Após duas doses de calmante não me sinto melhor e nem menos estressado, somente estou grogue.
A garota está me olhando perplexa e acabo levantando uma sombrancelha e encarando ela.
Estou na sala da minha secretária sentado em um banco que seria para meus clientes, na verdade.
- Perdeu alguma coisa em mim? - pergunto deixando ela envergonhada.
- Você tem sérios problemas! - ela lança. "Ah qual é! "
- Já ouvi isso! - digo friamente, os remédios me deixaram realmente sonolento e sem noção - Acho que transaria com você - digo olhando ela de cima em baixo.
Ela abre a boca em um imenso "O".
- Cala boca seu... Seu pervertido! - ela caminha até mim e me encara - Sou filha do seu psiquiatra, por isso me respeite! - ela parece zangada, mas não me importo com isso no momento.
Paro de prestar atenção nos chiliques de Vitória e observo Lys ao telefone.
- Não senhor, ele não poderá ir, mas irei representar ele... Sinto muito... Eu sei, eu sei... Não é isso! Ele não está se sentindo bem, só isso... Claro! Claro! Sem problemas... OK! Até às três horas então! Muito obrigada pela compreensão. - Lys desliga o telefone e parece aliviada, resolvo perguntar.
- Quem era? Seu pai? - ironizo.
- Da companhia de carros senhor! - ela diz, parece visivelmente preocupada. "Me poupe!"
- Diga que não irei! - ela me olha com descrença.
- Eles já sabem! - ela gralha. Levanto as mãos em rendição e fito a garota a minha frente, ela parece analisar cada movimento meu.
- Pare de me tratar como uma cobaia menina! - digo friamente. Ela ri.
- Talvez você sofra de algum trastorno de comportamento que perdurou para sua vida adulta! - ela parece ter encontrado a mina de ouro, pois seu olhar é intrigante.
- Vou para casa! - digo e me levanto, sinto minhas mãos doerem e faço uma careta, olho para minhas mãos e noto que as faixas estão vermelhas de sangue - Lys! - chamo e Lys me olha - Peça para limpar minhas paredes... - digo e ela assente.
Caminho em direção a porta deixando a estúpida e minha secretária.
Aperto o controle do conversível e abro a porta preguiçosamente, me jogo dentro do carro e solto uma gargalhada, " Porra! Me deixei levar e estou um lixo ambulante!"
Sinto gosto de bile na minha garganta e meu estômago está revirando, quase posso sentir a vontade vomitar se concretizando.
Lembro que sou melhor que isso e que não devo me deixar abalar por causa dessas merdas todas.
Mesmo tentando esquecer ou simplesmente abafar os sentimentos sombrios que pairam em minha cabeça, sinto como se eles invadissem com mais força ainda minha cabeça.
É como se os calmantes me mantivessem estabilizado apenas, mas mesmo assim eu estivesse sendo atingido por uma avalanche.
Sinto meu corpo tremer e ficar dormente e outras horas sinto tudo girar com força, sei que estou começando a ir para o fundo do poço e a vontade de matar está voltando com uma intensidade absurda.
Quero esquecer quem eu sou por alguns instantes e o porquê de ter me transformado nesse monstro ambulante e sem sentimentos aparentemente.
Sei exatamente que guardo mil e um motivos para ser um psicopata maluco, mas na realidade não me considero um ainda.
A empatia que tenho ainda me faz humano, mesmo que essa humanidade seja, por vezes, passageira.
Tomo todo o ar possível e giro a chave, sinto meu carro ganhar vida e o som é reconfortante para meus ouvidos, sei que a única coisa que se iguala a mim é meu carro, tão puro e unicamente frio, feito de lata.
Todas as minhas bases e segurança se desmoronam quando vejo a imagem de minha mãe se formar a minha frente, e de repente, ela está batendo no vidro do carro, reviro os olhos e abro a janela.
- O que você faz aqui? - cuspo as palavras como se destilasse veneno.
- Estou preocupada! Lys me ligou dizendo que enlouqueceu novamente! - bufo.
- Saia de perto do meu carro e tire as mãos do vidro, antes que eu arranque eles enquanto o fecho. - digo mansamente.
- Querido você precisa de ajuda! - ouço sua voz entranhar em meus ouvidos e desejo jamais ter saído do saco escrotal do meu pai.
- Ajuda? - rio amargamente e começo a fechar o vidro, ela tira as mãos apressada e começa a discar algum número.
Saio acelerado e deixo a minha querida mãe parada no estacionamento da empresa.
"Ajuda?"
Sinto meu sangue ferver nas veias. "Onde ela estava quando precisei de ajuda realmente!"
Sinto a raiva me consumindo e a mágoa voltando a se instalar.
Os olhos da vagabunda e o sorriso dela atravessam minha memória como um raio e fico cego de ódio.
Quando me dou conta já sai da pista e tudo fica escuro.
***
Estou brincando na grama verdinha do nosso quintal e é dia de sábado, acredito que mamãe não vai trabalhar hoje e nem papai, então não ficarei com a bruxa.
Ouço uma buzina na frente de casa e corro para o portão, vejo o carro de mamãe cruzar o portão e sinto meu pequenino sorriso desaparecer, "não mamãe! Volte! Volte!" Vejo a bruxa dar tchau para o carro de mamãe e começo a correr para o carro.
- Mamãe! - grito desesperado e ela apenas vai embora.
A bruxa agarra meu bracinho e me puxa para dentro, sinto o terror tomar conta de mim e toda minha alegria vai embora. Ela vai me machucar.
Ela me força a fazer coisas que não quero, ela me bate e me machuca de várias formas, ela nunca deixa marcas, mas as marcas estão aqui.
Ela sempre ri e faz um barulho que sei que é de alegria. Uma alegria suja e ilegítima.
- Se contar para sua mamãe eu mato você! Ela não pode te proteger! E seu pai? Bem ele não se importará, já que é meu amante! E você? Você é meu passatempo bebezinho! - ela passa a boca nojenta dela em mim e me baba todo.
Começo a chorar no cantinho do quarto e sinto raiva de papai. Raiva de tudo e raiva por mamãe não perceber o que está acontecendo.
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Abominável - A lei da Atração
Roman d'amourTantas pessoas no mundo e sempre caímos na labia do lobo mal... "Existe uma pequena linha tênue entre o ódio e o amor!" "Existem pessoas que diriam que sou louco, mas prefiro acreditar na teoria de que sou apenas um excêntrico rico em busca de uma n...