Ruínas - Capítulo 178

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- Eu acho que esse restaurante podia ser num estado mais perto, não acha? – Sophia resmungou ao entrar no táxi, no aeroporto. – Minas gerais, quem sabe?

- Vou deixar anotado a sua sugestão. – Soltou uma risadinha. – Mas hoje tá tudo bem rápido, nada atrasou.

- São nove da manhã, o voo atrasou um pouquinho. – Resmungou. – Desculpe por ser péssima companhia. Estou com sono.

- Daqui a pouco seu humor melhora. – Ela sorriu.

- Pode me explicar por que essa viagem assim do nada e por que você me pediu pra guardar segredo? Tem algum problema?

- Micael é um sério problema quando se trata de assuntos administrativos. – Suspirou. – Eu não sei se é preguiça ou falta de vocação mesmo, mas ele faz tudo igual a cara dele.

- Lindo? – Jorge bufou. – Tá bom, eu entendi. – Soltou mais uma risadinha. – Mas se você sabe disso e tem plena consciência que o moleque gosta mesmo é de cozinhar, por que insiste em colocar ele pra fazer trabalhos administrativos?

- Porque ele tem que aprender, infelizmente não sou eterno. – Deu de ombros. – Ele precisa saber o mínimo pra não deixar tudo nas mãos dos outros no futuro. Parece fácil, mas num restaurante não é só chegar e cozinhar, envolve contabilidade, envolve administração, envolve muita coisa e eu preciso que ele tenha noção do básico, não estou nem obrigando ele a fazer uma faculdade.

- Difícil obrigar o Micael a alguma coisa que ele não gosta. – Seguia rindo.

- E eu não sei?! – Recostou a cabeça no banco. – Micael só me dá dor de cabeça. – Fechou os olhos. – Você quer apostar quanto que a gente vai chegar lá e ele ao invés de estar trabalhando nas planilhas de gastos mensais que eu pedi, ele vai estar na cozinha?

- Mas a gente vai chegar lá quase dez horas, não tem motivo pra ele estar na cozinha. Não tem ninguém lá ainda.

- Não estaria tudo atrasado e eu não teria que vir aqui se ele estivesse fazendo o trabalho dele direito né? – Abriu os olhos e encarou a nora.

- Já vi tudo, você viajou pra brigar com o Micael né? E toda aquela história de ir visitar todos os restaurantes e tal? Desculpa?

- Na verdade, eu faço visita periódica aos restaurantes, essa aqui que vou aproveitar pra puxar a orelha dele. – Soltou uma risadinha. – Vou aproveitar que estamos longe pra tirar um cochilo. – Avisou e voltou a recostar a cabeça e fechar os olhos.

Quarenta minutos depois o carro estava estacionando em frente ao bistrot de Jorge. O mesmo ainda tinha as portas abaixadas como eles esperavam. Jorge tirou um molho de chaves de dentro da mochila, após pagar o taxista. Abriu a pequena portinha de funcionários e os dois entraram.

O salão estava vazios como também era de se esperar, mas risadas ecoavam pelo lugar, aparentemente vindas da cozinha. Jorge olhou para Sophia que tinha a testa franzida, as risadas não cessavam.

Os dois caminharam em direção ao som e Sophia ficou um tempo parada observando a brincadeira que rolava entre Micael e Aline. Os dois pareciam se divertir bastante enquanto cozinhavam alguma coisa.

- Mexe com vontade. – A loira observou quando Micael, ainda sem se dar conta de que era observado, pegou na mão da amiga e a incentivou a mexer na panela mais rápido. – Muito melhor.

- Por essa eu não esperava. – Jorge falou alto e chamou atenção dos dois. – Divertido? – Micael soltou a mão de Aline e se afastou quase que na mesma hora.

- Sophia. – Ele sorriu e encarou a namorada. – Não esperava te ver aqui hoje. – Deu a volta pelo balcão pra chegar perto da namorada. – O que está fazendo aqui?

- Pelo visto atrapalhando a diversão. – Disse baixo. – Me desculpe.

- Ei, não precisa disso. – Suspirou. – Não aconteceu nada.

- Micael, deixa a Sophia acalmar a cabeça e vem conversar comigo. – Jorge chamou. – Afinal, até onde eu sei, você está cumprindo expediente. – Caminhou pra sala que Micael ocupa e o moreno não demorou a segui-lo, sem falar mais nada para a noiva.

- Que papelão. – Jorge começou assim que Micael fechou a porta.

- Eu não fiz nada de errado, eu estava mostrando uma forma mais rápida de fazer... – Não conseguiu terminar, foi interrompido por Jorge.

- Não me importa o que estava mostrando pra ela. – Sentou-se na cadeira de Micael. – Isso você tem que explicar pra sua noiva. O que me importa é porque é tão difícil pra você fazer o seu trabalho aqui.

- Pelo amor de Deus, pai. – Rolou os olhos. – Sophia está lá fora pensando mil coisas de mim e você vai vir com essa agora?

- Eu viajei até aqui pra entender o motivo de tanta demora com os meus relatórios diários e semanais. Embora eu imaginasse que era porque você estaria se divertindo na cozinha, não pensei que fosse acompanhado, mas isso não me importa.

- Eu envio planilhas e mais planilhas pra você sempre.

- Você me envia tudo atrasado e mal feito. – Os dois não tinham o tom de voz baixo. – Você está aqui porque eu precisava de alguém de confiança, Micael. Estou me surpreendendo que meu próprio filho não me parece ser alguém de confiança.

- Mas você faz um drama por nada. – Bufou. – Eu dou o meu melhor aqui. Só que você sabe que eu não suporto ficar atrás dessa mesa revisando planilhas e relatórios.

- Só que você se comprometeu comigo quando decidiu vir pra cá. – Falou mais alto que Micael. – Você sabia que a equipe estava incompleta e você só ficaria como chef enquanto não contratássemos outro. Você se voluntariou pra vir pra cá. Não tem que me dar desculpas, Micael, tem que me dar resultados. Você tem que cuidar de um, eu tenho que cuidar de quatro. São quatro restaurantes pra controlar gastos, pra cuidar dos funcionários, pra negociar com fornecedores. Não adianta eu ter três andando na linha e um completamente atrasado.

- Então por que você não me demite e contrata logo alguém competente pra ficar no meu lugar? – Falou muito mais baixo, já estava de saco cheio.

- Porque você é meu filho, porque um dia eu vou morrer e todos os restaurantes que eu abrir, ficarão sobre suas costas e você precisa saber o que fazer com eles.

- Talvez quando você morrer eu venda todos. – Jorge arregalou os olhos. – Se você não quer me demitir, tudo bem, eu me demito. – Saiu da sala e bateu a porta, completamente estressado. Passou pelo salão e não parou pra falar com Sophia, sabia que sairia ainda mais irritado se fizesse isso. 

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