Querido diário,
Estou meio grogue e devo dormir a qualquer momento.
Não sei o que anda acontecendo. Desde que o Mick foi embora, tudo está rolando ladeira abaixo e, por mais que eu tente me reerguer (sim, mamãe, pare de repetir essa merda, eu JÁ ENTENDI!), sempre dou com os burros n'água. Estou quase começando a acreditar que tem alguma coisa muito errada comigo. Quando finalmente tudo começava a tomar pé, decidi voltar a tocar, tínhamos as músicas, tínhamos uma banda boa, eu ia enfim me tornar quem eu podia ter sido, a Malu pulou fora.
O problema não foi tanto a Malu pular fora quanto a Malu entrar para a banda da Kate.
As meninas do Damnum não foram legais, eu admito isso. Mas todos estavam errados nessa história. A Kate, por se meter onde não devia. A Malu, por aquela mania dela de saber tudo, de ser perfeita, de não admitir que alguém possa ter uma ideia melhor ou entender mais de alguma coisa que ela. E as meninas, pela intransigência delas também. Então a Malu traçou a linha, passou para o outro lado com a Kate, e me deixou sozinha desse com as meninas do Damnum. Minhas amigas, poxa. Minhas melhores amigas. Me deixaram sozinha e me excluíram. Como se o momento já não estivesse difícil o suficiente. Como se elas não tivessem obrigação de ter ficado ao meu lado, como eu sempre fiquei ao lado delas.
Acho que eu não tenho talento suficiente. E talento, pelo visto, conta mais alto que amizade.
Eu poderia ter. Estou enferrujada há onze anos, mas poderia ter crescido e me tornado uma grande baterista. Não teria entrado pra escola de música se não tivesse potencial, e não teria parado no meio se soubesse que meu projeto de vida seria cortado por uma piranha. Ainda assim, Kate poderia ter me dado uma chance na sua banda, como as meninas apostaram em mim no Damnum, mesmo que eu não seja tão boa quanto a Wendy. Eu ia crescer e ia melhorar, tenho certeza disso. É tudo uma questão de foco, sabe? Foquei na família e esqueci a carreira, agora queria fazer o oposto. Já a Malu, a Malu pode fazer tudo. A Kate confia na Malu de olhos fechados. A Malu tem marido, a Malu cuida de três filhos sem babá e com mão de ferro, e a Malu é um geniozinho que, mesmo que não toque há mesma quantidade de tempo que eu, com certeza não perdeu nada de talento. O que ela fez de musicalmente relevante nesses anos todos, além de duas ou três músicas? Porra nenhuma. Então por que a diferença de tratamento?
Havia uma época que eu era o centro do universo. Agora parece que o universo me chutou pra fora e está se divertindo horrores sem mim. Droga, melhor tomar mais um comprimido e tentar dormir de uma vez.
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Esse POV faz parte da Semana da Singe, que está acontecendo até o dia 19/07 no grupo Realidades Paralelas da Mari
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O Lado Escuro da Lua
RomanceEsse livro é uma coletânea dos POVs de Canções da Minha Vida e Diários de Malu, à venda na Amazon.com.br. Essas visões dos personagens foram escritas pelas leitoras e, algumas, pela autora, e nasceram de uma brincadeira no grupo Realidades Paralelas...