico e injeção de adrenalina me trazerem de volta.

-Qual o nome daquela bonequinha mesmo? – Ela perguntou de supetão e eu sorri. Impossível não sorrir quando lembro dela.

-Emily.

-Ela é o seu centro. É a única pessoa realmente permanente na sua vida.

-Ela vai embora.

-Ela nunca vai embora, a não ser que você não lute. Pelo amor de Deus, Eddie, uma vez na vida pense no que você quer! Você recebeu a dica, sabe o que tem de fazer, então faça!

Por um segundo ela me convenceu, mas...

-Não seria honesto.

-Seria honesto com você! E sinceramente, ninguém sairia prejudicado com essa história. Você daria a cada um dos envolvidos exatamente o que eles querem, inclusive você.

Exatamente o que eu quero ficou perdido. Está em uma redoma, como aqueles souvenires de paisagem que você agita e a neve cai. No meu, não há neve. Há uma praia, o mar e todas as estrelas do mundo. No mundo real, a redoma foi quebrada e surgiram dois caminhos. Eu estava sozinho no que tomei, mas vou levar a paisagem comigo para sempre. Ela está em uma estante e talvez seja lá que deva permanecer. A vida anda. Só há alguém que eu ainda posso perder e não, não vou deixar que isso aconteça. Isso seria a minha morte e, apesar do que dizem por aí, ainda tenho instinto de sobrevivência.

Minha conversa com a Ava foi ontem. A despedida de solteira da Rê é hoje. Hora de fazer a vida andar.

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Esse POV faz parte da Semana do Eddie, que acontece até dia 2 de janeiro no grupo Realidades Paralelas da Mari


O Lado Escuro da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora